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‘Tive que correr como se fosse bandido’, diz sargento preso

por MARCELO FERNANDES DOS SANTOS

RIO DE JANEIRO
‘Tive que correr como se fosse bandido’, diz sargento preso

    RIO DE JANEIRO

    {loadposition adsensenoticia}Pelo menos 30 bombeiros que estão sendo ouvidos em uma das salas da Corregedoria da da Polícia Militar, em São Gonçalo, na Região Metropolitana do Rio, continuam a protestar contra a maneira como estão sendo tratados desde que foram presos na manhã deste sábado (4).

    “Passei minha vida toda salvando vidas e agora estou me sentindo como se fosse um bandido. Estamos há mais de dez horas sem comer”, disse o sargento Monteiro ao G1, pelas grades da janela da sala. “Minha mulher está grávida, aí fora, nervosa, preocupada comigo. É meu primeiro filho e ela está numa gravidez de risco”, afirmou.

    “Encontramos cápsulas de fuzil [no Quartel Central dos Bombeiros, após a invasão do Bope]. Bombeiro não usa esse tipo de arma”, acrescentou o bombeiro preso, mostrando uma cápsula de fuzil.

    Outro que protestou foi o sargento Félix. “Ficamos encurralados pelos ataques do Bope e do Batalhão de Choque. Tive que correr como se fosse um bandido. Muitas crianças chegaram a ficar sufocadas”, disse, também por entre as grades do prédio da Corregedoria da PM.

    Mais cedo, o corregedor da Polícia Militar, coronel Ronaldo Menezes, negou maus-tratos aos manifestantes presos, afirmando que os bombeiros estão sendo atendidos com tratamento digno e não estão mais em ônibus e, sim, em salas.

    Transferência até domingo

    Os 439 bombeiros presos no Rio de Janeiro serão transferidos até a manhã de domingo (5) para uma unidade-escola do Corpo de Bombeiros do estado em Jurujuba, Niterói, segundo o promotor militar Leonardo Cunha, que acompanha o caso.

    “Em uma reunião com a Corregedoria dos Bombeiros e da Polícia Militar nesta tarde houve consenso que eles (os presos) serão transferidos para Jurujuba. Alguns ficarão na Corregedoria, mas ainda não sei quantos. Ainda estamos lavrando os autos de prisão em flagrante de todos eles”, disse o promotor ao G1.

    Por volta das 18h30 deste sábado (4), três carros do Batalhão de Operações Policiais Especiais (Bope) chegaram à Corregedoria da Polícia Militar, em São Gonçalo, na região metropolitana, para onde os manifestantes foram levados. A tropa do Bope fará a escolta dos bombeiros no deslocamento aos quartéis onde eles ficarão detidos provisoriamente.

    Presos responderão por três crimes

    Conforme o promotor, todos os 439 bombeiros presos durante a madrugada após a invasão do Quartel Central, no Centro do Rio, irão responder por três crimes: motim, dano e impedimento ao socorro.  Pelo Código Penal Militar, diz o promotor, a pena prevista para o crime de motim é de 4 a 8 anos de prisão. Pelos danos causados no Quartel General durante o protesto, os bombeiros poderão ser condenados ainda a penas de 1 a 6 anos pelo crime de dano. Pelo crime de impedimento ao socorro é prevista a pena de mais 3 a 6 anos de prisão.

    “Todos os presos dentro do quartel também estão sendo enquadrados no crime de impedimento ao socorro porque impediram que viaturas e homens deixassem a unidade para cumprir missões e atender ocorrências”, diz o promotor. Líderes do protesto poderão ter a pena aumentada por incitação ao motim, segundo ele.

    Os autos de flagrante dos bombeiros presos serão remetidos à Justiça Militar em até 20 dias. Segundo o promotor, um Inquérito Policial Militar (IPM) foi aberto para investigar o caso e “muito provavelmente” o Ministério Público irá oferecer denúncia contra os presos.

    “Até o momento, não recebemos nenhum pedido de liberdade deles. O MP não tem nada contra manifestação e reivindicação por melhores condições de trabalho, mas devem ser feitas de forma pacífica”, diz o promotor.

    Entre os presos há oficiais e praças. Ainda não foi divulgado quais unidades eles integram, mas “são de todo o estado”, segundo  Cunha.

    Com o pulso esquerdo fraturado e uma luxação no joelho esquerdo, em consequência da invasão do quartel dos bombeiros, o comandante acompanhou o trabalho de qualificação dos bombeiros presos na Corregedoria da PM. À paisana, ele contou como tudo aconteceu.

