Início » Instrutores de elite para uma polícia de excelência

Instrutores de elite para uma polícia de excelência

por Editoria Delegados

PR: Entrevista com os profissionais responsáveis por formar os novos policiais

 

A arma de fogo é uma das mais importantes ferramentas que o policial civil tem a sua disposição. Para que seja utilizada com qualidade e efetividade, é fundamental que o policial tenha uma capacitação adequada. Tanto em condições técnicas, como no conhecimento subjetivo de todos os aspectos que envolvem o instrumento.

 

Pensando nisso a ESPC – Escola Superior de Polícia Civil implantou e tem desenvolvido desde o primeiro semestre deste ano de 2015, um modelo pedagógico onde além da qualidade do tiro, a “oportunidade” da sua realização recebe especial ênfase, ou seja, o policial deve saber não só atirar bem, mas principalmente quando realizar esse tiro.

 

Para ministrar as instruções teóricas e práticas de armamento e tiro, dentro dessa nova perspectiva operacional, a ESPC montou um time de craques, o qual já foi inclusive enaltecido por um dos mais respeitados instrutores do Brasil, o Sr. Sandro Bearare – Diretor da Propoint.

 

Na foto a equipe formada pelos investigadores – Vamberto Silva -Instrutor Chefe, Paulo Pacheco Filho- Instrutor Adjunto, e Edson Moreira – Instrutor Auxiliar – concede uma entrevista inédita e esclarecedora acerca da formação dos policiais civis no Paraná, abordando questões do dia a dia policial sob uma ótica técnica, profissional e altamente legalista.

 

  

Fale um pouco da sua carreira.

 

Iniciei minha carreira profissional em 1983 como policial militar do estado da Paraíba, nesse período trabalhei no Policiamento de R/P (Rádio Patrulha), Policiamento de Choque, Serviço de Inteligência e Gabinete Militar do Governador, na função de agente de segurança pessoal do Governador no período de 1987 a 1991. Em seguida, fui para Secretaria da Segurança Pública exercer o cargo de assessor auxiliar, sendo designado para ministrar a disciplina de Armamento e Tiro na Academia de Polícia Civil (ACADEPOL-PB), pois nessa época já era instrutor de tiro e Sócio Proprietário Fundador do Clube Pessoense de Tiro. Em 2001, fui nomeado Diretor Administrativo da Academia de Polícia Civil (ACADEPOL-PB), mas continuei ministrando instrução de tiro nos cursos de tiro defensivo, ações táticas especiais pelo plano nacional de segurança pública e na formação de delegados e demais policiais de carreira, coordenava também o Setor de Armas e Recarga de Munições. Em 2004, a pedido, fui relotado na Secretaria da Saúde, pois havia me formado em Psicologia Clínica, sendo designado como Psicólogo da UTI (Unidade de Terapia Intensiva) do hospital de emergência e trauma de João Pessoa-Pb, nesse período conclui uma Pós-Graduação em Neuropsicologia e outra em Psicologia Hospitalar e da Saúde, sendo também Coordenador da Subcomissão de Psicologia Hospitalar e Presidente da Comissão de Neuropsicologia do CRP-13 (Conselho Regional de Psicologia 13ª Região-PB). Em junho 2014, fui nomeado na Polícia Civil do Paraná, no cargo de Investigador de Polícia, sendo designado para a 4ª SDP (Subdivisão de Polícia), na cidade de União da Vitória-PR, onde ministrei palestras com o tema: “Psicopatologia do Trabalho”, no Centro de Saúde com o pessoal da Polícia Civil e também no Batalhão da Polícia Militar com os Policiais Militares daquela cidade. Em janeiro de 2015, fui convidado pelo Diretor da Escola Superior de Polícia Civil, Dr. Rogério Antonio Lopes, como instrutor de Tiro e Chefe de Seção de Armamento e Tiro da Escola Superior de Polícia Civil do Paraná.

 

Qual o papel da ESPC na formação do policial civil ?

 

A Escola Superior de Polícia Civil tem um papel fundamental na formação do policial civil, deve ser reconhecida como o coração da instituição policial, pois é aqui que tudo se inicia desde a formação, o acompanhamento e a capacitação de todos os policiais civis durante suas atividades profissionais e até mesmo quando da aposentadoria, pois é um lugar de visitação e recordações dos colegas de turmas. Na Escola o policial recebe treinamentos específicos do ponto de vista técnico, físico e psicológico, para exercer com plenitude a sua função de defensor da sociedade, pois a polícia existe para servir e proteger o cidadão.

