Recentemente, a Associação Brasileira de Defesa do Consumidor, conhecida como Proteste, relatou que algumas marcas de pães de forma contêm concentrações de álcool acima do limite aceitável para consumo.
A notícia sobre a presença de álcool nos pães de forma se espalhou pela mídia, destacando o risco de motoristas excederem o limite legal de álcool que poderia configurar um crime de trânsito. Nesse contexto, é sabido que a presença de álcool no pão resulta da fermentação natural, mas é certo que alguns fabricantes buscam prolongar a vida útil do produto mediante o uso de determinadas substâncias que, embora legalmente permitidas, precisam ser monitoradas para garantir a segurança dos consumidores.
Veja abaixo um teste realizado por policiais sobre o resultado de etilômetro após ingestão de pão de forma:
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No que tange à situação descrita, o estudo da Proteste enfatizou que “o álcool não pode ser considerado uma substância inerte; pelo contrário, sua utilização em preparações farmacêuticas está associada a questões de segurança, que envolvem o risco de toxicidade aguda e crônica. Pesquisas na literatura apontam para a necessidade de investigar a exposição dos consumidores, especialmente crianças, ao etanol através de produtos alimentares que não estejam rotulados como contendo álcool e em formulações farmacêuticas”.
Disparidade Informativa
Apesar da questão ainda estar sob análise da Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária), constatado ou não o alto teor alcoólico nos pães de forma apontados pela Proteste, o fato é que a notícia pegou a população de surpresa, já que grande parte dos consumidores desconhecia a presença de álcool no produto mencionado. Essa conclusão é bastante coerente, dado a falta de informação no rótulo ou na embalagem dos pães de forma.
Nesse sentido, é importante destacar que o direito à informação, insculpido no inciso III do artigo 6º do Código de Defesa do Consumidor, impõe ao fornecedor um dever de conduta com o objetivo de preservar e promover a boa-fé objetiva na relação contratual de consumo (artigo 4º, III). Em outras palavras, numa relação de consumo, o fornecedor tem a obrigação de informar adequadamente o consumidor, prezando pela lealdade e transparência da informação.
Recomendação da Anvisa e o Artigo 18 do CDC
Ao abordar o vício do produto, o artigo 18 do CDC trata dos vícios de qualidade por inadequação, ou seja, aqueles que tornam o produto impróprio para o consumo. Nesse sentido, deve-se lembrar que o artigo 18 do CDC prevê a existência de vício quando houver disparidade informativa, ou seja, quando houver desconformidade entre “as indicações do recipiente, da embalagem, rotulagem ou da mensagem publicitária”.
Em uma análise inicial, parece que a presença de álcool no produto, além de precisar estar adequada à concentração permitida pelo órgão regulador, deveria ser destacada no rótulo ou na embalagem. Nesse sentido, é relevante lembrar que a Anvisa, em 2002, editou a RE nº1/02, complementando o disposto na Resolução RE n°543/01, mantendo a proibição da presença de etanol em todos os produtos fortificantes, estimulantes de apetite e crescimento, além de determinar que os produtos polivitamínicos destinados a crianças com idade inferior a 12 anos ou de uso pediátrico apresentassem uma concentração máxima de etanol não superior a 0,5% em suas formulações.
Para os adultos, foi permitida uma concentração de etanol não superior a 2,0%. Além disso, a referida norma também determinou que os produtos desse gênero deveriam apresentar em destaque no rótulo a seguinte expressão: “Produto de uso exclusivo em adultos. O uso em crianças representa risco à saúde”. Então, naquela oportunidade, a Anvisa já enfrentou, de certo modo, o assunto ora em debate, possuindo parâmetros de ajuste caso seja necessário.
Vulnerabilidade
Por qualquer ângulo que se observe o caso mencionado, havendo ou não excesso de álcool nos pães de forma, a informação sobre essa substância no rótulo ou na embalagem do produto parece estar mais alinhada com a segurança exigida pelo diploma consumerista.
Por fim, lembrando que o princípio da vulnerabilidade permeia toda a relação de consumo (artigo 4º, I do CDC), cabe considerar que o consumo do referido produto também é realizado por crianças e idosos, que possuem uma vulnerabilidade agravada, baseada na tutela constitucional que ambos possuem (artigos 227 e 230 da Constituição). Nesse sentido, é pertinente mencionar a consumidora gestante, que, nesta situação, parece também apresentar uma vulnerabilidade agravada, pois a exposição ao álcool pode afetar o desenvolvimento do feto (síndrome alcoólica fetal).
Questão Criminal
A pessoa que come pão de forma e, após o teste do bafômetro com resultado positivo para álcool poderá, a depender de cada caso concreto, ser autuada e até presa. O delegado de polícia decidirá casos dessa natureza.
