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Delegado adota filhote de cão sobrevivente de ataque de vizinho

por Editoria Delegados

Cadelinha de um mês foi salva depois que titular do 4° DP percebeu respiração; outro cãozinho sobreviveu por não ter sido encontrado pelo agressor

Cadelinha de um mês foi salva depois que titular do 4° DP percebeu respiração; outro cãozinho sobreviveu por não ter sido encontrado pelo agressor

Em 21 anos na Polícia Civil do Estado de Goiás (PCGO), o delegado Jonatas Barbosa terminava o expediente daquela terça-feira (20) quando os policiais militares Paulo Cesar Azevedo de Souza e Edson Luiz Gomes Santana encostaram a viatura 5.13598, do 8° Batalhão, em frente à sede do 4° Distrito Policial de Aparecida de Goiânia, no Setor Garavelo.

Nos calhamaços de papéis do 4° Distrito tem quase tudo: furto de bicicleta, briga entre bêbados e tentativa de homicídio por causa de camiseta de time de futebol. A visita dos policiais militares poderia ser mais um desses flagrantes da região, mas enquanto um dos policiais conduzia André Felipe Lima, 19 anos, algemado, o outro militar carregava uma caixa de papelão — dessas de sapato — com três filhotes de apenas um mês de vida e tamanho que não passava de 13 cm. Para os militares, todos estavam mortos.

Atento aos detalhes que adquiriu com a experiência dos 21 anos de polícia, o delegado encarou os três filhotes e percebeu que uma fêmea respirava em meio ao sangramento no pescoço. “Corre, leva para um veterinário. Corre!”, ordenou ele para dois agentes da delegacia. Rápida e cuidadosamente, os policiais levaram a cadelinha para a Clínica Veterinária Faro, a pouco mais de 100 metros dali.

Às pressas, a equipe da clínica pegou a filhotinha e a levou à mesa de cirurgia. Anestesiada, foi costurada com oito pontos que contornaram quase o pescocinho todo. Ao mesmo tempo em que era operada, a história dela e dos irmãozinhos assassinados — e um que sobreviveu por não ter sido encontrado pelo agressor— se espalhava entre os policiais.

E a cronologia da tragédia começou a ser montada com o depoimento da tutora da Belinha, mãe dos filhotes, a cabeleireira Lindineia Martins Bastos, 25 anos. Naquele dia, Lindineia acordou com ameaças do outro lado do muro da casa em que mora com o marido, Thomé de Souza Paiva, também com 25 anos. A vizinha, de apenas 14 anos, que vivia com André há uma semana na residência ao lado, conversava com outra mulher sobre o ocorrido na noite anterior, quando o casal recebeu em casa visitas e promoveu uma barulheira que misturava voz e som alto.

“Eu e meu marido íamos chamar a polícia, mas pedimos para eles desligarem. E sofremos ameaças”, conta. “A gente não imaginava que algo ia acontecer com os filhotinhos da Belinha”, lamenta ela, que ganhou a cadela assim que chegou em Goiânia há dois anos, em busca de uma vida melhor.

Ela contou ao jornal O Hoje que, depois do almoço, deu leite para os filhotes e saiu de casa para cobrar o serviço de uma cliente. Quando voltou, se deparou com o horror causado pelo vizinho que aproveitou a ausência e pulou o muro da residência no Parque Itatiaia, em Aparecida. Ali, provocou uma violência comum em um país de maus-tratos aos animais, mas pouco retratada pela crônica policial brasileira.

Um dos filhotes estava pendurado por um prendedor em um arame, na área de casa. Estava morto, com um corte profundo no pescoço feito com faca. No chão, outros dois filhotinhos estavam gravemente feridos. Um deles, segundo a perícia, pode ter tido parte do corpo esmagado com os pés até a morte. Na parede pintada com cor de mostarda, o vizinho escreveu, usando o sangue dos animais, uma ameaça: “O sangue deles não deu de vcs vai dá (sic)”.

Relembrando o caso, o delegado Jonatas Barbosa desabafa: “Estou acostumado a ver de tudo que é ruim naquela delegacia. Esse caso é assustador”. O delegado também foi responsável por outro caso que ficou conhecido na região, quando um homem matou um cachorro com uma pedrada no meio da rua. Apegado às causas animais, o delegado recebeu uma ligação da Clínica sobre a alta da cadelinha no fim da semana passada.

Mas a cabeleireira, sem condições financeiras, autorizou a doação. “Eu não conseguia ficar com ela porque a gente não tinha condição de pagar pela cirurgia e nem pelos remédios. Aí decidimos doar”, diz a cabeleireira, sem saber que todo o tratamento foi custeado — em torno de R$ 400 — pelo delegado Jonatas Barbosa.

Mesmo sem espaço no apartamento— que já tem três cães—, o delegado decidiu adotar a cadelinha. O animal deve ficar na casa do casal de sogros do policial, Nilma Barbosa, 62 anos, e Valdir Barbosa, 69 anos. “Aqui ela vai ter muito espaço para correr”, diz, otimista, Nilma, animada com a história. “A gente está cuidando para que sobreviva”, complementa Valdir, ajeitando a caixinha, adaptação para uma cama no canto da sala do casal, no Celina Park, em Goiânia. Até um ursinho de pelúcia que faz às vezes de mãe, foi colocado na caixa.

A cadelinha foi batizada de Vitória. E não por acaso: a fissura causada por uma faca quase separou a cabeça do corpinho e a cirurgia é tratada como milagrosa. Sobre o trauma e aliviada com o final da história, Lindineia vai vigiar Belinha para que ela não escape pelo portão de novo e encontre o namorado por quem se apaixonou. Pai dos quatro filhotinhos, Neguinho, um poodle que mora a poucos metros de casa, às vezes aparece na porta. “Da outra vez, quando escapou, ela voltou ‘buchuda’. Fiquei chateada, mas a gente ficou na expectativa. Quando nasceram, ela não quis amamentar. Nem queria saber dos filhotes”, conta ela. Agora Belinha mudou o comportamento. Não sai de perto do único filhotinho que restou da filharada. “A gente decidiu ficar com ele, que vai se chamar Guerreiro”.

André Felipe Lima teve a prisão preventiva decretada e foi encaminhado à Casa de Prisão Provisória (CPP). Com a revolta dos vizinhos com o caso, a família do rapaz arranjou um caminhão e retirou todos os móveis da casa. A cadelinha Vitória se recupera na casa dos sogros do delegado Jonatas e ainda tropeça, sozinha, nas próprias patinhas. O irmão dela, Guerreiro, já rosna, esperto, espiando a rua pelas frestas do portão da casa que foi palco da violência que o separou dos irmãozinhos antecipadamente. “Ele chora, mas é por falta dos outros”, lamenta Lindineia. 

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