Em julgado impactante em vários aspectos, o STF invalidou a exigência de autorização do Tribunal de Justiça do Estado de Goiás para concessão e execução de medidas cautelares contra autoridades com prerrogativa de foro no Estado de Goiás.
Por unanimidade, o Supremo Tribunal Federal (STF) invalidou norma da Constituição do Estado de Goiás que exigia autorização colegiada do Tribunal de Justiça local (TJ-GO) para medidas cautelares em inquéritos e ações penais contra autoridades. A decisão se deu na sessão virtual encerrada em 21/6, no julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 7496, ajuizada pela Associação dos Delegados de Polícia do Brasil (Adepol do Brasil) através do jurídico da entidade, liderada pelo advogado Dr. Ophir Cavalcante.
A regra, inserida na Constituição estadual pela Emenda 77/2023, passou a exigir decisão do Órgão Especial do TJ-GO, por maioria absoluta, para apreciar pedidos cautelares (prisão preventiva, busca e apreensão e bloqueio de bens, entre outros) no curso de procedimentos criminais contra autoridades que têm foro especial na corte local, como deputados estaduais e prefeitos.
Em seu voto pela procedência do pedido, o eminente relator, ministro Dias Toffoli, afirmou que a competência para legislar sobre o tema é da União, e, portanto, a Constituição estadual não poderia regular o foro por prerrogativa de função diversamente dos limites estabelecidos no modelo federal.
Ainda segundo ele, a exigência de deliberação prévia de órgão colegiado do TJ-GO viola o entendimento do STF de que o relator pode apreciar monocraticamente as medidas cautelares penais requeridas na investigação ou na instrução processual. Além disso, a regra viola o princípio da isonomia, pois dá às autoridades de Goiás uma garantia diferenciada e mais ampla que a assegurada aos demais detentores da prerrogativa, sem um fundamento idôneo que a justifique. Para o Exmo. Ministro Toffoli, a norma vai de encontro à jurisprudência constitucional e ignora toda uma linha histórica de precedentes sobre a matéria.
A decisão da Corte estabelece que a norma da Constituição de Goiás deve ser interpretada de forma a permitir que desembargadores apreciem individualmente as medidas cautelares penais requeridas durante a fase de investigação ou no decorrer da instrução processual nos casos de urgência. A mesma interpretação deve prevalecer quando for necessário sigilo para assegurar a efetivação da diligência pretendida. Por fim, o ministro explicou que fica ressalvada a obrigatoriedade de referendo pelo órgão colegiado competente em momento oportuno, especialmente quando resultar em prisão cautelar, mas sempre sem comprometer ou frustrar sua execução da medida.
AMPLIAÇÃO DA LEGITIMIDADE ATIVA DA ADEPOL DO BRASIL EM CONTROLE CONCENTRADO DE CONSTITUCIONALIDADE
No mesmo julgado, à unanimidade, a corte decidiu que “Conforme a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, a Associação dos Delegados de Polícia do Brasil (ADEPOL BRASIL) possui legitimidade ativa ad causam para a propositura de ação de controle
concentrado, nos termos do art. 103, inciso IX, da Constituição Federal,não apenas para o questionamento de questões funcionais, mas também para impugnar normas de caráter processual penal, desde que afetas às atividades de investigação ou às atribuições dos delegados de polícia, ou da polícia judiciária, repercutindo no espectro de atribuições da categoria representada”, demonstrando a importância republicana da ADEPOL DO BRASIL para a jurisprudência do país em matérias relacionadas a segurança pública em nível mais amplo, reconhecendo-se uma pertinência temática mais abrangente da ADEPOL DO BRASIL para propositura de ações no STF.
