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Responsabilidade civil objetiva do Estado por omissão está em pauta no STF

por MARCELO FERNANDES DOS SANTOS

JURÍDICO
Responsabilidade civil objetiva por omissão em pauta no STF

JURÍDICO

{loadposition adsensenoticia}A Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) reconheceu, nesta terça-feira (1º), a existência de repercussão geral em processo que discute se Prefeitura de São Paulo foi ou não omissa em fiscalizar e impedir a comercialização indevida de fogos de artifício em ambiente residencial que resultou em forte explosão. A questão será analisada por meio do Recurso Extraordinário (RE) 136861.

A decisão desta tarde seguiu proposta do ministro Gilmar Mendes, presidente da Segunda Turma. No ano passado, ele pediu vista do processo, de relatoria do ministro Joaquim Barbosa, que hoje acolheu as considerações de Mendes e reajustou seu voto. Barbosa havia condenado a Prefeitura ao pagamento da indenização, ao reconhecer a culpa administrativa por não realizar a fiscalização.

Segundo o ministro Gilmar Mendes, o caso se distingue de outros analisados pelo Supremo porque o acidente decorreu de atividade para a qual a lei exige autorização prévia, que, segundo se constata do laudo pericial e da própria ação de indenização, não foi obtida pelos donos do estabelecimento.

A administração municipal jamais chegou a autorizar o manejo e a comercialização de fogos de artifício no local, tendo apenas recebido o pedido para tanto, afirmou o ministro. Ele informou que, apesar de os responsáveis pelos fogos de artifício terem solicitado a autorização, o pedido não chegou a ser examinado pela administração municipal, já que o procedimento administrativo não tinha sido instruído adequadamente, estando ausente, inclusive, a prévia comunicação para a autoridade policial, o que é indispensável.

Os autores da ação alegaram que os donos do estabelecimento irregular protocolaram pedido perante a autoridade administrativa competente com o objetivo de obter autorização provisória para a venda de rojões durante as festas juninas.

A matéria, para mim, parece que é realmente de grande relevância porque, de fato, o que se discute aqui é se teria havido a omissão da municipalidade – um município gigantesco como São Paulo porque houve o pedido, mas enquanto isso não havia possibilidade de que o requerente instalasse uma loja ou qualquer atividade concernente a fogos de artifício, avaliou o ministro Gilmar Mendes.

Ele chegou a listar os precedentes do Supremo que se referem à responsabilidade estatal por omissão para mostrar que todos tratam de situações distintas e não se amoldam aos elementos fáticos do caso em discussão.

Segundo Gilmar Mendes, na espécie, verifica-se que a questão constitucional tratada responsabilidade objetiva pela omissão em fiscalizar atividade não autorizada pela municipalidade tem notória importância na responsabilidade civil do Estado e necessita ser pacificada pelo Plenário desta Casa.

Entre os julgamentos citados pelo ministro, e que não se amoldam ao processo em análise, estão os que tratam de colisão com animal em via pública, falta de fiscalização preventiva de equipamento utilizado por prestador de serviço público, invasão de terras particulares por trabalhadores sem-terra inadequadamente alojados pelo ente público, assalto cometido por foragido, desabamento de edifício por falta de canalização de águas subterrâneas e assassinato de presidiário por companheiro de cela.

A responsabilidade civil do Estado, também denominada responsabilidade extracontratual, tem origem no Direito civil, de acordo com o qual, todo aquele que causar dano a outrem fica obrigado a repará-lo. No âmbito do Direito administrativo, no entanto, as regras são diferentes daquelas aplicáveis no Direito civil, diante dos princípios que regem a relação do Estado com os particulares. Dessa forma, se a atividade estatal é impositiva, a responsabilidade civil do Estado pela prestação desta atividade deve ser equitativamente rigorosa.

De acordo com a Constituição Federal, a responsabilidade do Estado é objetiva, nos seguintes termos:

Art. 37, 6º – As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa.

Pela Lei Maior, o Estado responsabiliza-se pelos atos de seus agentes públicos e deve responder de maneira objetiva, ou seja, os elementos desta responsabilidade são: a conduta, o dano e o nexo causal, sem que sejam analisados a culpa ou o dolo do agente.

O caso julgado no RE 136.861, entretanto, cuida da responsabilidade civil por omissão.

De acordo com Fernanda Marinela, a responsabilidade civil por omissão se dá quando há o dever legal de prestar o serviço e o Estado assim não age; se desse comportamento omissivo resulta prejuízo pra terceiro, haverá responsabilidade civil objetiva por omissão.

Em algumas hipóteses é pacífico o entendimento de que o Estado é responsável nos casos de omissão. Veja-se, por exemplo, a questão de presos que são mortos nos presídios. No julgamento do RE 466.322-AgR/MT, o ex-Ministro Eros Grau, assim se posicionou:

O consagrado princípio da responsabilidade objetiva do Estado resulta da causalidade do ato comissivo ou omissivo e não só da culpa do agente. Omissão por parte dos agentes públicos na tomada de medidas que seriam exigíveis a fim de ser evitado o homicídio. Recurso conhecido e provido para condenar o Estado do Rio de Janeiro a pagar pensão mensal à mãe da vítima, a ser fixada em execução de sentença

No fato ocorrido em São Paulo que ensejou o recurso (RE 136.861) já se pronunciaram os Ministros Celso de Mello e Joaquim Barbosa, relator do recurso. Para aquele primeiro Ministro:

(…) a responsabilidade civil objetiva, mesmo na hipótese de omissão do Poder Público, configurar-se-ia, inclusive, para efeito de incidência do art.377,6ºº, daCFF. Corroborou que a responsabilidade civil do Poder Público mostrar-se-ia compatível com hipótese de comportamento negativo deste, especialmente em situação como a presente, em que os pressupostos fáticos se achariam soberanamente reconhecidos pelo acórdão e pela sentença proferidos nos autos. Reafirmou o comportamento falho da Administração municipal no controle e fiscalização de uma atividade claramente de risco, que gerara de maneira trágica os eventos mencionados. Esclareceu haver um indissociável liame, um claro vínculo de causalidade material, com o próprio comportamento da Administração Pública ( Informativo 601 20 a 24 de setembro de 2010 ).

O Ministro Gilmar Mendes ao se manifestar entendeu que há relevância suficiente para que o Pleno se manifeste sobre o assunto, razão pela qual ao recurso foi reconhecida repercussão geral. A repercussão geral é assim prevista na Constituição Federal:

Art. 102, 3º: No recurso extraordinário o recorrente deverá demonstrar a repercussão geral das questões constitucionais discutidas no caso, nos termos da lei, a fim de que o Tribunal examine a admissão do recurso, somente podendo recusá-lo pela manifestação de dois terços de seus membros.

Resta-nos, portanto, aguardar a decisão do Pleno do STF.

Áurea Maria Ferraz de Sousa

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