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A busca e apreensão domiciliar adesiva (adesividade) ou itinerante no combate e repressão à criminalidade organizada

por Editoria Delegados

Por Joaquim Leitão Júnior

 

Por Joaquim Leitão Júnior[1]

 

O cumprimento do mandado de busca e apreensão domiciliar se tornou importante mecanismo de combate e repressão à criminalidade organizada, mormente diante de objetos a serem arrecadados em poder de seus integrantes como provas de sua integração entre outras posições da “orcrim” na repressão qualificada.

 

Não distante da realidade, os levantamentos investigativos têm demonstrados constantes mudanças deliberadas de endereços dos integrantes investigados para dificultar ações policiais e burlar o próprio poder estatal, tornando-se imperioso criar-se ferramentas dentro das investigações que fizesse frente a nova artimanha das “orcrims”, o que faz surgir o mandado de busca e apreensão domiciliar com adesividade (adesivo) ou itinerante.

 

O mandado de busca e apreensão domiciliar com adesividade (adesivo) ou itinerante tem seu cabimento em hipóteses que o alvo investigado integrante de organização criminosa muda subitamente para se furtar de diligências policiais e dificultar ações policiais. Nessa circunstância, deverá contar com autorização judicial, o que pode ocorrer na autorização inicial de busca e apreensão, não como uma espécie de “cheque em branco” para entrar em qualquer residência, mas sim na nova residência do investigado – usada como artimanha para burlar a ação.

Em outras palavras, o mandado de busca e apreensão domiciliar com adesividade (adesivo) ou itinerante é uma espécie de mandado de busca e apreensão domiciliar que permite o cumprimento de busca e apreensão em outro domicílio do alvo investigado diverso do endereço inicialmente contido no mandado, desde que claramente autorizado na ordem judicial e tem por escopo evitar essas ações furtivas de investigados, mormente em investigações de “orcrims”, tráfico de drogas, terrorismo dentre outros.

Obviamente, na impossibilidade do mandado de busca e apreensão ser cumprido de imediato na nova casa do investigado – por não ser adesivo ou itinerante – haverá por prejudicar toda a diligência, em razão do princípio da oportunidade (além do princípio da eficiência) e por malferir o fator surpresa, pois o agente tomará conhecimento de que contra ele há investigação em andamento e mandado de busca e apreensão, fazendo com que destrua as provas contra ele e mude novamente de endereço.

De toda forma, antes de cumprir o mandado de busca e apreensão, a autoridade policial deve ter a cautela necessária para certificar que o endereço do investigado está atualizado.

A evolução do crime, a dinâmica de atuação dos infratores e a complexidade das investigações não podem engessar a repressão ao crime, sob o fundamento de tutela de direitos fundamentais, como se pudessem ser utilizados para proteger a prática de ilícitos penais. Esse argumento ganha mais tintura quando se olha para as organizações criminosas, tráfico de drogas, terrorismo etc, pela própria dinâmica das células criminosas e complexidade dos meandros dessa criminalidade coletiva.

Ademais, devemos lembrar que, não há direitos e garantias constitucionais absolutos, aptos a impedir a atuação da polícia, vez que de outro lado existe uma sociedade carente da presença estatal e que clama por mais paz e segurança, inclusive no aspecto patrimonial.

Com o objetivo de angariar mais provas relacionadas ao crime, a medida de mandado de busca e apreensão domiciliar com adesividade (adesivo) ou itinerante faz-se necessária, na angulatura da criminalidade contemporânea organizada, por envolver toda essa singularidade e dinâmica da constante mudança de endereços dos integrantes e também diante da possibilidade de apreender materiais, objetos e instrumentos que se relacionem com os fatos investigados, acerca dos ilícitos penais.

Por isto a busca domiciliar com adesividade, realizada no domicílio dos suspeitos/investigados torna-se indispensável para apreender coisas que interessam às investigações e que se suspeita que sejam ali guardadas.

O mandado de busca e apreensão domiciliar com adesividade (adesivo) ou itinerante além de ser um meio coercitivo pelo qual é, por lei, utilizada a força do Estado para apossar-se de elementos da prova, de objetos a confiscar, da pessoa do culpado, ou para investigar e arrecadar os vestígios de um crime.

Nesse passo, o artigo 240 do Código de Processo Penal indica quais os objetivos da medida, que se não limitam às coisas ou à pessoa do indiciado:

“Art. 240.  A busca será domiciliar ou pessoal.

