Não é viável o trancamento da Ação Penal e a extinção do processo no caso de simples dúvida quanto ao dolo do agente. Com esse entendimento, pacificado no Superior Tribunal de Justiça, a 5ª Turma determinou a reabertura de ação no Espírito Santo contra dono de caça-níqueis.
O STJ atendeu recurso do Ministério Público Federal. A denúncia por contrabando e descaminho não foi recebida pela primeira instância. O MPF então apelou, mas o Tribunal Regional Federal da 2ª Região concedeu Habeas Corpus de ofício e julgou prejudicada a apelação. Daí o Recurso Especial ao STJ contra o trancamento do processo.
A discussão gira em torno da ciência, pelo proprietário, da origem estrangeira das máquinas caça-níqueis e dos seus componentes eletrônicos. Para o TRF-2, não haveria nos autos “elementos mínimos, indiciários que sejam, que indiquem a autoria dolosa e consciente do crime de contrabando”. Por isso, não existiria justa causa para a ação penal, obrigando o seu trancamento, de acordo com a segunda instância.
Para o MPF, porém, a denúncia cumpre os requisitos legais, trazendo indícios de materialidade e autoria. Isso bastaria para dar início à ação penal, no curso da qual seria apurado o dolo do réu.
A ministra Laurita Vaz acolheu a argumentação do MPF. Ela indicou que a jurisprudência do STJ admite o trancamento da Ação Penal somente em casos excepcionais, quando, mesmo sem revolver o conjunto de fatos e provas apresentado no processo, é possível verificar claramente a atipicidade da conduta, falta de autoria ou extinção da punibilidade. A relatora afirmou ainda que, durante o processo, instalado o contraditório, o réu poderá exercer plenamente a defesa. “A aferição do conhecimento, por parte do acusado, da origem estrangeira dos equipamentos apreendidos somente poderá ser realizada no bojo do devido processo legal”, disse a ministra.
Laurita Vaz afirmou também que a discussão sobre a existência de dolo nesses casos tem gerado inúmeros recursos à corte, sinalizando o entendimento divergente entre os tribunais regionais.
De acordo com a ministra, os tribunais têm polemizado quanto à possibilidade de trancamento da Ação Penal diante da dúvida quanto à ausência ou à presença de dolo de contrabando pelos empresários que mantêm caça-níqueis estrangeiros em seus estabelecimentos. A relatora asseverou, no entanto, que o entendimento consolidado do STJ é de que a dúvida sobre o elemento subjetivo do tipo penal não impede a ação, já que somente a instrução criminal — com ampla defesa, contraditório e devido processo — produzirá provas capazes de apontar a eventual existência do dolo.
No caso específico, segundo a denúncia, o réu mantinha bar em que foram apreendidas oito máquinas de jogos de azar eletrônicos, como caça-níqueis e similares, avaliadas em R$ 25 mil. Conforme o MPF, ele sabia da procedência clandestina, estrangeira e ilegal dos aparelhos, que não tinham nenhuma documentação legal e cuja importação é proibida.
Pela denúncia, a inexistência de equipamentos desse tipo no Brasil é notória, já que o país não produz a placa-mãe nem os componentes eletrônicos essenciais ao funcionamento dos caça-níqueis. Dada a pena possível para o crime, o MPF propõe suspensão condicional do processo.
Com informações da Assessoria de Imprensa do STJ.
REsp 1.230.867
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