Acrescentou o relator quanto a este ponto, seguido à unanimidade pelos demais Ministros: “na esteira da jurisprudência da Corte, que vem reconhecendo a legitimidade ad causam da entidade requerente não apenas para o questionamento de questões funcionais da categoria, mas também para impugnar normas que repercutam em seu espectro de
atribuições”…
RECONHECIMENTO DO ALCANCE E DA CONSTITUCIONALIDADE DE DISPOSITIVOS DA LEI ORGÂNICA NACIONAL DAS POLÍCIAS CIVIS: LEI 14735/2023
O relatório do eminente Ministro Dias Tofolli avalizou e reconheceu a constitucionalidade e relevância de inúmeros dispositivos relativos às prerrogativas dos delegados de polícia reconhecidas na Lei 14735/2023 – Lei Orgânica Nacional das Polícias Civis.
Neste contexto, decidiu o STF que “obviamente, uma das principais prerrogativas da autoridade policial é a atividade de investigação e, por consequência, o respectivo
procedimento investigatório, bem como seu maior interesse é o de zelar pela efetividade das diligências investigativas determinadas (ou requeridas, quando se tratar de matéria sob reserva de jurisdição, e nas hipóteses de foro por prerrogativa de função, sempre sob autorização e supervisão do respectivo relator).
Nesse sentido, aliás, é o comando que se extrai do disposto no art. 26 da novel Lei nº 14.735, de 23 de novembro de 2023:
“Art. 26. O delegado de polícia, além do que dispõem as normas constitucionais e legais, detém a prerrogativa de direção das atividades da polícia civil, bem como a
presidência, a determinação legal, o comando e o controle de apurações, de procedimentos e de atividades de investigação
.
Parágrafo único. Cabe ao delegado de polícia presidir o inquérito policial, no qual deve atuar com isenção, com autonomia funcional e no interesse da efetividade da tutela
penal, respeitados os direitos e as garantias fundamentais e assegurada a análise técnico-jurídica do fato.”
Desse modo, reputo caracterizado o interesse específico e próprio da categoria profissional dos delegados de polícia do Brasil, motivo pelo qual reconheço o vínculo de afinidade temática entre o objeto desta ação direta e os objetivos institucionais da entidade requerente”.
Na decisão cautelar que suspendeu os efeitos da EC 77 do Estado de Goiás no âmbito desta ADI , o Ministro Dias Tofolli já reconhecera a relevância do princípio do livre convencimento técnico – jurídico do Delegado de Polícia trazido pela Lei Orgânica Nacional das Polícias Civis no seu artigo 4°, inciso VIII.
LIMITES CONSTITUCIONAIS À COMPETÊNCIA LEGIFERANTE DOS ESTADOS EM MATÉRIA PROCESSUAL PENAL
Uma praxis padrão nos Estados da Federação é a tentativa de certos Governadores, por fatores políticos e eleitorais, buscarem normatizar no âmbito estadual matérias inerentes a direito processual penal, cuja competência privativa da União está delineada no artigo 22, I , da Constituição Federal.
No julgamento da ADI 7496, novamente assim se pronunciou à unanimidade os ministros do STF: ” Com efeito, nos termos do art. 22, inciso I, da Constituição Federal, compete privativamente à União legislar sobre direito penal e processual penal, razão pela qual não poderia a Constituição do Estado-membro, ao
enumerar as competências do Tribunal de Justiça Local e, mais especificamente, ao regular o foro por prerrogativa de função, dispor diversamente ou desbordar dos limites estabelecidos no modelo federal “.
A ADEPOL DO BRASIL assevera que continuará a impugnar junto ao STF exorbitâncias legislativas nos Estados que invadam a competência privativa da União em legislar sobre Processo Penal, deplorável realidade que se verifica nas políticas demagógicas de segurança pública de alguns entes federados.
Parabenizamos nosso jurídico representado pelo Dr Ophir Cavalcante pelo trabalho destacado e a parceria essencial do SINDEPOL – GO , presidida pelo sempre abnegado Dr Adriano Sousa, na construção da demanda que resultou nesse julgado altamente relevante para as polícias judiciárias no Brasil.
Abaixo, acórdão publicado da ADI 7496:
Adepol do Brasil
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