  • 1oProceder-se-á à busca domiciliar, quando fundadas razões a autorizarem, para:
  1. a) prender criminosos;
  2. b) apreender coisas achadas ou obtidas por meios criminosos;
  3. c) apreender instrumentos de falsificação ou de contrafação e objetos falsificados ou contrafeitos;
  4. d) apreender armas e munições, instrumentos utilizados na prática de crime ou destinados a fim delituoso;
  5. e) descobrir objetos necessários à prova de infração ou à defesa do réu;
  6. f) apreender cartas, abertas ou não, destinadas ao acusado ou em seu poder, quando haja suspeita de que o conhecimento do seu conteúdo possa ser útil à elucidação do fato;
  7. g) apreender pessoas vítimas de crimes;
  8. h) colher qualquer  elemento de convicção.”

 

– Do cabimento do mandado de busca e apreensão domiciliar com adesividade (adesivo) ou itinerante, frente as constantes modificações de domicílio (lar) pelo integrante da “orcrim”, com a finalidade de dificultar que sejam descobertos ou eventuais ações da polícia.

Como já dito em linhas pretéritas, tornou-se algo digno de registro apontar a nova dinâmica dos alvos faccionados mudarem constantemente de domicílio para não serem surpreendidos por ações policiais.

O propósito desta modificação constante de domicílio (lar) de tempos em tempos é com a finalidade de dificultar que sejam descobertos ou eventuais ações da polícia.

O mandado de busca e apreensão domiciliar com adesividade (adesivo) permite que o mandado seja cumprido no endereço inicialmente previsto no mandado ou onde quer que o alvo se encontre.

Diante dessa celeuma surge a discussão da possibilidade do mandado de busca e apreensão expedido poder ser cumprido em endereço diverso daquele constante no pedido feito pela autoridade policial, caso se demonstre que o agente mudou de endereço subitamente, com o fim de resguardar o seu comércio ilícito de drogas, armas de fogo, terrorismo dentre outras.

Cuida-se da denominada “adesividade do mandado de busca e apreensão”, o que pode se dar mediante autorização judicial.

Citemos a título exemplificativo de uma investigação que aponte o endereço que o traficante utiliza para vender drogas ou para vender armas de fogo, o Delegado de Polícia representa o mandado de busca e apreensão e ao cumpri-lo detecta que o agente se mudou, rapidamente, para evitar a apreensão das drogas e armas de fogo, e, consequentemente, a prisão.

Surge algumas ponderações nesse contexto: neste caso, poderá a autoridade policial diligenciar para descobrir de imediato o novo endereço e utilizar-se do mesmo mandado de busca e apreensão para ingressar na nova casa do investigado, ainda que no mandado não conste o novo endereço? Em caso de hipótese negativa,  será necessário relatar essas circunstâncias e requerer novo mandado de busca e apreensão judicial?

O art. 243, I, do Código de Processo Penal estabelece que o mandado de busca deverá indicar o mais precisamente possível a casa em que será realizada a diligência e o nome do respectivo proprietário ou morador. Vejamos:

 

Art. 243.  O mandado de busca deverá:


I – indicar, o mais precisamente possível, a casa em que será realizada a diligência e o nome do respectivo proprietário ou morador; ou, no caso de busca pessoal, o nome da pessoa que terá de sofrê-la ou os sinais que a identifiquem;

  

O art. 5º, XI, da Constituição Federal assegura a possibilidade de se ingressar na residência, durante o dia, mediante autorização judicial.

 

Nota-se que o Código de Processo Penal estatui que o mandado deve indicar o local que sofrerá a busca o “mais precisamente possível”, o que permite afirmar que em situações de mudança repentina de endereço com a finalidade de se esquivar das investigações, da atuação policial, a polícia poderá, ainda que não haja no mandado o novo endereço, diligenciar de imediato e cumpri-lo no novo endereço, pois, além da proteção constitucional da inviolabilidade domiciliar visar tutelar o morador e não o espaço físico, o Código de Processo Penal autoriza a indicação do endereço na medida do possível.

 

Em qualquer caso o cumprimento do mandado de busca e apreensão no novo endereço do investigado que se mudou subitamente deverá contar com autorização judicial, o que pode ocorrer na autorização inicial de busca e apreensão, não como uma espécie de “carta em branco” para entrar em qualquer residência, mas sim na nova residência do investigado.

 

Obviamente, na impossibilidade do mandado de busca e apreensão ser cumprido de imediato na nova casa do investigado haverá por prejudicar toda a diligência, em razão do princípio da oportunidade (além do princípio da eficiência) e por malferir o fator surpresa, pois o agente tomará conhecimento de que contra ele há investigação em andamento e mandado de busca e apreensão, fazendo com que destrua as provas contra ele e mude novamente de endereço.

