Ele aparece carros importados, em mansões e com muito dinheiro
Charutos, carros importados, mansões e muito dinheiro. Áureo Moura Ferreira, suspeito de ser chefe da quadrilha investigada por fraudar o Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) e vários vestibulares de faculdades privadas de medicina, ostentava uma vida de luxo em Teófilo Otoni, no Vale do Mucuri, em Minas Gerais. Em imagens que constam na investigação, ele aparece em uma Limousine e em um Chrysler.
Trinta e três pessoas foram detidas pela Polícia Civil na Operação Hemostase II, durante o processo seletivo da Faculdade de Ciências Médicas, na capital mineira, no domingo. Destes, 22 eram candidatos ao processo seletivo. Investigadores ainda fizeram diligências em Teófilo Otoni, no Vale de Mucuri, e em Governador Valadares, no Leste de Minas, além da cidade do Guarujá, no litoral de São Paulo. O 34º suspeito foi preso em Montes Claros nesta terça-feira (25). Ele é apontado como uma das pessoas que teriam agido no Enem.
A polícia monitorou a ação da quadrilha em São Paulo. Além de Áureo, Carlos Roberto Leite Lobo, empresário do Guarujá (SP), também era um dos chefes do bando.
Pelo esquema, os candidatos usavam um microponto eletrônico, tão pequeno que era preciso colocá-lo e tirá-lo com um instrumento médico. Estudantes de medicina integrantes da quadrilha eram os chamados de “pilotos”. Eles resolviam as provas no tempo mínimo e depois, transmitiam os dados para os candidatos. De acordo com as investigações, Áureo e Carlos Roberto cobravam até R$ 100 mil por candidato para passar o gabarito.
“Um grupo que se dedicava, com um grau de sofisticação e de desenvolvimento tecnológico que, até então, nós não conhecíamos, a lotear de 20% a 40% das vagas nos vestibulares de medicina onde eles atuavam”, afirmou André Luis Pinho, promotor de Combate ao Crime Organizado do Ministério Público de Minas Gerais.
Eles foram gravados pela polícia entrando em um hotel na cidade de São Paulo com mochilas e caixas onde estavam os equipamentos eletrônicos no dia 18 de outubro deste ano, véspera de um vestibular de medicina. No hotel, estavam os “pilotos” que resolveriam as questões deste processo seletivo.
A transmissão era feita de um Chrysler preto, com vidros blindados, que ficava estacionado perto dos locais de prova. Um sistema de rádio com frequência exclusiva era usado para enviar o gabarito codificado. Este esquema foi usado nos processos seletivos de faculdades privadas.
De acordo com o delegado Antônio Júnio Dutra Prado, coordenador do Grupo de Combate às Organizações Criminosas da Polícia Civil, que atua junto ao Ministério Público de Minas Gerais, a quadrilha estava em Pontes e Lacerda, uma cidade do interior de Mato Grosso, nos dias do Enem, 8 e 9 de novembro deste ano, de onde transmitiram o gabarito para candidatos que vários estados. Segundo o delegado, pessoas ligadas à organização do Enem nesta cidade de Mato Grosso vazaram os cadernos de questões uma hora antes das provas, e “pilotos” resolveram as perguntas de uma pousada da região.
No caso do Enem, como os candidatos estavam separados, foi usado um dispositivo de telefonia GSM parecido com um cartão de crédito. O gabarito era transferido por celular para todos os candidatos, através do microponto eletrônico, como se fosse uma ligação em conferência. Esta transmissão foi registrada pela polícia.
Havia ainda um manual de uso do sistema de transmissão para os candidatos.
– Não mascar chiclete, bala, chocolate, etc. O movimento mandíbula maxilar faz com que ocorra pressão no canal intra-auricular fazendo com que o ponto folgue e pode chegar a ficar visível.
– Não mascar nada. O movimento da boca pode provocar pressão no canal do ouvido, fazendo com que o ponto eletrônico folgue e fique visível.
– O que você escuta, anote sempre. Depois traduza e transcreva para o exame.
A polícia também monitorou uma viagem que Áureo fez à China, para comprar os transmissores e os pontos eletrônicos. Na casa dele, em Teófilo Otoni, em Minas, e na casa de Carlos Roberto, no Guarujá, foram apreendidos centenas dos equipamentos. Documentos falsificados, lista de vestibulares que teriam sido fraudados, extratos bancários que comprovariam o pagamento ao bando também foram recolhidos. Em uma agenda, a políca encontrou mais de 160 nomes de candidatos que teriam sido aprovados após a compra do gabarito.
Até a prisão, o grupo fez o mesmo esquema em outros cinco processos seletivos de faculdades de medicina do estado de São Paulo e Belo Horizonte, e pretendiam repetir a fraude em mais cinco vestibulares até janeiro.
“A polícia afirma que realmente houve fraude no último exame do Enem no Brasil”, confirmou o delegado da Polícia Civil de Minas Gerais, Jeferson Botelho.
O advogado Délio Gandra, que representa Áureo Ferreira e Carlos Lobo, disse que seus clientes confessam a fraude, mas não na dimensão dada pela polícia. Eles também assumem chefiar o esquema.
O Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep), responsável pelo Enem, disse por nota que “solicitou à Polícia Federal informações sobre o caso. O Inep reafirma que qualquer pessoa que tenha utilizado métodos ilícitos para obter vantagens no Enem será sumariamente eliminado do exame, sem prejuízo a outras sanções legais.”
“Nós vamos atrás de cada um dos fraudadores que se beneficiaram com este esquema delituoso”, encerrou o promotor.
G1
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