 

Treinar para atirar ou atirar para treinar. O que isso significa ?

 

Como qualquer atividade, para ser bem desempenhada requer assimilação e a automatização de alguns procedimentos básicos. Não podemos duvidar que um jogador de futebol, antes de fazer um gol, tem de treinar exaustivamente seus chutes e o domínio da bola, que um médico cirurgião, antes fazer uma cirurgia no paciente, tem de estar habituado ao manejo do bisturi. Com o policial não deve ser diferente. Quando ele treina para atirar, seus resultados são bem diferentes de quando ele atira para treinar. Tenho comprovado isso durante os mais de 15 anos como instrutor de armamento e tiro. Pois somente o treinamento lhe permitirá automatizar o manejo correto da arma de fogo, fazendo com que a arma seja uma extensão de seu próprio corpo, dessa forma, oferecendo maior segurança nas operações policiais e à toda sociedade, além de saber aplicar as técnicas corretas de tiro para situações diversas.

 

Você dá muita ênfase na segurança no trato com a arma de fogo. Acredita que esse quesito pode melhorar a qualidade do trabalho policial ?

 

A segurança no manuseio de arma de fogo deve ser rigorosamente exigida por qualquer instrutor de tiro, a começar pela forma de passar a arma para o outro, o direcionamento do cano da arma e o dedo fora do gatilho. Não dá para pedir desculpas a alguém que foi atingido por um tiro acidental, pois na maioria das vezes o dano é irreversível. Nas instruções de tiro os incidentes e as panes com o armamento são comuns e fazem parte do treinamento, pois o policial deve está preparado para sanar um INCIDENTE ou uma pane na arma durante uma situação real, mas os ACIDENTES devem ser evitados. Pois não basta saber atirar, é importante saber decidir Quando atirar?, Onde atirar? E por que atirar?. Muitos policiais quando em ocorrências deixam de fazer estes questionamentos antes de atirar e terminam atirando sem a extrema necessidade e em locais inseguros, principalmente para as pessoas que não estão envolvidas na situação. Daí a importância do treinamento técnico, físico e psicológico, pois quem tem como instrumento de trabalho uma arma de fogo, tem que conhecer e respeitar as regras básicas de segurança no estande de tiro e principalmente nos confrontos armados, nesse momento o alto nível de estresse é inevitável, porém controlável.

 

Qual a diferença entre o tiro de defesa e o tiro policial ?

 

No tiro de defesa, geralmente o policial é surpreendido pelo bandido e o tempo de reação e precisão ao sacar sua arma para se defender, poderá fazer a diferença entre viver ou morrer. Já no tiro policial, na maioria das vezes ele está em equipe, mesmo sendo atacado pelos bandidos terá mais tempo para reagir e a distância é bem maior do que no tiro de defesa, que acontece entre 5 e 7 metros e entre 3 e 6 segundos, já no tiro policial, às vezes há tempo para se abrigar e planejar como reagir, enquanto no tiro de defesa, tudo acontece em fração de segundos. Sendo assim, muitos policiais tem perdido a vida sem efetuar um só disparo, por mais que estejam portando arma e munições. Então esse tipo de situação requer além de treinamento específico, orientação que estimule a percepção e uma avaliação preventiva para que o policial saiba minimizar os riscos. Portanto o treinamento do tiro de defesa não deve ser confundido com o treinamento do tiro policial, pois as distâncias desses confrontos são diferenciadas. Entendemos que o tiro de defesa é aquele que acontece na maioria das vezes inesperadamente e principalmente quando o policial está de folga e se encontra em uma lanchonete, restaurante, farmácia, posto de gasolina, loterias, supermercado ou mesmo ao chegar em sua garagem e ser surpreendido e ter que reagir a um assalto, essa modalidade de tiro exige muita rapidez e precisão.

 

Fale um pouco sobre a perspectiva de segurança do policial em locais de risco como postos de gasolina, lotéricas etc.