 

De toda forma, antes de cumprir o mandado de busca e apreensão, a autoridade policial deve ter a cautela necessária para certificar que o endereço do investigado está atualizado com registros de fotografias, vídeos (se possível), extração das coordenadas geográficas(se possível) dentre outros protocolos que possam assegurar que ali é realmente o atual domicílio do alvo, sem causar alarde nesse.

 

Como repisado anteriormente, a evolução do crime, a dinâmica de atuação dos infratores e a complexidade das investigações não podem engessar a repressão ao crime, sob o fundamento de tutela de direitos fundamentais, como se pudessem ser utilizados para proteger a prática de ilícitos penais.       

 

Vale anotar que, o Tribunal de Justiça do Estado do Paraná proferiu decisão que chancelou a legalidade da adesividade do mandado de busca e apreensão (TJ-PR – HC: 00240616920218160000 Ampére 0024061-69.2021.8.16.0000 (Acórdão), Relator: Paulo Roberto Vasconcelos, Data de Julgamento: 03/08/2021, 3ª Câmara Criminal, Data de Publicação: 13/08/2021). Vejamos o aresto do sodalício Tribunal paraense:

 

“HABEAS CORPUS. TRÁFICO DE DROGAS, ASSOCIAÇÃO AO NARCOTRÁFICO E POSSE IRREGULAR DE ARMA DE FOGO DE USO PERMITIDO (ARTIGO 33, CAPUT E 35, CAPUT, C/C O ART. 40, IV, TODOS DA LEI Nº 11.343/06 E ARTIGO 12 DA LEI Nº 10.826/03). PRISÕES EM FLAGRANTE CONVERTIDAS EM PREVENTIVAS. 1. ADUZIDO EXCESSO DE PRAZO NA CONCLUSÃO DO INQUÉRITO POLICIAL. NÃO OCORRÊNCIA. SUPERVENIENTE OFERECIMENTO DE DENÚNCIA. 2. TESE DE ILEGALIDADE DO FLAGRANTE POR INVASÃO DE DOMICÍLIO. IMPROCEDÊNCIA. MANDADO DE BUSCA E APREENSÃO CUMPRIDO POR ADESIVIDADE. ESTADO DE FLAGRÂNCIA VERIFICADO. 3. AVENTADA AUSÊNCIA DOS REQUISITOS DA PRISÃO CAUTELAR. NÃO OCORRÊNCIA. PROVAS DA EXISTÊNCIA DOS CRIMES E INDÍCIOS SUFICIENTES DE AUTORIA. CONSTRIÇÃO PREVENTIVA QUE NÃO SE REVELA INCOMPATÍVEL COM A PRESUNÇÃO DE INOCÊNCIA. DECRETO PRISIONAL DEVIDAMENTE FULCRADO NA GARANTIA DA ORDEM PÚBLICA. GRAVIDADE CONCRETA DAS CONDUTAS. PACIENTES QUE, A PRINCÍPIO, ASSOCIARAM-SE DE MANEIRA ESTÁVEL E PERMANENTE A OUTROS DOIS INDIVÍDUOS PARA A PRÁTICA DA TRAFICÂNCIA EM SUAS PRÓPRIAS RESIDÊNCIAS, INCLUSIVE COM EMPREGO DE ARMA DE FOGO. INDÍCIOS DE HABITUALIDADE DELITIVA E PERICULOSIDADE DOS AGENTES SEGURAMENTE DEMONSTRADOS. insuficiência da aplicação de outras medidas cautelares menos gravosas. CONDIÇÕES PESSOAIS FAVORÁVEIS, POR SI SÓS, QUE NÃO GARANTEM O DIREITO À LIBERDADE. CONSTRANGIMENTO ILEGAL NÃO VERIFICADO. PRISÕES PREVENTIVAS MANTIDAS.ORDEM CONHECIDA E DENEGADA. (TJ-PR – HC: XXXXX20218160000 Ampére XXXXX-69.2021.8.16.0000 (Acórdão), Relator: Paulo Roberto Vasconcelos, Data de Julgamento: 03/08/2021, 3ª Câmara Criminal, Data de Publicação: 13/08/2021)”

 

Em recente decisão, o Superior Tribunal de Justiça também encampou essa posição da possibilidade de mandado de busca e apreensão por adesividade ou itinerante:

 

