JURÍDICO
Delegado Neto defende polícia judiciária independente
JURÍDICO
Por Alexandre Neto
{loadposition adsensenoticia}O desfecho do Caso Isabella haverá de servir como um marco para a Polícia Judiciária brasileira. Um marco triste para a sociedade, mas também um marco de partida para a independência de uma polícia investigativa e voltada para os aspectos científicos da atividade policial, cuja interferência externa se mostra mais difícil para aqueles que insistem em burlar a lei, até porque nosso programa de proteção à testemunhas não passa de uma piada de mau gosto.
Sentimo-nos no dever de falar em prol da sociedade, pois além de sermos servidores públicos, somos parte indissociável dela. Tudo que fazemos ou deixamos de fazer haverá de se refletir sobre nós mesmos, indiscriminadamente.
Como bem disse o Dr Levi Inimá, “a real e imprescindível autonomia faltante é a ética e moral”. Assim, a primeira independência desejável a qualquer Polícia seria essa, como supedâneo para todas as demais independências, quer seja a administrativa, a funcional e a financeira, tal qual já ocorre com o Poder Judiciário, com o Ministério Público e com a Defensoria Pública.
A Polícia Judiciária é, sem sombra de dúvidas, uma carreira de Estado. As autoridades policiais são, sem sombra de dúvidas, os juízes do primeiro momento, os juízes da fase pré-processual, onde o equilíbrio entre quem acusa (o Ministério Público) e o investigado (possível indiciado) se mostram imprescindíveis para uma investigação isenta e voltada para o interesse público.
Quem promove não investiga, mas apenas requisita, fundamentadamente. E depois fiscaliza (o que nem sempre acontece, pois dá trabalho !). É o que diz a Constituição Federal. Assim, falar-se acerca de uma “Polícia Judiciária independente” é, primordialmente, conferir a ela, ab initio, a capacidade de se desincumbir de tudo aquilo que está contemplado nos artigos 4º a 22, do Código de Processo Penal, cujo Título (II) trata do Inquérito Policial. Discorrer sobre tal tema daria um livro (existem vários autores renomados a respeito do assunto), mas isso não interessaria à pessoa comum, que quer ver a solução conjuntural para o problema da segurança pública, e não a solução legal, que apenas importa aos operadores do Direito e seus auxiliares técnicos (peritos).
Desta forma, mister se faz repisar aquilo que já foi dito : “POLÍCIA SE FAZ COM 3 S’s – SELEÇÃO, SALÁRIO E SUPERVISÃO”. Simples, não ? Mas nem sempre o que é simples deve ser mostrado, pois é a magia que faz a fama do mago. Porém, a Polícia Judiciária paulista mostrou que na busca da verdade real não há mágica, e que a integração entre aqueles que investigam e aqueles que acusam é a chave para o sucesso, é a chave para levar os criminosos – comuns e de colarinho branco – pro xadrez.
Assim, no que diz respeito ao estado do Rio de Janeiro, o chamado “PROJETO DELEGACIA LEGAL” foi lançado nos idos da primeira dinastia “Garotinho”, mas já nasceu como um projeto político que visava a promover a imagem de um “governo”, e não de uma Instituição. Começou-se pelo fim. Começou-se por onde dava dinheiro, ou seja, pelas obras públicas de caráter emergencial, tendo como ponta de lança um “técnico em águas profundas” e expert no assunto. Criou-se um “Grupo Executivo” que acabou numa patota privilegiada de autoridades que executava tudo aquilo que interessava ao projeto político de um pretenso “presidente da república”, cujo desfecho se deu na segunda dinastia daquela família, com dois ex-chefes de polícia presos pela Polícia Federal.
Ora, qualquer “Polícia Legal” que se queira inaugurar deveria começar com uma “SELEÇÃO LEGAL”, com uma “ACADEPOL LEGAL”, e não com um monte de obras ilegais, tal qual se apura em um inquérito em trâmite perante a PF, cujo desfecho ainda se desconhece. Criou-se então o policial “GARÇA LEGAL” – todo arrumadinho, de gravata e com os pés enfiados no lodo – pois não existe valorização institucional – e profissional – que não passe primeiro pelos homens que a compõem. De nada adianta se entregar computadores, viaturas e armas novas a servidores desmotivados e desvalorizados.
