Secretária de Segurança de Santos desde o final do mês passado, Raquel Gallinati tem buscado mostrar contundência nas falas e nas ações. De um plano estratégico de ação, iniciado pela criação de uma zona de segurança máxima na orla, à presença em incursões como a realizada no túnel do VLT, no José Menino, na última quarta-feira. Na pauta, um trabalho conjunto com outras secretarias e para as mulheres que sofrem com violência.
Com pouco menos de um mês no cargo, deu para fazer um raios X de quais são as principais necessidades?
Sim. Primeiro, eu consegui observar que a gente tem uma estrutura muito boa na Secretaria de Segurança. O que a gente precisa é mudar a estratégia, porque ciclos são necessários. E não significa não concordar com o que estava sendo feito. É simplesmente uma mudança de estratégia. E a gente vai focar, principalmente, na sensação total de segurança da população. Começamos já pela orla, a zona máxima de segurança. Claro que a gente tem que fazer ajustes, mas começamos a aumentar a ronda da Polícia Municipal (a Guarda). A gente tem, sim, como foco os moradores de rua que estão ali abandonados, misturados com criminosos. Os vulneráveis socialmente não são uma responsabilidade da polícia, mas transversal. Na última sexta, tivemos uma conversa com as secretarias de Saúde e Assistência Social, e nós teremos atuações conjuntas, para a solução do problema. A gente atua de forma estritamente legal, mas em apoio às forças de segurança, em apoio às pastas, queremos achar soluções legais, viáveis e fáticas. É algo que incomoda muito o santista. Vulneráveis sociais que colocam em risco até eles mesmos. Porque, muitas vezes, estão despidos de autodiscernimento. Praticam pequenos furtos, colocam a população nessa sensação de insegurança, a não querer passar em determinados locais. E não que a gente veja que eles devem ser responsabilizados, punidos criminalmente. O Estado não pode abandonar essas pessoas.
Como pensa essa atuação? Ela é amparada em que tipo de princípios?
O que a gente mais foca é uma atuação legalista, para que a gente possa proteger a população dentro dos limites legais. A atribuição da PM prevista no Artigo 144 (da Constituição Federal), militar, é a polícia ostensiva preventiva; a Polícia Civil é a polícia investigativa, aquela que desmantela, desbarata facções e organizações criminosas; e a polícia municipal — eu falo polícia municipal porque o STF (Supremo Tribunal Federal), em março, já reconheceu a atuação de apoio à Polícia Militar, na prevenção da incolumidade pública, na prevenção da ordem pública, inclusive em encaminhamento de flagrante de criminosos que tenham praticado algum crime flagrante, a legalidade. Temos o respaldo do STF na atuação. Foi aprovada, na CCJ (Comissão de Constituição e Justiça) do Senado, a PEC (Proposta de Emenda à Constituição) 37, para o reconhecimento da Guarda Municipal como Polícia Municipal. Isso tem como consequência direta o reconhecimento de direitos, inclusive previdenciários, daqueles que estão sendo permanentemente um escudo entre o crime e a sociedade: insalubridade, periculosidade, todos os aspectos de legitimar e, principalmente, dar justiça àquela atuação policial da nossa Polícia Municipal.
A escolha da orla como primeira zona de segurança máxima foi proposital?
Foi em relação à estratégia de incursão. Fizemos, na quarta-feira, uma operação em um local de que também a população reclama, no José Menino, no túnel do VLT. Inclusive ali, por mais que haja essas ações, se não houver o apoio em conjunto dessa conversa transversal, a solução não fica efetivada. Porque as esferas são várias, e a Guarda Municipal não tem o poder de tirar alguém e direcionar obrigatoriamente a um abrigo, mas em conversa, assistência social ou aquele médico atestando, ele pode falar: “Nossa, é necessário um cuidado para você”. Então, a gente precisa, e a gente está agindo de acordo com as nossas atribuições.
Ela tem um prazo para acontecer? A zona vai funcionar em determinado período? Vai ser feita em outros locais?
