Busca e apreensão negativa pode ser tão importante quanto a positiva

Por Henrique Hoffmann e Adriano Sousa Costa Por Henrique Hoffmann e Adriano Sousa Costa A busca e apreensão se qualifica como importante mecanismo disponível ao Estado-investigação, no contexto da devida investigação criminal. Consiste em medida cautelar probatória, isto é, meio de obtenção de prova, diligência para angariar elementos de convicção, de modo a provar ou não a […]

Por Editoria Delegados

Por Henrique Hoffmann e Adriano Sousa Costa

Por Henrique Hoffmann e Adriano Sousa Costa 

A busca e apreensão se qualifica como importante mecanismo disponível ao Estado-investigação, no contexto da devida investigação criminal. Consiste em medida cautelar probatória, isto é, meio de obtenção de prova, diligência para angariar elementos de convicção, de modo a provar ou não a materialidade do delito e sua respectiva autoria. Essa técnica investigativa permite a coleta de meios de prova que servem de substrato para a formação do juízo das autoridades públicas que atuam na persecução penal.

Assim como as medidas cautelares em geral, a busca e apreensão depende da presença dos requisitos do fumus boni iuris (plausibilidade da medida, analisada com base na probabilidade e verossimilhança dos elementos disponíveis) e periculum in mora (risco de perecimento ou artificial modificação do cenário fático). Isso quer dizer que a procura e apossamento de bens não devem ser feitos de maneira indiscriminada, estando condicionados à presença desses pressupostos.

Se realizada no interior de domicílio, pode ser feita por autoridade própria da polícia em caso de flagrante delito ou consentimento do morador (além das situações não criminais de desastre e socorro), mas depende de autorização judicial nas demais hipóteses (artigo 5º, XI da CF).

Em que pese ser utilizada para designar a diligência como um todo, a expressão busca e apreensão não representa medida única. A busca traduz a procura de objetos de interesse da investigação criminal em pessoas, coisas ou locais; pode ser diferenciada quando realizada em pessoas e coisas (revista) ou em locais (varejamento)[1]. Já a apreensão corresponde à detenção jurídica da coisa pelo Estado, rompendo seu vínculo com o antigo possuidor ou proprietário.

Logo, é perfeitamente possível que a busca não seja sucedida de apreensão. E, como se verá em seguida, isso ocorre não apenas quando restar frustrada a diligência de localização. Num determinado contexto, o êxito da diligência reside justamente no fato de não ser encontrado objeto algum.

Com efeito, a busca e apreensão é dotada de vieses ambivalentes. Afinal de contas, nem sempre o que se deseja provar é a existência de alguma circunstância (em face da respectiva apreensão de um objeto), mas, sim, o seu oposto, a saber, a inexistência de uma situação (a partir da ausência de uma coisa). Isso significa que, além do caráter positivo, a busca e apreensão deve ser enxergada também sob o viés negativo.

Nesse sentido, busca e apreensão positiva é aquela cuja finalidade é apreender algum objeto (especialmente instrumento ou produto do crime), principalmente para (a) servir como meio de prova da materialidade e autoria; mas também para (b) permitir a satisfação dos efeitos da condenação (confisco pelo Estado, reparação da vítima e asfixia financeira do criminoso), (c) facultar a contraprova em perícia, (d) restituir o bem ao proprietário ou possuidor, ou (e) reconstituir o fato delituoso.

De outro lado, a busca e apreensão negativa é aquela que visa a não apreensão de algum objeto, a fim de demonstrar a verdade[2], que muitas vezes é descortinada na persecução penal pela ausência de determinada coisa (e não pela sua apreensão).

Considerado o panorama de busca da verdade, a busca e apreensão negativa tem objetivo não somente de (a) comprovar a existência de um crime (servir como prova da materialidade e autoria), mas também de (b) evidenciar que um delito não existiu (valer como prova da ausência de materialidade) ou que o suspeito não é o seu autor (ser útil como prova da ausência de autoria). Isso porque o inquérito policial:

É destinado a esclarecer a verdade acerca dos fatos delituosos relatados na notícia de crime, fornecendo subsídios para o ajuizamento da ação penal ou o arquivamento da persecução penal. Logo, o inquérito policial não é unidirecional e sua missão não se resume a angariar substrato probatório mínimo para a acusação[3].

A utilização da busca e apreensão de efeito negativo fica patente quando a conduta criminosa abrange o descumprimento da obrigação de guarda e zelo de determinado objeto, como, por exemplo, no crime de supressão de documento, seja ele público ou particular (artigo 305 do CP). Para se diferenciar se o autor do fato destruiu o documento (extinguindo a sua existência física) ou se somente o ocultou, há que se sacar mão da busca e apreensão. Nesse caso, em sendo encontrado o documento. Nesse mesmo jaez encontram-se os crimes do artigo 314 (extravio, sonegação ou inutilização de livro ou documento) e artigo 356 do CP (sonegação de papel ou objeto de valor probatório).

