Como evitar que pessoa conduzida à delegacia seja colocada na cela?

A cela é o espaço físico destinado a indivíduos que estão privados de sua liberdade, seja por captura, apreensão, detenção, prisão civil, prisão preventiva, prisão temporária ou prisão definitiva. Os efeitos de ser colocado em uma cela, mesmo que temporariamente, são profundamente constrangedores. A pessoa presa, ainda que legalmente, enfrenta um impacto psicológico e social significativo. Além da perda imediata da liberdade, o indivíduo sofre com a estigmatização, o que pode prejudicar suas relações pessoais e profissionais. A cela, como local de confinamento, impõe ao detido uma condição de vulnerabilidade e de exposição a situações degradantes, potencializando o sentimento de humilhação.

No contexto da prisão legal, onde há fundamentos jurídicos para a detenção, o constrangimento não é menor. A experiência de estar em uma cela pode ser traumática, causando danos emocionais duradouros. Este cenário evidencia a importância de considerar alternativas à detenção em casos onde a legislação permite.

É nesse ponto que a atuação do advogado ou qualquer outra pessoa interessada, como um familiar do preso, torna-se essencial. Além disso, o ambiente carcerário pode expor o indivíduo a condições de higiene precárias e a interações com outros detidos, potencialmente perigosos, exacerbando o estresse e o medo. Assim, a permanência na cela não apenas afeta o estado mental do detido, mas também pode ter implicações físicas e de saúde, o que torna ainda mais urgente a busca por soluções alternativas à prisão.

Quando uma pessoa procura evitar que seu familiar seja colocado em uma cela deve demonstrar ao delegado de polícia a desnecessidade dessa medida extrema. Existem alguns argumentos específicos que podem convencer o delegado para não deixar uma pessoa na cela.

Nos casos de crimes de menor potencial ofensivo, definidos como aqueles cuja pena máxima não ultrapassa dois anos de prisão, e nas contravenções penais, a lei permite a elaboração do Termo Circunstanciado de Ocorrência (TCO). O TCO é um procedimento simplificado que, ao ser assinado pelo suspeito com o compromisso de comparecer ao Juizado Especial Criminal (JECRIM), possibilita sua liberação imediata.

Para convencer o delegado de polícia, o advogado ou qualquer pessoa interessada, deve argumentar que a colocação do suspeito em uma cela é desnecessária e desproporcional, uma vez que o suspeito pode assumir o compromisso de comparecer ao JECRIM. Este compromisso, firmado através da assinatura no TCO, garante que o suspeito estará presente para responder judicialmente pelo ato praticado, sem a necessidade de sofrer o constrangimento de ser colocado no ergástulo.

A atuação do advogado, ou mesmo de um membro da família com conhecimento jurídico, deve focar na apresentação de argumentos sólidos e fundamentados na legislação vigente. É essencial destacar que a lei prevê a possibilidade de liberação imediata do suspeito, mediante a assinatura do termo de compromisso, o que preserva sua dignidade e integridade moral. O advogado pode, inclusive, solicitar que o delegado determine a coleta da assinatura do suspeito no termo de compromisso de comparecimento ao JECRIM no início do procedimento, como forma de justificar a não colocação do suspeito na cela, criando, assim, um documento hábil que informa isso.

Além disso, é importante que o advogado ou outra pessoa interessado demonstre ao delegado que manter o suspeito em um local alternativo dentro da delegacia, enquanto o TCO é lavrado, não compromete a segurança do procedimento. Essa abordagem, além de ser mais humana, está em consonância com os princípios de dignidade da pessoa humana e de proporcionalidade, que regem o direito penal brasileiro.

Contudo, deve-se considerar que o delegado de polícia possui discricionariedade para decidir sobre a colocação ou não do suspeito na cela. O delegado não é obrigado a atender a pedido para não colocar o suspeito na cela, especialmente se houver motivos justificados para o seu recolhimento. Até por que, o parágrafo único, do art. 69, da Lei 9.099/95, disciplina que a assunção do compromisso de comparecer ao JECRIM ocorrerá após o término do TCO, e somente a partir daí o investigado será solto.