O artigo 306 do Código de Trânsito Brasileiro estabelece que conduzir veículo automotor com a capacidade psicomotora alterada em razão da influência de álcool ou outra substância psicoativa que determine dependência é crime, sujeito a penas de detenção de seis meses a três anos, multa e suspensão ou proibição de se obter a permissão ou a habilitação para dirigir veículo automotor.
As condutas previstas no caput serão constatadas por: I – concentração igual ou superior a 6 decigramas de álcool por litro de sangue ou igual ou superior a 0,3 miligrama de álcool por litro de ar alveolar; ou II – sinais que indiquem, na forma disciplinada pelo Contran, alteração da capacidade psicomotora.
A verificação do disposto neste artigo poderá ser obtida mediante teste de alcoolemia ou toxicológico, exame clínico, perícia, vídeo, prova testemunhal ou outros meios de prova em direito admitidos, observado o direito à contraprova.
Teste do bafômetro: qual o limite de tolerância?
Conduzir embriagado é infração de trânsito e penal. Existe um questionamento se o bafômetro tem alguma tolerância para a presença de álcool no corpo. O bafômetro é o aparelho que mede a quantidade de álcool no organismo do condutor. E aí, ao se deparar com alguma blitz da Lei Seca, surge a dúvida: há algum limite de tolerância no teste do bafômetro?
A resposta é: não, não há tolerância para o teste. O Brasil adota uma política de tolerância zero em relação ao crime de conduzir sob efeito de álcool. Isso significa que não se deve dirigir após consumir qualquer quantidade de bebida alcoólica.
Vale ressaltar que, como instrumento de teste, o bafômetro pode apresentar falhas, justificando a adoção de uma margem de erro, diferente de um limite de tolerância. O Conselho Nacional de Trânsito (Contran), através da Resolução nº 432/2013, estabelece uma margem de erro de 0,04 mg/L de álcool ao ser submetido ao teste em uma blitz, por exemplo.
Para o exame de sangue, qualquer resultado positivo para presença de álcool na corrente sanguínea é passível de autuação ao condutor. Nesse cenário, a partir de 0,05 mg/L de álcool detectado através do aparelho, considera-se o ato como “direção sob influência de álcool ou substância psicoativa”, conforme o Artigo 165 do Código de Trânsito Brasileiro (CTB).
A infração é considerada gravíssima, e a legislação estabelece multa no valor de R$ 2.934,70, pois o Artigo 165 prevê um fator multiplicador de 10 vezes para infrações gravíssimas. Esse fator é estipulado de acordo com o risco gerado pelo condutor ao violar a lei, e no caso de direção após ingestão de bebida alcoólica, a multa é multiplicada em 10 vezes.
Além do impacto financeiro, o motorista flagrado dirigindo embriagado terá sua Carteira Nacional de Habilitação (CNH) recolhida por 12 meses. Em caso de reincidência, ou seja, cometendo a mesma infração durante a suspensão da habilitação, o documento será então cassado por 24 meses, e a multa será cobrada em valor dobrado, equivalente a R$ 5.869,40.
O condutor que for pego no teste do bafômetro pela segunda vez, com a CNH suspensa, terá ainda que arcar com os custos de outra multa, a de conduzir veículo com CNH suspensa. Outra infração gravíssima, com fator multiplicador por três, resultando em uma punição de R$ 880,41.
É importante mencionar que, àqueles que se negam a se submeter ao teste do bafômetro ou coleta de amostra de sangue para análise, a penalização é a mesma aplicada aos condutores pegos no ato da infração.
Quando dirigir embriagado é considerado crime?
De acordo com o Artigo 306 do CTB, o condutor deve responder criminalmente caso o resultado do teste seja positivo com resultado igual ou superior a 0,34 mg/L de álcool no organismo. O crime de trânsito é enquadrado por “capacidade psicomotora alterada em razão da influência de álcool ou de outra substância psicoativa que determine dependência”. As penas para o crime envolvem detenção de seis meses a três anos, multa, além da suspensão ou proibição para que o condutor possua novamente licença para dirigir.
Margem do Contran que define presença de álcool no organismo como crime de trânsito
- Até 0,04 mg/L: Sem penalidades, está dentro da margem de erro estabelecida pelo Contran. (não há crime).
- De 0,05 mg/L a 0,33 mg/L: Infração gravíssima de trânsito com multa de R$ 2.934,70 (não há crime).
- Igual ou superior a 0,34 mg/L: Enquadra-se como crime de trânsito, e o condutor responderá criminalmente. (há crime).
Decisões adotadas pelo delegado de polícia em ocorrências com resultado positivo de bafômetro quando o motorista ingeriu apenas pão de forma
A Consultoria Jurídica do Portal Nacional dos Delegados apresenta exemplos de decisões que o delegado de polícia pode adotar sobre casos dessa natureza quando motorista é detido após teste bafômetro com resultado positivo para álcool e apresentado na delegacia, mesmo não havendo ingerido bebida alcóolica, mas apenas ingerido de pão de forma.
Veja abaixo:
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