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Receitar entorpecentes. Prescrição culposa ou tráfico de drogas?

por MARCELO FERNANDES DOS SANTOS
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JURÍDICO
Receitar drogas ilícitas. Prescrição culposa ou tráfico?
Jurisprudência anotada sobre o tema

JURÍDICO

{loadposition adsensenoticia}Droga é o conteúdo ou substância que possua capacidade de gerar dependência conforme exposição legal através da constatação de listas confeccionadas pelo Poder Executivo da União.

A Agência Nacional de Vigilância Sanitária – ANVISA é a autarquia especial responsável pela divulgação das drogas ilícitas que, em regra, não podem ser distribuídas sem endosso formal. Expediente extraído do art. 1º, parágrafo único, da Lei 11.343/06. In verbis:

LEI DE DROGAS – Lei 11.343/06:


Art. 1o  Esta Lei institui o Sistema Nacional de Políticas Públicas sobre Drogas – Sisnad; prescreve medidas para prevenção do uso indevido, atenção e reinserção social de usuários e dependentes de drogas; estabelece normas para repressão à produção não autorizada e ao tráfico ilícito de drogas e define crimes.


Parágrafo único.  Para fins desta Lei, consideram-se como drogas as substâncias ou os produtos capazes de causar dependência, assim especificados em lei ou relacionados em listas atualizadas periodicamente pelo Poder Executivo da União.

Assim, a legislação referente que disciplina a utilização de psicotrópicos observa normas penais em branco. Estas, configurações com sanções específicas, mas com conteúdo indeterminado, pois a efetivação de seu teor depende de outras normas jurídicas ou doravante divulgação de atos administrativos como portarias, resoluções, instruções, decretos etc.

Há dois tipos. Normas penais em branco em sentindo amplo ou homogênea, ou seja, o acessório é divulgado pela mesma fonte formal do regulamento incriminador, na mesma lei. E as normas penais em branco em sentido estrito ou heterogênea, as quais prescrevem a análise da norma de outro conteúdo legal, como em listas produzidas por centralizações despersonalizadas de atribuições através de órgãos.

A Lei de Drogas no artigo mencionado explicitou genericamente o nome droga atraindo seu complemento como norma penal em branco heterogênea. Logo, sua regulamentação será através da Anvisa, usando a portaria 344/98 – SVS/MS – Anvisa.

Nesta matéria, o mote discutido é a prescrição de entorpecentes com os medicamentos contidos na lista C1 da portaria 344/98 – SVS/MS – Anvisa. Veja a lista ao final.

Interessante ressaltar que o art. 38 da Lei de Drogas dispõe sobre o único delito culposo no dispositivo legal citado onde tipifica o comportamento do sujeito que prescreve algo, como dar receita ou libera seu uso, assim como ministrar, ou seja, oferecer para consumir entorpecentes. Os estudos científicos frisam que é crime próprio e apenas o agente público que atua na área de saúde pode ser autor desse crime.

LEI DE DROGAS


Art. 38.  Prescrever ou ministrar, culposamente, drogas, sem que delas necessite o paciente, ou fazê-lo em doses excessivas ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar:

Pena – detenção, de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos, e pagamento de 50 (cinqüenta) a 200 (duzentos) dias-multa.

Essas condutas são adequadas ao tipo do tráfico de drogas, caso o dolo seja o animus utilizado. Independente da norma elencada no parágrafo anterior, situação importante surge quando o suspeito alega falta de justa causa para instauração de procedimento penal, quer seja inquérito ou demanda judicial para apurar a conduta da prescrição de medicamentos contidos na lista C1 da portaria 344/98 da Anvisa. É o que dispõe a legislação pertinente.

LEI DE DROGAS

Art. 33.  Importar, exportar, remeter, preparar, produzir, fabricar, adquirir, vender, expor à venda, oferecer, ter em depósito, transportar, trazer consigo, guardar, prescrever, ministrar, entregar a consumo ou fornecer drogas, ainda que gratuitamente, sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar: (grifo nosso).

Pena – reclusão de 5 (cinco) a 15 (quinze) anos e pagamento de 500 (quinhentos) a 1.500 (mil e quinhentos) dias-multa.