Comportamentos agressivos, resistência à prisão, uso de algemas, agitação por parte do suspeito ou a recusa em assinar o termo de compromisso de comparecimento ao JECRIM são razões legítimas para o delegado optar para seu recolhimento na cela. A decisão do delegado visa garantir a ordem e a segurança na delegacia, além de assegurar que o suspeito estará presente para os procedimentos legais subsequentes. Se o delegado identificar que o suspeito representa um risco ou se não há garantia de que ele cumprirá o compromisso de comparecer ao JECRIM, a medida de colocação na cela pode ser justificada.

Embora o advogado ou alguém possa apresentar argumentos sólidos e buscar alternativas à detenção em cela, deve-se ter em mente que a decisão final cabe ao delegado de polícia. A colaboração do suspeito e seu comportamento durante o processo são elementos decisivos que influenciam essa decisão. O advogado deve, portanto, orientar seu cliente sobre a importância de cooperar com as autoridades e assinar o termo de compromisso. Isso se aplica ao familiar perante seu ente.

Os fundamentos apresentados acima também podem ser usados em casos de crimes afiançáveis pelo delegado de polícia, com pena de até 4 anos de prisão, conforme o art. 322, do Código de Processo Penal, onde, a depender do valor da fiança e da condição de quem vai pagar, o interessado poderá sugerir ao delegado de polícia, em casos pontuais, a evitar a colocação do investigado dentro de cela, pois já se tem informação de que a fiança será paga, não havendo necessidade de recolher o investigado na cela

Dessa forma, o advogado, interessado ou familiar poderão usar as seguintes frases de convencimento para o delegado:

  • Crimes de menor potencial ofensivo ou contravenção penal (TCO):

“Sr. Delegado, seria possível avaliar o comportamento atual do investigado (conduzido) e viabilizar agora a assinatura do investigado para assumir o compromisso de comparecer ao JECRIM e assim evitar que o investigado seja colocado na cela? (art. 69, parágrafo único, da Lei 9.099/95).

  • Crimes afiançáveis pelo delegado de polícia – pena de até 4 anos de prisão (APFD):

“Sr. Delegado, seria possível avaliar o comportamento atual do investigado (conduzido) e viabilizar agora a emissão do termo de arbitramento de fiança e forma de pagamento para, assim, evitar que o investigado seja colocado na cela?”

A habilidade do advogado, interessado ou familiar em articular bem seus argumentos e conhecer profundamente os dispositivos legais aplicáveis pode ser determinante para evitar que seu cliente seja colocado em uma cela. A defesa deve ser pautada na legalidade, razoabilidade e humanidade, assegurando que os direitos do suspeito sejam preservados, mesmo em situações de conflito com a lei. No entanto, é essencial reconhecer a discricionariedade do delegado e a importância de garantir a segurança e a ordem durante os procedimentos policiais.

Legislação Classificada

Lei 9.099/95

Art. 69. A autoridade policial que tomar conhecimento da ocorrência lavrará termo circunstanciado e o encaminhará imediatamente ao Juizado, com o autor do fato e a vítima, providenciando-se as requisições dos exames periciais necessários.

Parágrafo único. Ao autor do fato que, após a lavratura do termo, for imediatamente encaminhado ao juizado ou assumir o compromisso de a ele comparecer, não se imporá prisão em flagrante, nem se exigirá fiança. Em caso de violência doméstica, o juiz poderá determinar, como medida de cautela, seu afastamento do lar, domicílio ou local de convivência com a vítima.

Código de Processo Penal

Art. 322.  A autoridade policial somente poderá conceder fiança nos casos de infração cuja pena privativa de liberdade máxima não seja superior a 4 (quatro) anos. 

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