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‘Boletim de corrência policial para a preservação de Direitos’

por MARCELO FERNANDES DOS SANTOS

JURÍDICO
‘Boletim de corrência policial para a preservação de Direitos’

JURÍDICO

Por Antônio Benone

Intróito, legislação especifica, doutrina, conclusão, notas.

Esta semana a Corregedora Geral da Polícia Civil realizou uma reunião com os Delegados da Decrif/Delegacia de Crimes Funcionais, com a Sub-Corregedora do Interior, e o Diretor da Divisão de Assuntos Internos da CORREGEPOL onde foi realizada uma avaliação dos trabalhos realizados, reclamações, idéias e possíveis melhoramentos.

Durante a reunião foram suscitadas várias questões que posteriormente comentarei, todavia uma merece de nossa parte uma imediata resposta que aproveito este espaço para mostrar meu ponto de vista, respeitando a posição dos colegas Delegados.

Durante as minhas rondas diárias nas Seccionais, Unidades e Divisões policiais, vejo pessoas esperando horas para realizarem um B.O. de preservação de direitos, até ai tudo bem, mas o parece ser de pouquíssima relevância se revela uma questão intrigante, que peço vênia para comentar.

Situação bastante comum o cidadão comparece na Delegacia e convicto de seu “direito” e solicita o registro de um boletim de ocorrência de “preservação de direitos”, noticiando fato penalmente atípico, isso facilmente perceptível pelo policial responsável pelo atendimento, mesmo que ele não tenha formação em Direito. Entretanto no meu entender o registro desses fatos em delegacias de polícia, longe de demonstrar desconhecimento da lei por parte dos servidores que o fazem, evidenciam sua disposição em atender a população, suprindo a carência de outros órgãos estatais e, não raro, proporcionar – desnecessariamente – um ponto de partida para que advogados ingressem com ações judiciais.

Vejamos alguns os casos:

a)    Acidente fortuito de trânsito, sem qualquer dolo, havendo apenas danos materiais;
b)     Esposa que pretende sair de casa, em preparação a uma posterior separação judicial, pede o tal B.O. para que não seja acusada, futuramente, de “abandono do lar”
c)     Briga entre casais separados para a visitação do filho menor;
d)     Estudante que não viu respeitado o direito ao bandejão servido no Vadião da UFPa.;
e)     Pessoa que esperou por longo tempo em fila do Banpará.

Entendo que o registro de fatos penalmente atípicos foge completamente da esfera de atribuições da Polícia Civil.

Mas afinal para que serve a Polícia Civil do Pará, qual a sua função precípua?

A Polícia Civil, instituição permanente, auxiliar da Justiça Criminal e necessária à defesa do Estado e do povo, exerce, com exclusividade, as funções de Polícia Judiciária do Estado, ou seja, investigatória policial, e a apuração das infrações penais, exceto as militares.

De outra banda temos o Regimento Interno da Policia Civil que regulamenta a estrutura organizacional e o funcionamento da Polícia Civil do Estado do Pará, define as competências das unidades administrativas e as atribuições dos cargos, as responsabilidades dos dirigentes e servidores e detalha o quadro de cargos em comissão e funções gratificadas, de acordo com a Lei Complementar nº 022, de 15 de março de 1994:

(…)

DAS FUNÇÕES INSTITUCIONAIS

Art. 4º São funções institucionais da Polícia Civil do Estado do Pará, o exercício das atribuições de polícia judiciária e a apuração das infrações penais, excetuando-se as militares, além das seguintes atribuições:

I – praticar todos os atos necessários à apuração das infrações penais e elaboração do Inquérito Policial;

(…)

IV – colaborar com a Justiça Criminal, providenciando o cumprimento dos mandados de prisão expedidos pelas autoridades judiciárias, fornecendo as informações necessárias à instrução e julgamento dos processos, e realizando as diligências fundamentadamente requisitadas pelo Poder Judiciário e membros do Ministério Público;

(…)

VII – exercer a fiscalização de jogos e diversões públicas, expedindo o competente alvará, na conformidade da lei, mediante o pagamento das taxas decorrentes do poder de polícia. 

Atualmente, em virtude de uma condição histórica, as delegacias encontram-se com pouquíssimos servidores, computadores, espaço físico, por isso entendo que os esforços e recursos – humanos e materiais – da Polícia Civil deveriam ser canalizados no sentido de investigar delitos, descobrindo sua autoria e quando for o caso sua materialidade, para então auxiliar a Justiça Criminal.

O boletim de ocorrência, por si só, não preserva o cidadão de nada. Mesmo considerando que, com o seu registro, o delegado de polícia toma conhecimento do fato, isso em nada favorece o interessado, exceto se a situação configurar infração penal. É bem possível que o fato noticiado pelo interessado e que motivaria, a seu pedido, a lavratura do B.O. de preservação de direitos, esconda um fato penalmente típico.

Conclusões

Deve-se buscar todas as circunstâncias do episódio narrado para apurar eventual indício da ocorrência de prática delituosa ou contravencional. Em se verificando tal situação, a natureza do boletim de ocorrência será outra, dispensando-se o título de “preservação de direitos”. Seria o caso, p. ex., de pessoa que comparece em unidade policial informando que descobriu ser sócio de uma sociedade empresária, sem que jamais tivesse feito qualquer tratativa nesse sentido. É possível antever, na espécie, que tal indivíduo foi vítima de um golpe. Há indícios de prática criminosa que exige uma investigação; não se trata meramente de uma “preservação de direitos”.

Entendemos que a Corregedoria como responsável pelo controle interno da atividade policial deveria ficar atenta ao costume de certos profissionais ou repartições pedirem ou exigirem que o civilmente lesado providencie o registro do tal B.O. de preservação de direitos beira o comodismo ou a falta de conhecimento para redigir uma notificação, uma representação ou uma simples declaração. Sem contar que o submete a uma via crucis desnecessária!

Não se deve confundir o direito de petição consagrado no rol dos direitos fundamentais da Constituição Federal com o registro desse tipo de boletim de ocorrência. Os direitos porventura lesados deverão ser reclamados nas esferas competentes.

Entendo que a Polícia Judiciária demonstra o grau de comprometimento com os direitos da população e a sua intenção de bem servi-la. entretanto, a Polícia tem que se comprometer com a função para a qual foi criada. Investigando, elucidando e reprimindo crimes e prendendo seus autores: é dessa forma que ela se engrandece e bem serve a sociedade. Até para se evitar que inquéritos policiais fiquem acumulados nas delegacias, exigindo por parte do judiciário que a Corregepol proceda contra certos Delegados, que coitados por excesso de trabalho não cumprem sua função institucional.

Sobre o autor

ANTONIO AILTON BENONE SABBÁ
Delegado de Polícia Civil |Decrif/Corregedoria

DELEGADOS.com.br
Revista da Defesa Social
Portal Nacional dos Delegados

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