Existe expressivo entendimento jurisprudencial do Supremo Tribunal Federal sobre a ausência de justa causa para classificar o crime prescrição culposa do art. 38 da Lei de Drogas, quem prescreve quaisquer substâncias encontradas na lista C1 da portaria 344/98 supra. O Pretório diluiu sua convicção no sentido de tipificar o crime de tráfico de drogas quem age dessa maneira. Veja:

Jurisprudência anotada

“Tráfico ilícito de drogas. Prescrição de substâncias elencadas na lista ‘C1’ da Portaria 344/1998 da Secretaria de Vigilância Sanitária do Ministério da Saúde (SVS/MS), que trata das substâncias sujeitas a controle especial. Não há falar em falta de justa causa para a persecução penal, uma vez que a mera prescrição de substâncias sujeitas ao controle do Ministério da Saúde, como se deu na espécie, permite o oferecimento de denúncia pela prática, em tese, do crime de tráfico de drogas. O potencial lesivo da droga ministrada pelo paciente já foi previamente aferido no momento da sua inclusão na referida portaria do Ministério da Saúde, dispensando, para fins penais, qualquer exame pericial com esse objetivo.” (STF, HC 104382, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, T1 – p. DJE de 9-11-2010).

PORTARIA n.º 344/98 – SVS/MS – ANVISA

LISTA – C1 – OUTRAS SUBSTÂNCIAS SUJEITAS A CONTROLE ESPECIAL

ACEPROMAZINA
ÁCIDO VALPRÓICO
AMANTADINA
AMINEPTINA
AMISSULPRIDA
AMITRIPTILINA
AMOXAPINA
AZACICLONOL
BECLAMIDA
BENACTIZINA
BENFLUOREX
BENZOCTAMINA
BENZOQUINAMIDA
BIPERIDENO
BUSPIRONA
BUTAPERAZINA
BUTRIPTILINA
CAPTODIAMINA
CARBAMAZEPINA
CAROXAZONA
CETAMINA
CICLARBAMATO
CICLEXEDRINA
CICLOPENTOLATO
CITALOPRAM
CLOMACRANO
CLOMETIAZOL
CLOMIPRAMINA
CLOREXADOL
CLORPROMAZINA
CLORPROTIXENO
CLOTIAPINA
CLOZAPINA
DEANOL
DESFLURANO
DESIPRAMINA
DEXETIMIDA
DEXFENFLURAMINA
DEXTROMETORFANO
DIBENZEPINA
DIMETRACRINA
DISOPIRAMIDA
DISSULFIRAM
DIVALPROATO DE SÓDIO
DIXIRAZINA
DOXEPINA
DROPERIDOL
EMILCAMATO
ENFLURANO
ETOMIDATO
ETOSSUXIMIDA
ECTILURÉIA
FACETOPERANO (LEVOFACETOPERANO)
FENAGLICODOL
FENELZINA
FENFLURAMINA
FENITOINA
FENILPROPANOLAMINA
FENIPRAZINA
FEMPROBAMATO
FLUFENAZINA
FLUMAZENIL
FLUOXETINA
FLUPENTIXOL
FLUVOXAMINA
HALOPERIDOL
HALOTANO
HIDRATO DE CLORAL
HIDROCLORBEZETILAMINA
HIDROXIDIONA
HOMOFENAZINA
IMICLOPRAZINA
IMIPRAMINA
IMIPRAMINÓXIDO
IPROCLORIZIDA
ISOCARBOXAZIDA
ISOFLURANO
ISOPROPIL-CROTONIL-URÉIA
LAMOTRIGINA
LEVODOPA
LEVOMEPROMAZINA
LINDANO
LISURIDA
LITIO
LOPERAMIDA
LOXAPINA
MAPROTILINA
MECLOFENOXATO
MEFENOXALONA
MEFEXAMIDA
MEPAZINA
MESORIDAZINA
METILPENTINOL
METISERGIDA
METIXENO
METOPROMAZINA
METOXIFLURANO
MIANSERINA
MINACIPRAN
MINAPRINA
MIRTAZAPINA
MISOPROSTOL
MOCLOBEMIDA
MOPERONA
NALOXONA
NALTREXONA
NEFAZODONA
NIALAMIDA
NOMIFENSINA
NORTRIPTILINA
NOXPTILINA
OLANZAPINA
OPIPRAMOL
ORLISTAT
OXCARBAZEPINA
OXIFENAMATO
OXIPERTINA
PAROXETINA
PENFLURIDOL
PERFENAZINA
PERGOLIDA
PERICIAZINA (PROPERICIAZIDA)
PIMOZIDA
PIPAMPERONA
PIPOTIAZINA
PRAMIPEXOL
PRIMIDONA
PROCLORPERAZINA
PROMAZINA
PROPANIDINA
PROPIOMAZINA
PROPOFOL
PROTIPENDIL
PROTRIPTILINA
PROXIMETACAINA
RISPERIDONA
ROPINIROL
SELEGILINA
SERTRALINA
SEVOLFURANO
SIBUTRAMINA
SILDENAFILA
SULPIRIDA
TACRINA
TALCAPONA
TETRACAÍNA
TIANEPTINA
TIAPRIDA
TIOPROPERAZINA
TIORIDAZINA
TIOTIXENO
TOPIRAMATO
TRANILCIPROMINA
TRAZODONA
TRICLOFÓS
TRICLORETILENO
TRIFLUOPERAZINA
TRIFLUPERIDOL
TRIMIPRAMINA
VALPROATO SÓDICO
VENLAFAXINA
VERALIPRIDA
VIGABATRINA
ZIPRAZIDONA
ZUCLOPENTIXOL


