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Testemunha e obrigação de falar algo que possa incriminá-la

por MARCELO FERNANDES DOS SANTOS
30set11-testemunha

JURÍDICO
Testemunha e obrigação de falar a verdade
Até contra ela mesma

Tem direito ao silêncio?


 

 

JURÍDICO – Direito Avançado

{loadposition adsensenoticia}Testemunha é a pessoa submetida à notificação jurídica compulsória ou voluntariamente se apresenta para expor fatos de seu conhecimento que presenciou ou tem ciência.

A testemunha produz conteúdo pretérito durante sua oitiva através de inquirição em que participa. Restringida a falar somente aquilo que interessa ao procedimento, ou seja, sobre a realidade fática sem adição de opiniões pessoais, tampouco achismos. É indivíduo alienígena ao feito, sem interesse positivo nem negativo e que não possua intenção de prejudicar ou ajudar.

É cediço que a testemunha tem a obrigação de informar a verdade e não pode, também, omitir a mesma, sob pena de responder criminalmente pelo crime de falso testemunho.

Delito consistente em criar afirmação mentirosa, ou negar ou deixar de dizer a verdade como testemunha em procedimento administrativo, inquérito ou processo judicial

O foco nesta página envolve a obrigação ou não da testemunha em continuar verbalizando a verdade mesmo que esta demonstre uma responsabilidade criminal até então não existente. Percepção possível quando fatos negativos de prática criminal acabam desviando a atenção do agente público responsável pela recepção da oitiva e percebe que a testemunha poderá se transformar em outro personagem: o suspeito.

A pessoa que assume compromisso de testemunhar pode usar seu direito subjetivo de não produzir prova contra ela mesma quando se inicia a zona cinzenta da transferência da condição de testemunha para a suspeição.

O depoente, logo, não pode ser coagido a fazer ou deixar de realizar algo, de maneira que o lesione, independentemente da seara, seja administrativa ou processual.

Percebendo que sua conduta possa configurar nova visão de adequação dos fatos por quem preside o feito resultará em nova roupagem para a testemunha que poderá, em tese, eximir-se de divulgar fatos que possam molestar sua situação inquisitiva.

O delito de falso testemunho, vislumbrado no art. 342 do Código Penal, ficará afetado com esse cenário, pois entre a obrigação de prestar depoimento e o direito a ficar calado, este é mais forte e prevalecerá.

Neste contexto, é a síntese: a testemunha não tem obrigação de continuar seu depoimento quando perceber que a manutenção de sua oitiva poderá resultar em nova natureza jurídica de sua oitiva, passando de depoente para declarante e até interrogada.

Ferramenta útil e profilática é o habeas corpus. Protege alguns, principalmente em CPIs, contra atos abusivos de parlamentares que geram prisões contra testemunhas imaginando que estas tenham cometido falso testemunho onde deveriam ser ouvidas como declarantes ou interrogadas e não como depoentes.

E não precisa dizer mais quando a jurisprudência homologa o juízo acima predicalizado. Veja:

Jurisprudência Classificada:

“A condição de indiciado ou testemunha não afasta a garantia constitucional do direito ao silêncio (CF, art. 5º, LXIII: “o preso será informado de seus direitos, entre os quais o de permanecer calado, sendo-lhe assegurada a assistência da família e de advogado”). Com esse entendimento, o Tribunal, embora salientando o dever do paciente de comparecer à CPI e depor na eventualidade de convocação, deferiu habeas corpus para assegurar ao mesmo o direito de recusar-se a responder perguntas quando impliquem a possibilidade de auto-incriminação.” (STF – HC 79812/SP).

“Não há como reconhecer a prática do crime de falso testemunho, porquanto é atípica a conduta do depoente queem suas declarações se exime de auto-incriminar-se” (STJ – REsp 402470/AC).

“Deve ser reconhecida a atipicidade da conduta do indivíduo que ao depor busca eximir-se da auto-incriminação” (STJ – REsp 673668/RJ).

“Não configura o crime de falso testemunho, quando a pessoa, depondo como testemunha, ainda que compromissada, deixa de revelar fatos que possam incriminá-la. Nulidade do auto de prisão em flagrante lavrado por determinação do Presidente da Comissão Parlamentar de Inquérito, dado que não se consignou qual a declaração falsa feita pelo depoente e a razão pela qual assim a considerou a Comissão. Auto de prisão em flagrante lavrado por quem não preenche a condições de autoridade” (STF – HC 73.035/DF e STF – HC 89269/DF).

“Nemo tenetur se detegere: direito ao silêncio. Além de não ser obrigado a prestar esclarecimentos, o paciente possui o direito de não ver interpretado contra ele o seu silêncio”. (STF – HC 84517/SP).

Doutrina extraída:

  • Luiz Flávio Gomes (Caso Roberta Jamilly: Prova Válida);
  • OLIVEIRA, Eugênio Pacelli de. Curso de Processo Penal. 15. ed. Belo Horizonte: Del Rey, 2011.
  • NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de Processo Penal e Execução Penal. 3. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais


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