    “Fui empurrado por um dos líderes da invasão. Como era a autoridade de patente mais alta no quartel naquele momento, fui dar voz de prisão a ele. Ele me empurrou, eu tentei agarrá-lo. Ele se desvencilhou de mim, enquanto eu torcia o joelho. Logo depois, ele me empurrou de novo numa escada e, ao cair, quebrei o pulso esquerdo”, contou o comandante.

    ‘Meu filho não é bandido’, diz mãe de bombeiro preso

    Famílias dos bombeiros presos aguardavam durante a tarde uma solução para o caso na porta da Corregedoria da PM. Cerca de 25 pessoas ficam da grade do batalhão tentando ver a movimentação dos filhos e maridos mantidos dentro dos ônibus no pátio da unidade. Um deles conseguiu sair e tranquilizar a mãe, Marilu Fonseca, que ficou muito emocionada.

    “Meu filho não é bandido. Tem um monte de gente que faz greve e não é preso. Ele é técnico em raio-x, trabalha na área médica. Ele estava no plantão e depois foi lá para o quartel onde estavam os outros bombeiros. Ele não pode ser tratado como bandido”, disse a mulher, bastante emocionada.

    Mais cedo, em entrevista coletiva, o governador do Rio, Sérgio Cabral, disse que os bombeiros que invadiram o quartel Central do Corpo de Bombeiros são “vândalos, irresponsáveis, que não irão de forma alguma prejudicar a imagem de uma instituição tão respeitada e querida pelo povo do Rio de Janeiro.”

    Troca de comando nos bombeiros

    Após uma manhã de reuniões, o governador anunciou um  novo comandante para o Corpo de Bombeiros, o coronel Sérgio Simões assume a corporação no lugar do coronel Pedro Machado. Simões era comandante da Defesa Civil do município. O motivo da substituição, segundo Cabral, foi descontrole hierárquico.

    “Foram eventos completamente inaceitáveis do ponto de vista do estado de direito democrático, do ponto de vista do que representa o respeito as instituições, sem falar na própria hierarquia nessa instituição tão querida pelo povo do Rio que é o Corpo de Bombeiros”, continuou Cabral.

    “Não há negociação com vândalos, eu não negocio com vândalos, eles responderão administrativa e criminalmente” pela invasão do quartel Central, garantiu o governador.

    Cabral afirmou que há planos de aumento de salários já anunciados para os bombeiros. “Há um programa de incremento salarial aprovado na Alerj, de R$ 2 mil, esse grupo ao final do ano já está atendido. Se não é ideal é o melhor da historia da corporação.”

    Rotina normal

    O Comando Geral do Corpo de Bombeiros garantiu no início da manhã que a rotina de atendimento à população do Rio está mantida, apesar das prisões dos bombeiros manifestantes.

    Os substitutos dos 439 bombeiros detidos já assumiram seus postos segundo nota da divulgada, e postos de salvamentos dos Grupamentos Marítimos, assim como quartéis, unidades de atendimento de urgências e emergências (SAMU/GSE) e serviços de socorro (combate a incêndios, salvamentos e desabamentos, etc) estão operando normalmente.

    Invasão

    Após uma noite inteira de negociações para que os cerca de dois mil bombeiros deixassem o quartel, a tropa de Choque da Polícia Militar e também policiais do Bope invadiram o quartel do Centro.

    Para entrar no complexo, por volta de 6h10, os policiais usaram bombas de efeito moral e bombás de gás lacrimogêneo. Pelo menos duas crianças sofreram intoxicação devido ao gás e dois adultos tiveram ferimentos leves na cabeça, por conta das bombas de efeito moral que foram lançadas pelo Bope.

    Desde 19h30 de sexta (3), bombeiros ocuparam o pátio e as dependências do complexo. Mulheres e até crianças se uniram a oficiais numa passeata que começou em frente à Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro (Alerj) e que passou pelas principais avenidas do Centro, até chegar ao quartel.

    Reivindicações

    O Cabo Benevenuto Daciolo, porta-voz do movimento, explicou que entre as reivindicações estão piso salarial líquido no valor de R$ 2 mil e vale-transporte.

    “Nós temos o pior salário da categoria no país, que é de R$ 950. Estamos há dois meses tentando negociar com o governo, mas até agora não obtivemos resposta. Nosso movimento é de paz e estamos em busca da dignidade. Não vamos recuar até que haja uma solução. Queremos um acordo, queremos que o governador se pronuncie”, disse o porta-voz.

    G1

    DELEGADOS.com.br
    Revista da Defesa Social
    Portal Nacional dos Delegados

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