O passo inicial para o chamado “PROJETO DELEGACIA LEGAL” deveria ter sido a “ACADEPOL LEGAL”, mas o projeto político-pessoal do então chefe do Executivo estadual estaria fadado ao insucesso. O ex-radialista não seria o presidente da república, e continuaria sendo apenas um “Garotinho”. Vulnerou-se, assim, o primeiro “S”. A SELEÇÃO foi esquecida em detrimento da PROMOÇÃO pessoal e política do então governador do estado, e não faltaram delegados de polícia para abanar a ideia. Eles passaram, mas a Polícia continua.
Desta forma, sem SELEÇÃO, o SALÁRIO foi relegado ao banimento, pois quem tem carteira, arma e distintivo faz o seu próprio salafrário, digo, salário. E aí então vieram os “policiaisinhos” comandados pelo “mago prodígio” do salário fácil e arrecadável todo dia 10 de cada mês. Decretou-se assim a falência do segundo “S”, pois quem pode contar com a grana das maquininhas e de outras coisinhas não vai se preocupar com as “filigraninhas” salariais das “DELEGACIAS LEGAIS”.
Restou, afinal, o terceiro “S”, onde a SUPERVISÃO foi substituída pela “SACANAGEM”, que ninguém consegue enxergar, mas que sempre beneficia meia dúzia de espertos que sabem os caminhos das pedras numeradas da contravenção. É igualzinho ao tráfico de drogas: meia dúzia controla e desvirtua toda uma Instituição em troca de migalhas pagas mensalmente. Se tornam “escravos” dessa propina e só se aposentam aos 70 (setenta) anos de idade por “amor à profissão”, que carinhosamente chamam de “cachaça”. Alguns até viram cachaceiros na vida real e terminam alcoolizados pela própria profissão que abraçaram, enquanto outros acabam como “colecionadores de figurinhas carimbadas”, pois é a posse do álbum que lhes garante o “poder”. Triste fim em ambos os casos.
Mas a “Polícia Judiciária independente” que queremos passa, principalmente, por uma LEI ORGÂNICA que lhe garanta uma CORREGEDORIA INDEPENDENTE, onde o CORREGEDOR deva ser escolhido entre seus próprios pares, e não pelo Chefe de Polícia apenas, pois assim fica fácil controlar e manter a própria corrupção e impunidade internas. A Chefia de Polícia e a Corregedoria haverão de ter o mesmo status institucional, tal qual já acontece no Ministério Público e no Poder Judiciário, apenas se reportando ao Chefe do Poder Executivo ou ao Secretário de Segurança, onde houver. O mesmo se daria com a “eleição” do Chefe de Polícia, escolhido pelo Chefe do Poder Executivo a partir de uma lista tríplice submetida ao escrutínio institucional, tal qual ocorre no Ministério Público, tudo isso com a dotação de uma autonomia administrativa e financeira capazes de traçar os interesses institucionais em compasso com o interesse público, sem o desvio ou a escassez de verbas orçamentárias que findam por transformar a Polícia Judiciária num órgão dependente da vontade política e totalmente inoperante sob o aspecto social e, sobretudo, técnico-científico.
Não sei se estarei vivo para ver isso acontecer, mas prometo que irei lutar por isso até o final de minha vida, pois ainda sonho com UMA INSTITUIÇÃO LEGAL no seu todo, onde tudo não passe de mera troca de “figurinhas carimbadas” e apelidadas de “HOMENS DE OURO”, “ASTRAS”, “JÓQUEIS”, “INHOS” e “ADIDOS”. Sonho com uma POLÍCIA que não precise virar ESCOLA DE SAMBA S/A para se ver subempregada por uma entidade endeusada por governadores, prefeitos, secretários e políticos, pois a remuneração desses policiais designados para o maior evento festivo do mundo deveria ser feita de forma direta e oficial aos seus órgãos de origem, a fim de prestigiar o próprio estado e o serviço público, e não a “segurança privada”, mascarada, apadrinhada e comprometida com interesses sempre obscuros.
Sonho com uma POLÍCIA onde a remoção de delegados para outras unidades de Polícia Judiciária se opere de forma motivada, sob o crivo do interesse público e designação colegiada do Conselho Superior de Polícia, evitando-se as transferências e “punições geográficas”, sempre realizadas sob um suposto “juízo de conveniência e oportunidade” daqueles mesmos interesses políticos que fazem nascer e brotar a corrupção institucionalizada. Tenho certeza que, um dia, chegaremos lá…
Rio de Janeiro, 28 de Março de 2010.
Alexandre Neto “
delegado Alexandre Neto, da Polícia Civil do Rio
FÁBIO GAUDÊNCIO
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