 

O policial deve estar atento principalmente quando da sua folga ou mesmo nas tarefas de ordem particular, a percepção ainda é a maior arma do policial. Devemos exercitar sempre a nossa atenção e percepção, pois bastam alguns segundos de distração para colocarmos em risco a nossa vida, assim sendo, é sempre importante o policial conhecer e evitar ser surpreendido em locais como: bares restaurantes, farmácias, postos de gasolina, loterias e supermercados, todos esses locais são de grande risco e muitos policiais tem perdido a vida nesses ambientes. Quando o policial é surpreendido pelo bandido, mesmo estando armado e com muitas munições, suas chances de sobrevivência são mínimas.

 

A ESPC implantou a munição treina. Em que isso pode melhorar a instrução dos alunos?

 

A munição treina possui baixo custo e proporciona total segurança em treinamentos, garantindo excelente precisão, perfeito funcionamento nas armas e ausência de negas de tiro, que são comuns quando se usa munições recarregadas. A munição treina representa alto desenvolvimento tecnológico e visa a proteção da saúde e do meio ambiente, o que é uma tendência mundial. A Escola Superior de Polícia Civil deu um grande passo quando recentemente implantou a munição treina, pois durante os treinamentos com policiais em curso formação, foram efetuados mais de 3.500 tiros e não se verificou qualquer falha nas munições ou qualquer tipo de poluição, mesmo no estande fechado, e sem a utilização dos exaustores. Antes com a munição recarregada o nível de poluição era grande, comprometendo assim, a saúde dos alunos e dos instrutores, através de uma intoxicação conhecida tecnicamente por saturnismo e particularmente perigosa por ser cumulativa, já que o metal dificilmente é eliminado pelo organismo, pois a intoxicação do ser humano ocorre por aspiração ou inalação dos elementos tóxicos. O simples manuseio de estojos deflagrados ou de projéteis de chumbo, fato bastante comum na recarga de munição, já é fonte de contaminação.

 

Você é formado em psicologia e faz palestras para policiais sobre o tema. Acha que o estresse policial pode interferir na interação do policial com sua arma?

 

A profissão policial é uma das mais desgastantes, pois são profissionais em estado de alerta 24 horas por dia, que vivenciam no seu dia a dia situações de conflito, violência, morte, e que precisam aprender a gerenciar o estresse, principalmente quando estão participando de ocorrência de alto risco como os confrontos armados que resultam em vítimas fatais. Nessas situações, estudos nos mostram que a visão periférica do policial é diminuída, formando uma espécie de túnel, seus batimentos cardíacos e sua respiração elevam-se a níveis extremos. Dessa forma, se o policial não teve treinamento específico, o estresse pode sim interferir na interação não só com sua arma, mas com toda equipe, pondo em risco inclusive toda operação policial. Em todos os cursos dos quais participamos na ESPC, procuramos contribuir com os policiais civis no sentido de prepará-los para o correto gerenciamento de situações que podem surgir no dia a dia.

 

Existe um rol de regras básicas em confronto armado?

 

A primeira regra a ser usada em uma situação real de confronto armado é a PROTEÇÃO, a segunda regra é a OBSERVAÇÃO e a terceira regra é a CONDIÇÃO DE TIRO. Após proteger-se e observar, o policial deve estar em condições de fazer pronto uso da arma. Isto poderá ser feito de modo a poder dar cobertura a um colega que avança, ou bloquear uma ação do oponente.

 

Existe ainda o que chamamos de triângulo da sobrevivência que é formado pela: TÉCNICA, TÁTICA E CONTROLE EMOCIONAL.

 

A técnica – consiste em conhecer a arma, formas de carregar, porte, resolução de panes, mira, respiração, dedo fora do gatilho e tudo mais que é utilizado para efetuar um tiro preciso.

 

A tática – consiste no conhecimento para o correto uso da técnica, podemos enquadrar aqui, a grosso modo, a decisão de se atirar ou não, a forma correta de se mover com uma arma, de se ocultar sobre uma cobertura ou abrigo, de entrar num recinto.

 

Por fim, e o mais importante, por isto está na base do triângulo, é o controle emocional. Muito difícil de ser treinado e variando de pessoa para pessoa. Podemos simular situações de estresse, treinar técnicas e táticas para melhorar a confiança, todos os itens podem auxiliar na situação real. Mas saber exatamente como agir, e manter o controle emocional, só mesmo no momento. A solução para isso encontra resposta na capacitação continuada, projeto que esta ESPC pretende implantar no próximo ano.