ADENDO:

1) ficam também sob controle, todos os sais e isômeros das substâncias enumeradas acima;

2) ficam suspensas, temporariamente, as atividades mencionadas no artigo 2º da Portaria SVS/MS n.º 344/98, relacionadas as substâncias FENFLURAMINA E DEXFENFLURAMINA e seus sais, bem como os medicamentos que as contenham, até que os trabalhos de pesquisa em desenvolvimento no país e no exterior, sobre efeitos colaterais indesejáveis, sejam ultimados;

3) os medicamentos a base da substância LOPERAMIDA ficam sujeitos a VENDA SOB PRESCRIÇÃO MÉDICA SEM A RETENÇÃO DE RECEITA;

4) fica proibido a comercialização e manipulação de todos os medicamentos que contenham LOPERAMIDA ou em associações, nas formas farmacêuticas líquidas ou em xarope para uso pediátrico (Portaria SVS/MS n.º 106 de 14 de setembro de 1994 – DOU 19/9/94);

5) só será permitida a compra e uso do medicamento contendo a substância MISOPROSTOL em estabelecimentos hospitalares devidamente cadastrados junto a Autoridade Sanitária para este fim;

6) os medicamentos a base da substância FENILPROPANOLAMINA, ficam sujeitos a VENDA SOB PRESCRIÇÃO MÉDICA SEM A RETENÇÃO DE RECEITA.

7) os medicamentos de uso tópico odontológico a base da substância TETRACAÍNA, quando não associada a qualquer outro princípio ativo, ficam as VENDAS SEM PRESCRIÇÃO MÉDICA;

8) os medicamentos a base da substância DEXTROMETORFANO, ficam sujeitos a VENDA SOB PRESCRIÇÃO MÉDICA SEM A RETENÇÃO DE RECEITA;

9) Excetuam-se das disposições legais deste Regulamento Técnico os produtos a base das substâncias Lindano e Tricloroetileno quando, comprovadamente, forem utilizadas para outros fins que não os de efeito à área de saúde, e portanto não estão sujeitos ao controle e fiscalização do Ministério da Saúde.

Doutrina anotada

  • Leis Penais e Processuais Penais comentadas – Nucci, Guilherme de Souza – 5ª Edição ver. Atual. e ampl. – São Paulo – Ed. Revista dos Tribunais, 2010.
  • Nova Lei de Drogas – Thums, Gilberto, Vilmar Pacheco – 2ª Edição – Ed. Verbo Jurídico, 2008.

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