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STJ: é ônus do réu a prova da origem lícita do bem na receptação

por Editoria Delegados

A Quinta e Sexta Turmas do Superior Tribunal de Justiça (STJ), decidiram que, no crime de receptação, cabe à defesa provar a origem lícita do bem ou da conduta culposa, sem que se possa falar em inversão do ônus da prova.

O processo penal possibilita ao operador aproximar-se da verdade dos fatos e do direito. Todavia, segundo adverte L. Ferrajoli, há incertezas inerentes ao que o processo “é”, a despeito do que “deveria ser”.

Com vistas a contornar essas dificuldades, o doutrinador propõe que: (a) o juiz, no plano do que o processo “deve ser”, há que julgar, condenar ou absolver de acordo com as provas do fato, positivas e negativas, submetendo-lhes a sua convicção; (b) as garantias processuais, no que se refere à produção de provas, exigem certificar-se da necessidade da prova ou verificação, a possibilidade de contraprova ou refutação, e que a decisão seja imparcial e “motivada sobre a verdade processual fática” (FERRAJOLI, 2014, p. 141); e (c) só se pode falar em segurança jurídica se a lei e a jurisdicionariedade forem estritas, ou seja, a lei deve ter conteúdo claro e inequívoco, e o pronunciamento judicial há de estar firmado na prova dos fatos e na interpretação do direito, sem espaço para que se extrapolem esses dois limites.

Não raras as vezes, tais premissas deixam de ser observadas no âmbito judiciário, de modo a prevalecer a praxe jurídica sobre o preceito da legalidade. Ao nosso ver, bem o expressa o entendimento reafirmado pelo Superior Tribunal de Justiça acerca da redistribuição do ônus da prova no julgamento de crimes de receptação, temática sobre a qual nos debruçaremos.

O Código Penal, em seu artigo 180, caput, tipificou a conduta de:

adquirir, receber, transportar, conduzir ou ocultar, em proveito próprio ou alheio, coisa que sabe ser produto de crime, ou influir para que terceiro, de boa-fé, a adquira, receba ou oculte.

No que se refere aos elementos objetivos do tipo, a análise do conjunto probatório cursa sem maiores esforços. Por outro lado, é no campo da tipicidade subjetiva que se encontram os entraves à cognição da verdade.

Isso porque, sendo inviável incursionar pela consciência do agente, o dolo há que ser excisado das circunstâncias objetivas em que se deu a prática da conduta.

Nesse ponto, o Superior Tribunal de Justiça sedimentou que compete ao acusado comprovar a ausência de dolo e a origem lícita do bem quando apreendido em sua posse.

A Quinta e Sexta Turmas do Superior Tribunal de Justiça (STJ), decidiram que, no crime de receptação, cabe à defesa provar a origem lícita do bem ou da conduta culposa, sem que se possa falar em inversão do ônus da prova.

“(…) A conclusão da instância ordinária está em sintonia com a jurisprudência consolidada desta Corte, segundo a qual, no crime de receptação, se o bem houver sido apreendido em poder do paciente, caberia à defesa apresentar prova da origem lícita do bem ou de sua conduta culposa, nos termos do disposto no art. 156 do Código de Processo Penal, sem que se possa falar em inversão do ônus da prova”. (STJ, HC 626.539/RJ, Rel. Ministro RIBEIRO DANTAS, QUINTA TURMA, julgado em 09/02/2021, DJe 12/02/2021).

 

“Tendo o Tribunal de Justiça concluído, com base no conjunto fático-probatório dos autos, que ‘a prova dos autos é suficiente quanto à configuração do crime de receptação’, ressaltando que ‘o objeto foi encontrado na posse do Apelante, situação esta que inverte o ônus da prova de sua inocência, sendo certo que ele não comprovou, em momento algum, a origem lícita do mesmo’, a alteração do entendimento da Corte de origem, como pretendido, com vistas à absolvição do recorrente, demandaria necessariamente o reexame do conjunto fático-probatório, o que é vedado em recurso especial, a teor da Súmula 7/STJ. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça se firmou no sentido que, ‘no crime de receptação, se o bem houver sido apreendido em poder do paciente, caberia à defesa apresentar prova acerca da origem lícita do bem ou de sua conduta culposa, nos termos do disposto no art. 156 do Código de Processo Penal, sem que se possa falar em inversão do ônus da prova’ (AgRg no HC 331.384/SC, Rel. Ministro RIBEIRO DANTAS, QUINTA TURMA, julgado em 22/08/2017, DJe 30/08/2017). Como observado pelo MPF, tratando-se de réu primário, cuja pena-base foi fixada no mínimo legal, não tendo sido apontado fundamento concreto para justificar o recrudescimento do regime, faz jus ao regime mais brando, nos termos das Súmulas 440/STJ e 718 e 719/STF, a justificar a concessão de habeas corpus de ofício, nos termos do art. 654, §2º, do CPP. Agravo improvido. Concessão de HC de ofício para estabelecer o regime aberto. (STJ, AgRg no AREsp 1874263/TO, Rel. Ministro OLINDO MENEZES (DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TRF 1ª REGIÃO), SEXTA TURMA, julgado em 19/10/2021, DJe 22/10/2021).

 

 

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