 

Se tivesse que dar um conselho para seus colegas policiais civis em relação à utilização da arma que porta, qual seria?

 

Uma das situações mais difíceis da atividade policial, é a decisão de atirar em alguém, para isto, o policial deve ter condições de decidir com base na lei, o momento correto de utilizar sua arma, sabendo que só deverá atirar em duas situações especialíssimas: primeiro para defender a própria vida e segundo para defender a vida de terceiros. Dessa forma, o conselho que dou aos colegas policiais civis, é que mesmo quando se encontrarem em situações de confronto armado, devem agir tendo como base os princípios da “legalidade, necessidade, proporcionalidade, moderação e conveniência”.

 

 

 

Fale um pouco da sua carreira.

 

Sou policial civil há 15 anos, desde criança sempre quis ser policial. Sendo assim, esperei completar 21 anos e fiz o concurso. Estagiei no Grupo TIGRE por dois anos e vi que minha meta era me tornar um policial dos grupos de elite, neste tempo trabalhei no COPE por oito anos e na PIC por três, trabalhei também na Delegacia de Homicídios de Curitiba por um ano e desde então estou aqui na ESPC.

 

Como o policial civil deve utilizar sua arma dentro do princípio do uso progressivo da força?

 

A arma de fogo deve sempre ser utilizada com máxima segurança e responsabilidade. Devemos lembrar que o uso progressivo da força começa com a presença policial e termina com o – eventual – uso da arma de fogo. Isso não quer dizer que não possamos utilizar a arma desde logo. Tudo vai depender do caso concreto e da avaliação direta do policial. Por isso é tão importante a capacitação do mesmo e seu conhecimento quanto a aspectos técnicos e legais. Em uma troca de tiros com meliantes armados, por exemplo, nós policiais devemos nos proteger e a terceiros e utilizarmos as armas para impedir ou acabar com a injusta agressão.

 

O surgimento conceitual técnico acerca do Uso Progressivo da Força, utilizado atualmente, data de 1928. No início não se referia ao trabalho de Segurança Pública. Com o passar dos anos foi sendo adaptado e hoje é uma das mais importantes ferramentas que a polícia tem a sua disposição.

 

Faça uma análise técnica das armas utilizadas atualmente pela PC.

 

Bom começamos com as armas curtas. O revólver nos calibres 38 e 357 magnum são armas excelentes, porém com pouca capacidade de tiro. Vale dizer que há modelos com capacidade ampliada para sete ou oito tiros.

 

Já as pistolas Taurus tem maior capacidade, com carregadores de 11 a 17 tiros no calibre .40 e 9 mm. Temos também a Imbel .45 ACP com capacidade que varia entre sete e dez tiros.

 

Já as armas longas temos a espingarda calibre 12 de marca CBC que ao meu ver, um dos melhores calibres criados pelo homem, pois, se trata de arma com múltiplas funções, sendo utilizada com munições letais e menos que letais muito usadas em rebeliões e controle de distúrbios. Temos também a bonanza calibre 12 de 2 tiros em cano duplo.

 

Na função Carabina, temos dois modelos: rossi e taurus. As cabinas rossi são cópias das antigas winchester, muito precisas e confiáveis. E a taurus foi concebida no calibre .40 com carregador para quinze e trinta tiros, sendo bastante precisa e confortável em sua utilização.

 

Os fuzis são utilizados via de regra pelos grupos especiais e se apresentam em dois calibre 556 e 762, necessitando de capacitação especial para seu uso.

 

Diante da metodologia instrucional atualmente utilizada pelo corpo de instrutores da ESPC, como tem sido o aproveitamento e o feed back dos alunos.

 

Muito bom. Podemos dizer que o aproveitamento está acima da média. A nova metodologia adotada, a qual consiste basicamente em uma abordagem técnica de alto nível, começando pela postura dos instrutures, passando pela “humanização” da abordagem do aluno e concluindo com as mais modernas técnicas de capacitação e treinamento praticadas em nível mundial, diminui o nível de estresse e ansiedade nos alunos e otimiza a qualidades de cada um.

 

Inicialmente o aluno é capacitado nas questões legais, administrativas e teóricas. Isso na sala de aula do estande com o auxílio de vídeos e outras multimidias. Em seguida passa por um processo de interação com as armas, onde vai conhecê-las adequadamente, inclusive aprendendo a desmontagem de primeiro escalão. No próximo passo tem início o processo específico na realização do tiro policial, onde o aluno começa a ter noções da postura, posições básicas e etc, tudo isso ainda sem pegar na arma, para tanto utilizamos simulacros específicos os quais potencializam a segurança nessa fase do treinamento.

