JURÍDICO
Possuir arma hoje é crime?
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Texto original: “A nova campanha de desarmamento e a vigência do artigo 12 do Estatuto do Desarmamento”
Por Eduardo Luiz S. Cabette
{loadposition adsensenoticia}Por meio do Decreto 7.473/11, regulamentado pela Portaria do Ministério da Justiça 797/11, deu-se início a “nova” Campanha de Desarmamento, reiterando e trazendo novos regramentos para a entrega espontânea de armas de fogo regularizadas e irregulares mediante pagamento de indenização estatal, nos termos dos artigos 31 e 32 da Lei 10.826/03.
Os dispositivos permissivos dessa entrega de armas já vigiam no corpo do Estatuto do Desarmamento, sendo regulamentados pelo Decreto 5123/04 e suas alterações posteriores. Os novos diplomas apenas reiteram a possibilidade de entrega das armas mediante indenização estatal e promovem novas alterações no procedimento de entrega, recolha e pagamento dos valores.
O intento é incentivar a entrega de armas regulares ou irregulares para diminuir o número de armamentos em trânsito no país. Sem adentrar na questão da eficácia dessas iniciativas, pretende-se analisar o problema da vigência, no período da campanha, do artigo 12 do Estatuto do Desarmamento que incrimina a posse ilegal de arma de fogo em residência ou local de trabalho do infrator (obviamente considerando as armas irregulares). Isso porque pode ser levantada a tese de que devido à possibilidade de entrega da arma e presunção de boa fé daquele que a promove, estaria o artigo 12 da Lei 10.826/03 com sua vigência suspensa, especialmente devido ao advento da campanha ora divulgada pelo poder público.
Essa tese não se sustenta e não passa das aparências enganadoras. Em primeiro lugar, a promoção da entrega de armas, inclusive irregulares, está em vigor nos termos dos artigos 31 e 32 da Lei 10.826/03, devidamente regulamentada pelo Decreto 5.123/04 há tempos. Na verdade a expedição do novo Decreto 7.473/11 e da Portaria MJ 797/11 apenas vem a alterar detalhes dos procedimentos formais de entrega, recolha e pagamento de indenizações em nada mudando o quadro em termos materiais. Além disso, não há mais falar-se em um “período de atipicidade da conduta”, tal como se preconizou com razão no início da vigência do Estatuto do Desarmamento, quando foram concedidos prazos legais, ulteriormente prorrogados várias vezes para a regularização de armas ilegais, presumindo-se então naquela época “a ausência de dolo, ou seja, a boa fé, considerando-se o fato atípico” (MORAES; SMANIO, 2007, p. 326).
Agora e desde a alteração promovida no artigo 32 da Lei 10.826/03 pela Lei 11.706/08, não mais se trata de um prazo para regularização de armas ilegalmente possuídas. Tal prazo já expirou faz tempo e quem possui arma de fogo irregular em casa ou no local de trabalho comete infração ao artigo 12 do Estatuto do Desarmamento. Não existe mais a possibilidade de regularização de tais armas conferida ao infrator que estaria dentro de um prazo legal para agir e, portanto, intocável pela norma penal. No momento, o infrator comete crime e somente com a entrega espontânea da arma e/ou munição, nos termos do Decreto 5123/04, alterado agora pelo Decreto 7.473/11 e regulado pela Portaria MJ 797/11, pode obter a “extinção de sua punibilidade”. É isso que diz o artigo 32 da Lei 10.826/03 com sua nova redação dada pela sobredita Lei 11.706/08. Não se trata de atipicidade, mas da criação, a partir de então, de uma causa especial de extinção de punibilidade que somente se opera pela entrega espontânea da arma pelo agente. Ou seja, se o infrator entrega espontaneamente a arma nos termos da legislação e regulamentos acima mencionados, tem direito a uma indenização e ainda à extinção de sua punibilidade pelo crime até então cometido. Ao reverso, se é simplesmente surpreendido de posse de uma arma em sua residência ou local de trabalho, sendo esta apreendida pela Polícia, pode perfeitamente ser preso em flagrante e responder criminalmente por seus atos, não fazendo jus à causa extintiva de punibilidade e muito menos a qualquer indenização.
Portanto, o artigo 12 da Lei 10.826/03 continua em plena vigência, independentemente do seguimento de uma campanha de desarmamento que, aliás, sempre esteve em vigor, somente sendo retomada midiaticamente devido a acontecimentos de repercussão (especificamente o chamado “Massacre de Realengo”) que levaram às alterações sobreditas para dar aparência simbólica de que medidas estão sendo tomadas para contenção da violência no país.
Sobre o autor
Eduardo Luiz S. Cabette
Delegado de Polícia. Mestre em Direito e Professor de Direito Penal, Processo Penal, Criminologia e Legislação Penal e Processual Penal Especial na graduação e na pós – graduação da Unisal
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