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Crônica da Suprema Chicana Jurídica

por Editoria Delegados

Por Eduardo Luiz Santos Cabette


Autor: Eduardo Luiz Santos Cabette, Delegado de Polícia aposentado, Mestre em Direito Social, Pós – graduado em Direito Penal e Criminologia, Professor de Direito Penal, Processo Penal, Criminologia, Medicina Legal e Legislação Penal e Processual Penal Especial na graduação e na pós – graduação do Unisal e Membro do Grupo de Pesquisa de Ética e Direitos Fundamentais do Programa de Mestrado do Unisal.

Em um país imaginário havia um político desonesto que foi investigado e condenado em todas as instâncias quanto ao aspecto material de seus crimes, sendo reconhecido pela Justiça indiscutivelmente como corrupto.

Tal político contava com uma banca de advogados pagos a peso de ouro, os quais foram intensamente combativos durante todo o tempo.

Percebendo os defensores que quanto aos fatos não havia muito que fazer, procuraram encontrar nulidades formais no processo, dentre elas a alegação de incompetência do juízo da condenação originária.

Mas, também tais alegações defensivas foram rechaçadas sistematicamente nas várias instâncias, inclusive na Suprema Corte imaginaria desse país putativo.

Tão bem remunerados, os advogados do político não desistiam nunca e chegavam com as mesmas alegações formais até a tal Corte Suprema reiteradamente, várias vezes por anos a fio, sem contar os demais juízos e tribunais.

As nulidades processuais eram sempre afastadas, inclusive aquela referida à suposta incompetência do juízo originário do processo.

E agora vem um acontecimento imaginário, totalmente fictício, que somente poderia ser concebido nesse país e nesse Supremo Tribunal putativos.

Consigne-se, para que dúvida alguma exista, que tudo que aqui se narra é não somente fantástico como absolutamente fantasioso, não havendo, que se saiba, qualquer semelhança com fatos reais e, se houver, será pura obra do acaso e de uma inusitada e inadvertida coincidência.

Pois bem, um Ministro hipotético daquela fantástica e ficcional Corte Suprema, o qual julgou por mais de uma dezena de vezes os recursos e ações de impugnação dos defensores do político, sempre afirmando a competência do juízo originário, repentinamente, após anos e anos, acabou mudando seu parecer, reconhecendo a incompetência e anulando todos os processos, soltando o criminoso, mantendo incólumes seus direitos políticos e até mesmo possibilitando a devolução de seus bens bloqueados porque reconhecidamente produtos de corrupção.

E no país fictício um povo ficcional ficou sem entender por que isso foi feito somente depois de anos. Por que não foi, desde logo, reconhecida a tal incompetência e seguiu o processo para onde deveria ter andamento regular? Por quê?

Foi então que, após alguma reflexão, uns juristas imaginários do país umbrático lembraram que o vício da desonestidade pode bem andar ao lado da virtude da paciência e do dom de saber que para tudo na vida há uma hora e um tempo.

Se os combativos advogados talvez tenham se precipitado em seus pedidos, acabaram acertando no final em sua insistência. Quando a hora e o tempo chegou o Ministro fictício da Corte Suprema fantasiosa agiu cronometricamente. Às vezes é preciso que um homem mais experiente lembre os mais jovens e afoitos que Goethe já ensinava que “é urgente ter paciência”.

Quando só então ele reconheceu a incompetência, já de nada adiantava a remessa dos processos para seguimento no suposto juízo competente, já que a prescrição iria acabar com qualquer chance de punição do criminoso. Acaso reconhecesse a incompetência antes ainda haveria tempo hábil para que os processos chegassem aos seus termos sem impunidade. E mais, quase ninguém saberia distinguir, salvo técnicos na área jurídica, a extinção da punibilidade por mera manobra formal e prescrição, de uma verdadeira absolvição de um inocente. Essa narrativa da inocência, totalmente contrafática, absolutamente contrastante com todas as decisões judiciais de mérito, simplesmente se sobreporia politicamente, dando contornos de martírio, quando não hagiográficos a uma figura torpe.

Mas tudo isso é apenas uma crônica que é fruto da criatividade e da fértil imaginação de algum escritor, talvez até meio delirante. Afinal, algo tão absurdo nunca poderia acontecer na realidade, haveria revolta, ninguém aceitaria tudo isso passivamente, o povo e as instituições sérias reagiriam e a ordem seria restabelecida. Dizem que a vida é capaz de imitar a arte, mas é claro que não seria viável chegar a tanto realismo fantástico no seio da realidade concreta.

Ainda bem, do contrário estaríamos vivendo um pesadelo. É claro, se fôssemos habitantes daquele país imaginário, o que obviamente não somos, já que ele sequer existe. Ufa!!!!

Autor: Eduardo Luiz Santos Cabette, Delegado de Polícia aposentado, Mestre em Direito Social, Pós – graduado em Direito Penal e Criminologia, Professor de Direito Penal, Processo Penal, Criminologia, Medicina Legal e Legislação Penal e Processual Penal Especial na graduação e na pós – graduação do Unisal e Membro do Grupo de Pesquisa de Ética e Direitos Fundamentais do Programa de Mestrado do Unisal.

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