 

Finalmente o aluno passa para o “tiro sêco” onde apreende a técnica de puxada do gatilho e no último estágio vai para o tiro real.

 

Para atingir esse nível todos os instrutores que hoje são credenciados pela ESPC, passaram por um curso específico de 120 horas, onde foi exigida além da condição técnica de atirador, as várias competências pedagógicas, para possibilitar a transferência adequada de conhecimento para cada aluno, levando em conta as peculiaridades de cada indivíduo.

 

Hoje os alunos também passam por instruções específicas de desmontagem das principais armas utilizadas pela PC. Acha que isso pode contribuir com a formação do policial?

 

Sim. Esta instrução já era utilizada antigamente, no ano de dois mil, quando realizei o curso de formação na Escola passei por esta instrução. Desmontávamos os revolveres e a pistola para aprender a limpar as armas. Hoje os alunos realizam esta aula com o mesmo objetivo tanto com armas longas e curtas.Não são raras as panes que ocorrem por falta de manutenção, por isso essa instrução é tão importante assim como a conscientização do policial no sentido de manter sua arma sempre em ótimas condições para ser utilizada a qualquer momento.

 

Você trabalhou muito tempo com recarga de munição. Como está sendo hoje a utilização da munição “treina”?

 

Antigamente fazíamos as munições e ministrávamos as aulas, com certeza perdíamos um tempo precioso, considerando ainda que nossas máquinas eram manuais. Também nesta produção ficávamos expostos ao chumbo, e a resíduos de pólvora prejudicando a saúde. Agora com a utilização das novas munições do tipo “treina”, nosso tempo ficou muito mais otimizado, e podemos nos dedicar mais aos alunos e também na organização da casa de armas e do próprio estande.

 

As munições treina são atóxicas. Anteriormente depois de alguns disparos ficava muito difícil trabalhar em nosso estande que é indoor. O ar ficava extremamente poluido atrapalhando inclusive no aspecto visual, pois havia muita fumaça. A treina produz o mínimo de fumaça.

 

Na reestruturação do estande foi alocada uma barreira de proteção de pneus para evitar retornos. Isso tem oferecido maior segurança durante as atividades?

 

Com certeza, hoje as aulas de tiro são feitas com um percentual de retorno mínimo, isso melhorou e muito a segurança dentro do estante.

 

Na atividade policial quais são as principais diferenças entre os calibres .40, 9mm, 38 e .380?

 

Nesta área devemos sempre nos preocupar com tipos de calibres utilizados, devemos optar por um calibre com mais poder de parada e com uma boa velocidade. Atualmente utilizamos o cal. 40, padronizado na polícia, mas não devemos esquecer que há outros tão bons ou ainda melhores, como o calibre 9mm que tem velocidade alta e quando a munição utilizada é a “ponta oca” possui poder de parada excelente. Podemos dizer que o cal. 380 no trabalho policial não é muito indicado.

 

 

Fale um pouco de sua carreira.

 

Faço parte da Polícia Civil do Estado do Paraná desde 2011. Lotado inicialmente na Delegacia do Adolescente de Curitiba, sendo removido em 2013 para Escola Superior de Polícia Civil – ESPC, também com sede na capital paranaense, onde permaneço até a presente data.

 

Formado pelo Núcleo de Preparação de Oficiais da Reserva do Exército Brasileiro – NPOR, do 59° Batalhão de Infantaria Motorizada – Maceió – AL, onde tive um contato mais aprofundado com armamento e tiro, sendo convidado assim a fazer parte da Seção de Armamento e Tiro da ESPC, primeiramente auxiliando na recarga de cartuchos e posteriormente trabalhando com a manutenção dos armamentos e também nas instruções da disciplina Uso Legal da Arma de Fogo.

 

Na sua visão quais as principais qualidades do instrutor de armamento e tiro?

