MG: Delegacias abertas à noite e nos fins de semana: o plantão virtual
A atual gestão da Polícia Civil mineira pode implantar uma antiga reivindicação de moradores das cidades que não contam com delegacias abertas à noite e nos fins de semana: o plantão virtual. A corporação estuda colocar em prática a medida, que pode evitar o deslocamento de policiais militares para o registro da ocorrência em municípios vizinhos. A informação é do chefe da Polícia Civil, delegado Wagner Pinto de Souza, no cargo desde janeiro.
Aos 54 anos, sendo 32 deles dedicados à atividade policial, o gestor atuou em diversos departamentos. Só no de Homicídios foram quase três décadas. Com a experiência acumulada nesse tempo, Souza espera contribuir para a melhoria da instituição, principalmente em um cenário de escassez de recursos humanos e logísticos. Confira nesta entrevista exclusiva ao Hoje em Dia, como o delegado pretende enfrentar os desafios.
Há quatro meses como chefe da Polícia Civil no Estado, qual tem sido o principal desafio?
A escassez de recursos humanos, logísticos e de ferramentas é grande em razão das demandas que temos. O desafio maior é justamente buscar capacitação gradativa do servidor e minimizar as deficiências estruturais e humanas.
É um trabalho de pressão da base e do governo…
Sem dúvidas. O chefe da Polícia Civil tem status de secretário de Estado e é um elo entre o governo e a base. Ressalto que estou chefe da Polícia Civil, mas sou delegado. Meu objetivo é representar com excelência a instituição. Busco apoios, os entendimentos político, gerencial e integração com outras secretarias pelo governo.
Dentre essa articulação está previsto o aumento do efetivo na corporação?
O quadro ideal seria de 17,5 mil policiais. Hoje, entretanto, temos 9 mil. Mas, mesmo diante das adversidades, o governo do Estado tem se esforçado. Para começar, nos autorizou a nomear 76 delegados aprovados em concurso público, que aguardam serem chamados. Os atos de nomeação devem ocorrer nos próximos dias. Já nesta semana iremos abrir um concurso para 119 escrivães. Outra novidade é que o governador autorizou a nomeação, dentro da Lei de responsabilidade Fiscal, do excedente de investigadores que foram aprovados em outro concurso. Isso é um alento.
A implantação recente do Núcleo Especializado de Investigação a Feminicídios em BH é o pontapé para a iniciativa em todo o Estado?
Desejamos expandir para todas as cidades de Minas Gerais. Entretanto, a escassez de recursos humanos depõe contra o projeto neste momento. Mas isso não impede que a investigação seja feita pelas delegacias de base, de Mulheres e de Homicídios espalhadas pelo Estado.
O número de delegacias de plantão, inclusive, sempre foi um desafio no Estado…
Os plantões consomem um quantitativo considerável de policiais civis, o que prejudica o trabalho investigativo. Estamos estudando implantar o plantão audiovisual, a videoconferência, o que seria um avanço. A ideia é termos uma central, onde delegados e escrivães estariam lotados para atender a todo o Estado. Por exemplo, uma central em Uberaba (Triângulo) poderia resolver as demandas à noite e nos fins de semana em Uberlândia (também na região) e em Passos (Sul de Minas). Essa proposta reduziria o número de policiais nos plantões. Dessa forma, poderíamos direcioná-los para outras atividades, como investigação, aprimorando o atendimento à população.
Novas tecnologias podem ser agregadas nas investigações para otimizar inquéritos?
Em contrapartida para o trabalho que a Polícia Civil está realizando em decorrência do rompimento da barragem em Brumadinho, a Vale vai fornecer, de forma permanente, dois equipamentos que irão para o IML (Instituto Médico-Legal). Um é o Biomech I5, um robô de extração automatizada de DNA. No Brasil, somente a Polícia Civil mineira terá. O outro é o Next Generation Sequencing. Esse equipamento faz o mapeamento de formas muito deterioradas, como as que estamos encontrando agora em Brumadinho.
Além da tecnologia, como está sendo o aprimoramento na formação de investigadores no Estado?
Esse é um ponto preponderante na nossa administração. Tivemos um intercâmbio com a polícia francesa, na Academia de Polícia, para buscar novas técnicas na investigação de homicídios. No ano passado, participamos de apuração de crimes de narcotráfico e também fizemos intercâmbios com o FBI (polícia federal dos Estados Unidos).
Com todo esse aprimoramento, será possível identificar todos os corpos de vítimas da tragédia em Brumadinho?
Ainda faltam aproximadamente 30 corpos para serem identificados. Até agora já foram reconhecidos 241. O trabalho é exaustivo. Com o passar do tempo, a probabilidade de encontrar todos os corpos vai diminuindo. Acredito que alguns cadáveres ficarão sem a localização e a identificação. Mas o percentual nosso é muito alto. Neste último estágio de identificação estamos trabalhando com DNA, e, às vezes, até no DNA pode-se ter prejuízo pelo fato de o material estar totalmente deteriorado.
O inquérito está perto de ser concluído?
Existe um trabalho feito em conjunto pelo Departamento de Meio Ambiente e o Ministério Público para apurar quais são os responsáveis daquela tragédia. O trabalho está sendo muito bem apurado e chegaremos a todos os responsáveis por essa barbárie.
Há risco de impunidade?
Acredito que não. O trabalho da polícia é definir quem são os responsáveis, e é o que vamos fazer. A parte da ação penal do julgamento compete à Justiça.
Recentemente, Sonny Clay, considerado o maior traficante de Minas Gerais, foi preso durante uma partida de futebol em Ouro Preto, na região Central de Minas. Ele atuava livremente no time amador. Por que criminosos atuam sem medo de punição?
Posso indicar dois fatores. Primeiro, o criminoso nunca acredita que será capturado. Ele acredita que cometeu o crime perfeito, que conseguiu ludibriar a ação policial. O segundo ponto é a impunidade, porque às vezes o indivíduo comete o crime e demora anos para ser processado e julgado. Sem punição, comete outro e cai na reincidência. Às vezes, o indivíduo tem quatro, cinco, seis crimes e não foi condenado por nenhum. Dessa forma, então, cai na “vala comum”.
Crimes cibernéticos, inclusive, aumentaram porque o bandido acredita que nunca será preso. A investigação desses delitos ainda exigem mais preparo da polícia?
Temos delegacia especializada, muito bem equipada, com policiais altamente preparados e capacitados, que fizeram curso para fazer esse tipo de trabalho. Agora, a demanda é muito alta. Temos uma barreira que são os provedores internacionais das redes. Às vezes, as informações que precisamos de forma célere demoram a chegar, isso quando chegam. E a demanda é tão alta que é humanamente impossível apurar todos os casos.
Belo Horizonte é uma das cidades brasileiras que receberão a Copa América, no próximo mês. Esse evento representa grandes desafios?
Fizemos um planejamento estratégico para a Copa América juntamente com todas as estruturas de segurança e a Superintendência de Investigação e Polícia Judiciária. Nós aproveitamos o knwo-how das Copas do Mundo e das Confederações, além dos Jogos Olímpicos, em que participamos com excelência.
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