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Aprovação da terceirização atingirá atividade-fim do serviço público?

por Editoria Delegados

Juristas afirmam que decisão é inconstitucional

 

Colocado em pauta para votação e aprovado na noite da última quarta-feira, dia 22, na Câmara dos Deputados, em Brasília, o Projeto de Lei 4.302/98, que permite a terceirização irrestrita no país, inclusive no serviço público, é inconstitucional e enfrentará questionamentos na Justiça. É o que avaliam mais dois juristas ouvidos pela FOLHA DIRIGIDA. Como já foi aprovado também pelo Senado Federal, o PL 4.302/98 seguirá para a sanção presidencial.

Hoje não há legislação específica para regular a terceirização. A prática só é possível em atividades secundárias das empresas, também chamadas de atividades-meio, ou seja, não são terceirizados trabalhadores das atividades-fim – tais como médicos e hospitais e postos de saúde, ou professores em escolas, por exemplo. A votação do texto do PL, original de 1998, teve o seguinte placar: 231 votos a favor, 188 contra e 8 abstenções.

O Brasil possui hoje cerca de 13 milhões de trabalhadores terceirizados, e o temor de especialistas é de que o número de trabalhadores nesta condição aumente ainda mais no Brasil, em desrespeito à realização de novos concursos ou mesmo à nomeação de aprovados em certames já realizados. Além de autorizar o trabalho terceirizado de forma irrestrita para qualquer tipo de atividade, o texto aprovado na noite desta quarta amplia de três para até nove meses o prazo de validade dos contratos de trabalhos temporários.

Na avaliação do presidente da Associação Nacional dos Procuradores do Trabalho (ANPT), Ângelo Costa, ao não prever qualquer tipo de restrição à terceirização no setor público, a lei a ser gerada com a aprovação do projeto irá possibilitar a burla ao concurso público. “Vai trazer para a administração pública pessoas que, geralmente, não têm propriamente um compromisso com o cumprimento daquela função e que, muitas das vezes, são pessoas indicadas, apadrinhadas por algum político”, criticou.

“E os trabalhadores que entram ali, digamos, pela janela, sem ser pelo concurso público, não têm o compromisso com prestação de serviço à sociedade. O compromisso deles é, geralmente, com quem os colocou lá”, apontou, acrescentando que não é incomum que o Ministério Público do Trabalho (MPT) encontre situações desse tipo, sobretudo em prefeituras de cidades do interior.

Associação apresentará questionamento

Costa criticou a possibilidade de terceirização inclusive de atividades essenciais. “Por mais absurdo que seja, não há qualquer vedação. Na realidade, eu até acho difícil, na prática, se terceirizar uma atividade como a magistratura, o ministério público, a polícia, mas em nenhum momento tem qualquer dispositivo que vede essa possibilidade de terceirização.”

O procurador do trabalho afirmou que a própria ANPT irá questionar a lei na Justiça, bem como irá provocar a Procuradoria-Geral da República para que proponha uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) no Supremo Tribunal Federal (STF), que é a forma de se avaliar se a lei está em conformidade com a Constituição Federal. Costa afirmou ainda que a associação é contrária à proposta, em função da precarização das relações de trabalho gerada pela terceirização, seja no setor público seja no setor privado.

Para juiz federal, norma não ‘vingará’

 

O juiz federal William Douglas também afirmou que o texto se torna inconstitucional ao permitir a terceirização de funções inerentes a concursados na forma que prevê a Constituição. “Não é exagero afirmar que o texto do PL é aberrante à ordem constitucional vigente”, disse ele.

Também para ele, a aprovação da proposta com essa possibilidade viola o princípio do acesso democrático ao serviço público. “Com certeza poderá permitir a contratação indiscriminada de terceirizados, aí incluindo parentes, afins, companheiros e esposas.”

Com relação à possibilidade de terceirização das atividades-fim no serviço público, o magistrado se mostrou convicto de que a medida não terá efetividade. “O Congresso, ao aprovar essa ideia, irá se submeter a um novo constrangimento, pois a terceirização do serviço público, mesmo que aprovada, não será aplicada, pois com certeza será objeto de ação direta de inconstitucionalidade”, disse ele.

William Douglas afirmou que há precedente do STF que permite dizer que a ação de inconstitucionalidade será bem sucedida. Ainda segundo ele, Superior Tribunal de Justiça (STJ) e Tribunal Superior do Trabalho (TST) também já manifestaram entendimento contrário à terceirização indiscriminada no serviço público, assim como o Tribunal da Contas da União (TCU).

Segundo ele, a questão poderá ainda ser tratada por meio de mandado de segurança pelo concursando, para que tenha sua nomeação realizada por burla ao concurso, e por meio de ação civil pública contra a contratação de empresa terceirizada pelo poder público.

De acordo com posicionamento da equipe do deputado Laércio Oliveira, relator do PL 4.302/98, no serviço público, a terceirização seria limitada pela Constituição, assim como por outros dispositivos legais.

 

Folha Dirigida

 

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