 

O instrutor de armamento e tiro deve estar despido de qualquer vaidade e egocentrismo. Seu foco tão somente deverá ser o aprendizado do aluno, esforçando-se para que a transmissão do seu conhecimento seja da forma mais clara possível. Deverá buscar identificar a dificuldade que cada aluno apresenta, e de forma bem peculiar sanar o problema. Com uma metodologia dinâmica e persuasiva estimular os debates, as opiniões e a participação de todos em sua instrução.

 

Mesmo diante de uma maior dificuldade no manejo da arma, apresentada por alguns alunos, nunca desestimulá-los, tentando extrair o melhor de cada um e demonstrar o melhor caminho para superação daquela dificuldade apresentada.

 

Diante de um cenário onde o modus operandi do crime está sempre sofrendo mudanças, onde as técnicas das operações policiais também sofrem modificações e com o mercado armamentista oferecendo cada vez mais acessórios e mais modelos de arma de fogo, cabe ao instrutor de armamento e tiro buscar compactar toda essa gama de informações e repassar para o aluno aquilo que lhe será útil em sua rotina de trabalho. Tendo sempre a “mente aberta” para novos conceitos e ideias.

 

O fato de não precisar mais fazer recarga interferiu na qualidade do seu trabalho?

 

Certamente a atividade de recarga de cartucho tomava um tempo considerável de todos os instrutores que faziam parte da Seção de Armamento e Tiro, pois além da recarga propriamente dita, separavámos os estojos utilizados, em seguida eram lavados, colocados para secar, era feita uma seleção manual para separar os que estivessem com algum defeito e só depois iam para nossa máquina de recarga. Máquina essa que é importada e seu manuseio requer destreza e habilidade. Na época nossa produção era de 1000 (mil) cartuchos feitos em 1h00 por cada instrutor. Ressaltando que não era aconselhado a realização de mais cartuchos para evitar as lesões por esforços repetitivos.

 

Diante da aquisição de munição treina, tive mais tempo para buscar conhecimento em outros cursos da área, voltando o foco efetivamente para instrução de Armamento e Tiro.

 

Como é trabalhar com munição treina?

 

A munição treina, como o próprio fabricante informa, é uma munição que não libera gases ou resíduos tóxicos durante o disparo, pois possui projétil totalmente encapsulado e a mistura iniciadora livre de metais pesados e pólvora química sem fumaça. Ressalto que todas as suas características físicas e de desempenho se aproximam da munição real utilizada pelos policiais. Ex: velocidade atingida pelo projétil na saída do cano, Treina – 302m/s; Expansiva ponta oca copper bullet – 390m/s. Isso significa que durante o treino, o aluno chegará bem perto da realidade que ele vai encontrar num disparo real (recuo da arma, ruído etc).

 

Concluindo, a utilização da munição treina, além de melhorar a logística da seção e a qualidade do trabalho desenvolvido, é determinante na preservação da saúde de instrutores e alunos.

 

Antes de cada curso o corpo de instrutores faz reuniões de planejamento para traçar estratégias e metodologias. Como isso ajuda no trabalho dentro do estande?

 

As reuniões são de fundamental importância, é nelas que discutimos e traçamos o roteiro das aulas e demais instruções, bem como otimizamos os comportamentos de outros cursos, adequamos a metodologia específica para cada turma e tentamos sempre melhorar de maneira geral os ensinamentos. Em uma dessas reuniões, por exemplo, surgiu a ideia de incluir de maneira mais efetiva a parte de armaria (desmontagem, montagem, manutenção, identificação as peças e funcionamento das armas utilizadas pela Polícia Civil do Paraná).

 

O resultado de todo esse esforço são aulas ministradas de forma mais eficaz, evitando desperdício de tempo, material e recursos. Tentando passar para o aluno a maior quantidade de informação da forma mais qualificada e profissional.

 

Este ano você fez o curso de Instrutor de Armamento e Tiro e também o de Armeiro. Conte como foram essas experiências.

 

Falando individualmente de cada curso, o de Instrutor de Armamento e Tiro, realizado pela empresa Propoint, com sede no estado de São Paulo e composta por uma gama de instrutores experientes, aprendi várias técnicas de metodologia de ensino da disciplina, a melhor maneira de abordar os alunos, como também os temas relacionados a matéria. Como os instrutores possuíam vários tipos de formação (policiais, atiradores de precisão, instrutores de atendimento pré hospitalar etc) pude extrair de cada um uma série de conhecimentos variados. Também tive oportunidade de conhecer, manusear e efetuar disparos com armas que normalmente não fazem parte da rotina do policial civil, como a pistola Desert Eagle .44 magnum e o fuzil de precisão calibre 762mm.