Os exemplos da utilidade da busca e apreensão negativa vão muito além de crimes afetos a documentos. Prova disso é que ela é de suma importância em uma das modalidades assemelhadas ao estelionato, qual seja, a defraudação de penhor (artigo 171, parágrafo 2º III, do CP). Note que para a configuração dessa infração penal exige-se que a coisa empenhada já estivesse na posse anterior do devedor, o qual tem o dever de guarda, e que ele disponha dela indevidamente.

Nessa esteira, parece óbvio que o auto circunstanciado da busca e apreensão (artigo 245 do CPP), no caso da busca e apreensão negativa, seja sempre preenchido fazendo constar qual era o objeto visado pela diligência que não foi ali encontrado. É dizer, o documento que materializa a diligência precisa fazer constar não só as coisas que foram efetivamente apreendidas, mas também as que eram alvo mas não foram encontradas.

Vale mencionar que essa ambivalência probatória não é exclusiva da busca e apreensão. É detectável também em alguns casos de exame de corpo de delito. Isso porque existem circunstâncias para as quais a realização do exame de corpo de delito é mais importante para comprovar que algo não aconteceu do que para provar que um fato juridicamente relevante ocorreu.

O caráter dúplice da perícia é materializado no chamado exame de corpo de delito ad cautelam, dando-se como exemplo o exame de natureza e eficiência de arma de fogo, bem como do exame de corpo de delito de lesões corporais:

Se o resultado dessa perícia for negativo em relação à eficiência da arma apreendida na posse do suspeito, isso indicará que talvez não tenha sido ele o autor de tais disparos ou não tenha sido essa a arma utilizada. É isso que chamamos de ambivalência probatória do exame pericial. Ou seja, se o intento era provar algo, com a não comprovação pericial da circunstância almejada, passou-se a dar força à tese contrária. Foi com base nessa peculiaridade que o exame de corpo de delito de lesão corporal acabou dando origem ao exame de corpo de delito ad cautelam. (…) Com o passar do tempo, foram os próprios condutores do preso que passaram a requerer a expedição de tal exame, mesmo que não houvesse qualquer indício de violência policial. Tal exame, então, passou a ser um instrumento para o policial se defender de uma enxurrada de denúncias falsas sobre abuso policial[4].

Importante grifar que não há uma dependência absoluta da busca e apreensão negativa como prova da inexistência de um objeto ou mesmo a sua substituição. Isso porque, em tendo desaparecido os vestígios, é perfeitamente possível que outro meio de prova (como a testemunhal) supra tal lacuna (artigo 167 do CPP), exceto se o próprio Estado tiver dado causa ao desaparecimento[5].

Em conclusão, ao ser enxergada sob espectros diferentes (tanto positivo como negativo), a busca e apreensão se torna um mecanismo ainda mais útil à busca da verdade na persecução penal, especialmente em sua primeira etapa presidida pelo delegado de polícia (artigo 6º, III do CPP e artigo 2º, parágrafo 2º da Lei 12.830/13).

[1] PITOMBO, Cleunice Bastos. Da busca e apreensão no processo penal. São Paulo: RT, 2005, p. 96.

[2] HOFFMANN, Henrique. Polícia Judiciária e garantia de direitos fundamentais. In: HOFFMANN, Henrique. et al. Investigação Criminal pela Polícia Judiciária. 2. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2017, p. 2-6.

[3] HOFFMANN, Henrique. Moderno conceito de inquérito policial. In: FONTES, Eduardo; HOFFMANN, Henrique (Org.). Temas Avançados de Polícia Judiciária. 2. ed. Salvador: Juspodivm, 2018, p. 25-30.

[4] COSTA, Adriano Sousa; SILVA, Laudelina Inácio da. Prática policial sistematizada. Niterói: Impetus, 2016, p. 200-202.

[5] STJ, AgRg no REsp 1.300.606, rel. min. Rogério Schietti Cruz, DJ 7/3/2017.

Sobre os autores:

 

Henrique Hoffmann é delegado de Polícia Civil do Paraná. Professor do Cers, da Escola da Magistratura do Paraná, da Escola da Magistratura do Mato Grosso, da Escola Superior de Polícia Civil do Paraná e do Senasp. Colunista da Rádio Justiça do STF e autor e coordenador do Juspodivm. Mestre em Direito pela Uenp. www.henriquehoffmann.com


Adriano Sousa Costa
é delegado de Polícia Civil de Goiás, mestre em Ciências Políticas pela UFG e professor da Escola Superior da Polícia Civil de Goiás, do Senasp e do Cers. Membro da Academia Goiana de Direito.

 

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