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O compliance como medida de prevenção à lavagem de dinheiro no Brasil

por Editoria Delegados

Por  Edson Pinheiro dos Santos Junior

Por  Edson Pinheiro dos Santos Junior

Por força dos resultados da operação Lava-Jato no Brasil e de uma enorme pressão internacional, e seguindo os passos da Foreign Corrupt Pratice Act, legislação anticorrupção americana, em 2013, a então presidente da República, Dilma Roussef (PT), promulgou a lei anticorrupção brasileira. A legislação abarca uma série de medidas de prevenção, além da aplicação de penalidades às empresas que se envolvem em corrupção que variam de 0,1% a 20% de seu faturamento bruto no exercício financeiro anterior. Ainda baseado neste movimento do governo federal, um pouco antes, houve a reforma da lei de lavagem de dinheiro, que promoveu a ampliação do âmbito de responsabilidades para o tema. Mas, apesar dos esforços já empreendidos, é preciso mais.

Não de hoje, é comum no Brasil ouvirmos sobre “compliance”, “programa de integridade” e “governança corporativa”. A prerrogativa dessas expressões é o enfrentamento à corrupção, à lavagem de dinheiro e a demais crimes praticados por organizações que se valem, justamente, do contexto de desorganização ou de ausência de fiscalização por parte dos órgãos competentes face a estas atividades nada republicanas.

No cenário nacional, é quase simbiótica a relação entre o corrupto, pessoas jurídicas e lavagem de dinheiro, sendo que o nível de sofisticação das medidas para o encobrimento da origem dos valores ilícitos perpassa cada vez mais por processos elaborados nas searas contábil e fiscal. Não é incomum, por exemplo, a reinserção de valores desviados num sistema de economia formal. E as possibilidades são plurais: investimentos estrangeiros, off shores, trusts, criptoativos, doleiros, empresas de fachadas e laranjas.

A efetividade de uma legislação passa, necessariamente, pelo treinamento e pela difusão do conhecimento técnico dos agentes públicos que atuam na área e, também, pela vontade política dos ocupantes de cargos públicos de primeiro escalão – responsáveis pela definição de estratégias para o combate ao crime.

Daí, surge a necessidade de implementação de programas de compliance, tanto na iniciativa privada quanto na Administração Pública, com direito à adoção de padrões éticos na condução de negócios e de tratativas que afastem e não incentivem a adoção de comportamentos desleais.

A exigência para que empresas que contratam com o poder público apresentem programas de compliance chega como forte aliado e coloca os mais variados segmentos econômicos como protagonistas e responsáveis pela redução de práticas que causam danos à competitividade e geram enriquecimento ilícito de agentes e de grupos econômicos.

Como tudo que é novidade, num primeiro momento, a ideia é atacada com a alegação de que, numa política econômica neoliberal, como a do Brasil, seria o compliance mais uma maneira de aumentar os custos do empresário. Porém, quando se percebe que um programa de integridade é investimento para a melhoria de processos dentro da organização empresarial, além de permitir alta competitividade e condições de igualdade entre concorrentes nos mercados nacional e internacional, o empresariado passa a aceitar, difundir e até apresentar propostas (ajustes, modernização, etc).

Em paralelo, este grupo ainda tem a possibilidade de obter uma série de benefícios fiscais e tributários, bem como usufruir de finaciamentos e de demais condições favoráveis para a geração de negócios, e de conquistar certificações da Organização Internacional de Normalização, popularmente conhecida como ISO.

A adequação do sistema empresarial às determinações do Banco Central do Brasil (Bacen) e do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) e à lei de lavagem de dinheiro permitem que transações comerciais em espécie ou em algumas situações específicas sejam comunicadas. Por si só, a medida, em tese, tende a dificultar a prática de crimes no Brasil; alimenta os sistemas de inteligência financeira e prevê o estabelecimento de uma cultura colaborativa no enfrentamento às práticas de suborno, propina, fraude, apropriação indébita ou qualquer outro desvio de recursos por parte de um funcionário público.

É certo que a luta contra a corrupção não é uma atividade exclusiva de forças policiais, em especial as Polícias Civis e Federal. Entretanto, são estas as instituições de Estado que têm maior proximidade e obtenção de informações face à temática. Natural até, principalmente porque a criminalidade no País, em sua grande maioria, tem viés patrimonial.

Logo, a capacitação das forças de segurança, por meio de treinamentos, investimento em equipamentos e expertise, gera, necessariamente, um saldo extremamente positivo na balança econômica nacional e internacional – coloca o Brasil nos padrões de confiabilidade e atende o regramento internacional de práticas competitivas e de anticorrupção, permitindo a melhoria do ambiente de negócios, a recuperação de ativos no exterior, a identificação de malversação do erário e um melhor posicionamento no cenário mundial.

Não há espaço para imposições descabidas dos poderes públicos aos agentes econômicos de um Estado. O avanço das medidas de gestão exige que a administração pública adote medidas modernas já utilizadas no mundo corporativo, com o aperfeiçoamento de comportamentos e práticas, já bem destacados na década de 1930 pelos economistas Adolf Berle e Gardiner Means.

Se quisermos uma gestão eficiente na administração pública brasileira, não podemos alijar o empresariado desta discussão, seja adotando práticas de governança, seja o educando para a importância da prevenção de crimes, em especial a lavagem de dinheiro.

Sobre o autor

Edson Pinheiro dos Santos Junior é delegado de Polícia; pós-graduado em Direito Penal Econômico; e em Direito Penal, Processo Penal e Crimes Difusos e Coletivos; especialista em Crimes Econômicos, Financeiros, Tributários e Lavagem de Dinheiro; professor universitário de cursos de graduação em Direito; titular da Delegacia de Investigações Gerais e da Delegacia de Investigações Sobre Entorpecentes (Dise); e diretor do Sindicato dos Delegados de Polícia do Estado de São Paulo (Sindpesp).

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