 

Voltando o foco para o curso de Mecânico de Armamento Leve (Armeiro), numa parceria da Escola Superior de Polícia Civil do Paraná com o Quartel General do Exército Brasileiro – Comando da 5ª Região Militar. Posso dizer que foi uma experiência ímpar, pois o corpo discente do curso era composto por Policiais Civis do TIGRE, COPE, ESPC, DEAM e 6ª Sub Divisão Policial de Foz do Iguaçu, estavam presentes também Guardas Municipais de Matinhos, Apucarana, Curitiba, Fazenda Rio Grande, Irati, Araucária e até de Uruguaiana – RS, a polícia rodoviária federal e a receita federal também fizeram parte desse corpo de alunos. Enfatizo que a experiência de cada um somou bastante no decorrer do curso e fez com que a turma tivesse um desempenho bem melhor. O corpo docente também foi composto de experientes professores que nos passaram todas as informações inerentes a disciplina da maioria das armas que são utilizadas pela polícia civil, como também o fuzil M4 colt 556mm, a pistola beretta 9mm, a metralhadora de apoio geral – MAG 762mm, a metralhadora .50, o fuzil automático leve – FAL 762mm.

 

Concluo dizendo que os conhecimentos adquiridos nesses cursos serviram para melhorar consideravelmente o nível técnico das instruções na ESPC.

 

A nova sala de aula do estande melhorou a logística das aulas teóricas?

 

Sim, agora com a sala do estande provida de recursos audiovisuais, conseguimos aproximar o aluno do ambiente de tiro. Eximindo também o tempo de deslocamento que anteriormente era realizado até chegar ao estande.

 

Fale um pouco da utilização da calibre 12 no dia a dia do policial civil.

 

A espingarda calibre 12 CBC pump, existente em várias unidades da polícia (civil e militar) bem como de algumas Guardas Municipais, é sem sombra de dúvida uma excelente arma. Dispõe de uma gama considerável de cartuchos letais e também menos que letais. Cartuchos com carga lacrimogênea, elastômeros para controle de distúrbio civil etc. É uma arma que por diversas vezes recebeu os holofotes dos cinemas, das tvs e da mídia de maneira em geral. Por isso causa admiração, respeito e até receio em seu manuseio. Por esta razão, o simples fato portar essa arma, já causa um forte impacto psicológico nas pessoas que a observam.

 

Nas aulas realizadas na ESPC o objetivo é desmitificar o uso da espingarda calibre 12, fazendo com que o policial a opere com segurança, entendendo seu mecanismo de ação, seu funcionamento, identificando suas peças, realizando a desmontagem, montagem e a manutenção.

 

Que tipo de panes são mais comuns em pistolas ?

 

As panes, seca ou nega, “chaminé” e o duplo carregamento ou dupla alimentação são as principais. Com a chegada dos cartuchos treina esses problemas diminuiram drasticamente, todavia a pane de “chaminé” ainda ocorre, mas não mais pelo fato de problemas no cartucho e na arma e sim pela má empunhadura realizada pelo operador.

 

Ressaltamos que as panes supracitadas podem ocorrem por problemas mecânicos na arma, peças danificadas, cartuchos defeituosos e até manuseio errado da pistola. Fato este que é minimizado com treinamento do operador, manutenção frequente da arma, acondicionamento em local adequado, utilização de cartuchos de qualidade e procedência.

 

Se tivesse que dar um conselho para seus colegas policiais civis em relação à utilização da arma que portam, qual seria?

 

Que o policial conheça bem sua arma, seu funcionamento, seu mecanismo de ação. Que saiba desmontar (pelo menos em primeiro escalão, desmontagem esta que é padronizada como sendo a desmontagem em que o operador não utiliza nenhum tipo de ferramenta), montar, identificar as principais peças, reconhecendo quando estiverem danificadas. Realizar manutenção de seu armamento periodicamente. Trocar os cartuchos no prazo determinado pelo fabricante. Treinar bastante com sua arma. Evitando assim que ocorram problemas no momento em que realmente for precisar usá-la.

 

Da Redação

 

DELEGADOS.com.br
Revista da Defesa Social & Portal Nacional dos Delegados

 

 

 

 

você pode gostar