“PENAL E PROCESSO PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EM HABEAS CORPUS. 1. OPERAÇÃO ZAYN. ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA INTERESTADUAL. FURTO QUALIFICADO. ROUBO MAJORADO. FALSIFICAÇÃO DE DOCUMENTOS. ADULTERAÇÃO DE SINAL IDENTIFICADOR DE VEÍCULOS. MANDADO DE BUSCA E APREENSÃO ITINERANTE. EXCEPCIONALIDADE FUNDAMENTADA. AUSÊNCIA DE ILEGALIDADE. 2. OFENSA AO PRINCÍPIO ACUSATÓRIO. NÃO VERIFICAÇÃO. MANIFESTAÇÃO FAVORÁVEL DO MP. 3. CUMPRIMENTO DO MANDADO APÓS MAIS DE 1 ANO. AUSÊNCIA DE PRAZO LEGAL. PARTICULARIDADES QUE JUSTIFICAM A DEMORA. 4. OFENSA AO SIGILO PROFISSIONAL. SUPRESSÃO DE INSTÂNCIA. 5. AGRAVO REGIMENTAL A QUE SE NEGA PROVIMENTO. 1. O caráter itinerante excepcionalmente conferido ao mandado de busca e apreensão deferido contra o recorrente encontra-se, na presente hipótese, devidamente fundamentado, em elementos concretos e legítimos, motivo pelo qual não é possível considerar ilícita mencionada decisão. A hipótese dos autos não revela ordem judicial genérica e indiscriminada, porquanto indicado objetivo certo e pessoa determinada, além da especificidade de o recorrente ser o líder de organização criminosa que pratica crimes em diversos estados da federação. – Nesse contexto, não se tratando de ordem judicial genérica e indiscriminada, e estando devidamente fundamentada em especificidades do caso concreto, não há se falar em nulidade da decisão que deferiu a busca e apreensão contra o recorrente, de forma itinerante. Conforme destacado pelo Ministério Público Federal, “a ordem judicial autorizava o cumprimento da busca e apreensão em local diverso do inicialmente indicado, com vistas a garantir o êxito das investigações, inexistindo, portanto, qualquer ilegalidade no ato”. – As circunstâncias fáticas indicadas nos autos, as quais se mostraram adequadas ao deferimento da medida de busca e apreensão itinerante, seriam aptas a ensejar inclusive a restrição da própria liberdade do paciente, que é medida muito mais gravosa. Dessa forma, não há se falar em ilegalidade da busca e apreensão, da forma como deferida, porquanto concretamente fundamentada.”

Logo, o mandado de busca e apreensão domiciliar deve se dar com adesividade ou itinerante justamente para abarcar essa tentativa clara de burlar a lei e ações policiais.

 

– Das considerações finais

 

Ante o exposto, diante das singularidades e dinâmicas dos integrantes da criminalidade difusa em modificar constantemente os seus endereços e da própria complexidade para reprimir e combater essa dita dita criminalidade constatada na atual conjuntura, apenas teremos ações e operações policiais eficazes com a implementação da busca e apreensão domiciliar itinerante ou adesiva. Para tanto é primordial seguir precedente do Superior Tribunal de Justiça que entendeu ser possível o mandado de busca e apreensão domiciliar itinerante ou adesivo.

Como podemos visualizada, a busca e apreensão domiciliar itinerante ou adesiva se tornou importante mecanismo de combate e repressão à criminalidade organizada, mormente diante de objetos a serem arrecadados em poder de seus integrantes como provas de sua integração entre outras posições da “orcrim” na repressão qualificada.

 

Não distante da realidade, frente as constantes mudanças deliberadas de endereços dos integrantes investigados para dificultar ações policiais e burlar o próprio poder estatal, o mandado de busca e apreensão domiciliar deve se dar com adesividade ou itinerante será uma ferramenta útil em desfavor das criminalidade difusa e coletiva organizada.

 

[1] Pós-graduado em Ciências Penais pela rede de ensino Luiz Flávio Gomes (LFG) em parceria com Universidade de Santa Catarina (UNISUL). Pós-graduado em Gestão Municipal pela Universidade do Estado de Mato Grosso – UNEMAT e pela Universidade Aberta do Brasil. Curso de Extensão pela Universidade de São Paulo (USP) de Integração de Competências no Desempenho da Atividade Judiciária com Usuários e Dependentes de Drogas. Colunista do site Justiça e Polícia, coautor de obras jurídicas e autor de artigos jurídicos. Ex-Diretor Adjunto da Academia da Polícia Judiciária Civil do Estado de Mato Grosso. Ex-Assessor Institucional da Polícia Civil de Mato Grosso. Ex-assessor do Tribunal de Justiça de Mato Grosso. Delegado de Polícia no Estado de Mato Grosso e atualmente lotado na unidade desconcentrada do Grupo de Atuação Especial Contra o Crime Organizado (GAECO) de Barra do Garças-MT.

 

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