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A Polícia Civil deve ser extinta

por MARCELO FERNANDES DOS SANTOS

GERAL
A Polícia Civil deve ser extinta
Por Antônio Ferreira

GERAL

{loadposition adsensenoticia}Quando eu escuto alguem falando em unir as Polícias Militar e Civil como forma de melhorar o combate a criminalidade eu acho cômico, pois mostra que essa pessoa não entende nada acerca da natureza jurídica das duas instituições. Ou, por outro lado, ela entende profundamente mas possui intenções outras, muitas vezes inconfessáveis.

O engano do leigo é totalmente perdoável, principalmente porque as duas instituições possuem o vocábulo “polícia” em sua nomenclatura, porém o que as duas instituições tem em comum é somente este vocábulo, de resto são inteiramente diferentes. Alguns também gostam de usar expressões do tipo: “policias irmãs”, dando a entender ao leigo que elas são próximas, quando na verdade as duas polícias não são ao menos primas distantes, melhor colocando, não são sequer parentes.

Falar na união das polícias seria o mesmo que sugerir a união da seleção brasileira de futebol com a seleção brasileira de vôlei. Explicarei melhor:

À policia militar, desde os primórdios de sua criação, cabe a função de policiamento ostensivo e de manter a ordem pública; a sua doutrina é o militarismo, de onde decorre a estrutura e hierarquia rígida, a obediência atávica às ordens superiores. Os militares são regidos por um sistema legal diferente do comum: possuem código penal e processual próprios; e são julgados por uma justiça especializada própria: a Justiça Militar. São consideradas forças auxiliares e de reserva do Exército Brasileiro, defendem o Estado. A polícia militar, pela natureza das suas funções, é ligada umbilicalmente ao Poder Executivo.

A Polícia Civil, que também já foi chamada de Polícia Judiciária, existe para realizar o Código Penal através do seu procedimento previsto no Código de Processo Penal. Sua função precípua é investigar fatos definidos como crimes, colhendo provas da materialidade e esclarecer a autoria. Sua função é em essência ligada ao Poder Judiciário.

Na Itália, de onde nossos primeiros legisladores e doutrinadores, da estirpe de Anibal Bruno, se inspiraram para confeccionar o Código Penal e também o de Processo Penal, o Poder Judiciário possui as funções de Investigar, Denunciar e de Julgar. Lá o magistrado Investiga, Denuncia e Julga os fatos criminosos. Lá existe o Magistrado Investigador, o que Denuncia e aquele que Julga, todos inseridos na mesma instituição, e é justamente por isso que existe um artigo no nosso Código de Processo Penal de nítida inspiração italiana, o artigo 252 onde diz que que o Juiz não pode exercer jurisdição nos processo em que desempenhou funções de autoridade policial e de Ministério Público. Era para ser assim também no Brasil, porém, como aqui os presidentes sempre querem possuir poderes de imperador e os políticos sempre se protegem de possíveis investigações e condenações, trataram de dar o famoso “jeitinho brasileiro”.

Vale ressaltar que esse artigo 252 do Código de Processo Penal revela que autoridade policial é aquela que exerceu uma das facetas do Poder Judiciário que é o poder de Investigar, nos moldes do Poder Judiciário da Itália.

Assim, aqui no Brasil os políticos retiraram do Poder Judiciário os poderes de Investigar e o de Denunciar e os colocou no Poder Executivo, criando uma Polícia Civil e um Ministério Público mitigados. Desta forma o Executivo sempre controlou as investigações e as ações penais. Isso em parte mudou com a Constituição Cidadã promulgada em 1988, pois o Ministério Público teve suas funções reconhecidas como pertencentes à de Poder Judiciário e a ele foi equiparado, conquistando sua liberdade do Poder Executivo. Ganhou com isso a sociedade brasileira, e ninguém pode negar que foi um grande avanço no combate a corrupção e a impunidade. Mas, em grande parte dos casos, o Ministério Público somente denuncia aquilo que for investigado pela Polícia Judiciária e esta ainda está sob o domínio do Poder Executivo, ou seja, este último ainda tem poder de interferir para proteger os seus apaniguados. Somente para exemplificar todos sabem o que aconteceu com o Delegado Protógenes, que de investigador passou a ser tratado como criminoso, e ainda tem aquele caso dos dois Delegados do Rio de Janeiro que fecharam uma rinha de galos do então marqueteiro do ex-presidente e que foram transferidos de suas funções.

Ora, não é porque uma vaca entra num chiqueiro que ela se transforma em porco, já dizia o professor Antonio Carlos Marcatto, da mesma forma, não é porque a Polícia Civil está inserida atualmente no Poder Executivo que ela perdeu sua essência de ser uma das funções do Poder Judiciário, qual seja, a de realizar o Código Penal através do procedimento previsto no Código de Processo Penal, consistindo na primeira fase da persecução penal.

Por isso eu disse no título deste que a Polícia Civil deveria ser extinta, pois nos moldes em que ela está hoje, ela não presta para exercer com total e plena eficiência suas atribuições, principalmente no tocante ao combate à corrupção e a impunidade. E por possuírem natureza jurídica distintas, as Polícias Militar e Civil, sendo em suas essências pertencentes a Poderes diversos, uma ligada ao Poder Executivo e outra ao Judiciário, não podem, nunca, serem unificadas.

Já existem projetos no congresso nacional colocando a função de Investigar no Ministério Público e até mesmo na Magistratura e isso seria decisivo para combater com maior eficiência a corrupção e a impunidade, entretanto os políticos fazem vista grossa para esses projetos, ao contrário, o que temos visto é alguns querendo amordaçar o Ministério Público e criar leis para embaraçar o pleno exercício do Promotores de Justiça.

O primeiro passo para extinguir a Polícia Civil nos moldes em que está seria a mudança da nomenclatura. Nos EUA a polícia de maior respeito é o FBI, Federal Bureau of Investigation. Bureau (pronuncia-se “birô”) é uma palavra de origem francesa, cujo significado é “lugar onde se realiza um trabalho intelectual”. Acredito que podemos utilizar essa experiencia americana e criarmos, a título de sugestão, o Bureau de Investigações Judiciais, e deixarmos o vocábulo “polícia” apenas para o órgão ligado umbilicalmente ao Poder Executivo. Delegado de Polícia seria doravante chamado de Delegado de Investigação.

O segundo e derradeiro passo seria conseguir para a Polícia Civil uma libertação do Poder Executivo nos moldes do Ministério Público ou a simples absorção daquela por este ou pela Magistratura, e desta forma completaríamos o sistema de freios e contrapesos imaginado pelo criador da teoria dos três poderes para se contrapor aos poderes absolutistas dos Reis de outrora, mas que ainda hoje, em pleno século XXI, ainda reverbera no Brasil.

Sobre o autor

Antonio Ferreira é delegado de polícia/GO

DELEGADOS.com.br
Revista da Defesa Social
Portal Nacional dos Delegados

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