JURÍDICO
Obteve aprovação, na Comissão de Constituição e Justiça da Câmara dos Deputados, o que o deixa mais próximo de ser votado pelo plenário, o Projeto de Emenda Constitucional do deputado Marcelo Itagiba (PMDB/RJ) que acaba com o foro especial, a prerrogativa que têm certas autoridades de só poderem ser processadas em segunda instância ou em tribunais superiores.
Em tese, nada parece mais justo que a proposta do parlamentar fluminense. Se A e B são acusados de uma mesma prática irregular aos olhos da legislação civil ou penal, devem ter suas condutas medidas pela mesma legislação e em idênticas instâncias da Justiça, quais quer sejam as atividades a que se dedicam.
No Brasil, entretanto, as coisas raramente são o que parecem. O noticiário registra que a apreciação da PEC de Itagiba foi incluída na pauta desta semana pelo presidente da Casa, Michel Temer (PMDB/SP). Por trás dessa decisão, estaria a pressão direta de alguns parlamentes que são réus do mensalão.
A partir desse registro, brota uma segunda discussão. Extinto o foro privilegiado, como ficam processos como os movidos contra os denunciados no caso do mensalão?
Em Belo Horizonte, o juiz federal Jorge Gustavo Macedo Costa, responsável pela primeira fase do processo na capital mineira, entende que, aprovada a proposta do deputado Itagiba, “o jogo será zerado”, voltando a ação ao seu início.
Quanto à prova já colhida, opina o magistrado que poderá ser aproveitada ou não. É bem provável que o novo juiz queira produzir novas provas e, em isso ocorrendo, “os réus poderão ser novamente interrogados”. Há, pois, o risco de que a questão do foro, que se pretende aprimorar, “se torne algo pior do que é hoje”, para usarmos as suas próprias palavras.
De modo diferente pensa o ministro Ricardo Lewandowski, do Supremo Tribunal Federal, para quem tudo o que tenha sido feito anteriormente no processo poderá ser aproveitado, mesmo com o fim do foro privilegiado.
O leitor já percebeu, a essa altura dos acontecimentos, que aos defensores dos réus não faltará munição para arguir, perante diferentes órgãos da Justiça, muita questão polêmica.
Sem me aprofundar nesse carrascal jurídico, acredito que a manutenção do foro privilegiado, se entendida de forma correta, não briga com a igualdade de todos perante a lei.
A intenção maior do instituto é permitir que autoridades respondam por seus atos perante o Judiciário, sem que um governante ou funcionário cuja sede de atuação é Brasília tenha de comparecer a um ato instrutório do processo numa comarca no interior de Roraima ou no ponto mais meridional do Rio Grande do Sul.
Como contrapartida dessa facilidade administrativa, um processo contra autoridade, iniciado ante um tribunal regional ou federal, deveria furar todas as filas e ser o primeiro a ser julgado, assim que a instrução civil ou criminal estivesse concluída, conforme projeto de lei de minha autoria (PL 1.277/07), em tramitação na Câmara.
O que desmoraliza o Judiciário aos olhos da nação, nos casos de foro privilegiado, não é apreciação do caso por órgãos judicantes de nível superior, mas a demora em se chegar à sentença. Aos maus políticos, isso permite que disputem todas as eleições que desejarem, sejam réus de um, de dez ou de cem processos diferentes.
A PEC do deputado Itagiba deve ser olhada com cautela porque, sob a retórica da igualdade, contribui para aumentar a demora entre o recebimento da denúncia contra os atuais beneficiários do foro privilegiado e o momento em que a sentença que os absolve ou condena é, afinal, emitida.
Antonio Carlos Pannunzio é deputado federal pelo PSDB-SP, e membro da Comissão de Constituição e Justiça da Câmara dos Deputados. Foi líder de bancada e presidente do Diretório Estadual do PSDB-SP
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