O prazo ideal existe, mas a gente sabe que a prática não corresponde. As situações, quando são colocadas na prática, a gente tem que realmente trabalhar de forma incessante para ver algum resultado. Pode vir de forma imediata ou ele pode demorar um pouco, mas que o resultado virá, isso é fato.
Já tem uma ideia de quais outras áreas poderiam receber essa zona?
A Cidade toda a gente vai ter esse tipo de cuidado. A gente está atuando com câmeras, a gente está atuando com a muralha paulista, em conjunto com o monitoramento do CCO, com os homens, com a ronda. É um conjunto, porque hoje a gente tem tecnologia na investigação, no combate ao crime. Temos condições de facilitar e viabilizar e dinamizar o trabalho policial como um todo, inclusive para fornecimento de informações não só para polícia, Poder Judiciário, Ministério Público. O que a gente está é focando as estratégias em pontos que a gente vê que poderiam estar fragilizados para que a gente possa realmente dar uma potencialidade, uma atenção. E a gente tem câmeras na Cidade toda. Mais 1,5 mil serão instaladas.
No dia 25, o prefeito (…) falou na possibilidade de uma base fixa da GCM. Como está isso?
O que a gente tem já são viaturas fixas ali no Emissário (Submarino, no José Menino). A gente já tem ronda ali, Intensificamos a ronda ali, inclusive com a Rocam, que são as motos da Guarda Municipal.
A senhora sempre enfatiza o fato de ser delegada. No que a sua expertise nessa função a está ajudando e vai ajudar no seu trabalho na Secretaria de Segurança?
Principalmente em estratégias no combate ao crime. Claro que a gente tem que fazer, sim, uma saturação. Quando a gente fala em policiamento sensível e preventivo, também é no apoio à Polícia Militar. Quando a gente tem uma atuação no trabalho de investigação, sabe o que é necessário também para o auxílio da Polícia Civil. Então, a gente se colocou à disposição da Polícia Civil também nesse trabalho investigativo, de apoiar a Polícia Civil, quando necessário, em algumas ações. A gente tem um aparato muito rico aqui, tanto no Centro de Controle Operacional, quanto a gente tem também a intersecção com a Polícia Civil ou com a Muralha Paulista, através de informações e dados, monitoramento. Isso é muito importante, é muito rico também, para prevenir, para antecipar a prática de crimes.
Isso também passa por treinamentos e capacitação?
Eu acho interessantes também o fortalecimento e a valorização dos policiais municipais em treinamentos constantes, não só treinamento físico, por exemplo. Acho necessários para uma força policial a arte marcial, o treinamento de combate em relação a armas, mas também, cursos teóricos em relação aos limites constitucionais e legais. Então, a gente tem que atuar e sempre reciclar o policial e dar atenção ao policial, porque ele é o mais importante em toda essa estrutura da circunferência de segurança pública. Então, este é o meu olhar: de que a polícia, a Guarda Municipal funcionam porque tem um policial ali fazendo a sua missão.
E quais as principais características que esses policiais carregam, que cabem também aos GCMs, por exemplo?
Não existe nenhuma situação, nenhuma instituição, nenhum local público ou privado, organização, uma identidade única de potencialidade ou de atribuições daqueles que têm as suas excelências nas práticas. O que pode melhorar é pegar a excelência de cada policial e aproveitar ao máximo. Assim, não se desperdiça o potencial daqueles que têm as suas atribuições, e a gente melhora sem nenhum impacto. Só se reorganizam ali as atribuições e as funções. A ideia é fazer com que, dentro do grupo, se entenda a característica de cada um e de que forma ele pode ser melhor aproveitado.
Há previsão de realização desses cursos?
Já, agora em agosto. O convênio já foi celebrado, e teremos grupos de operações especiais que vão ministrar cursos para os nossos policiais aqui em Santos. Não vai ser obrigatório, claro. Mas, para quem tem aptidão para um curso teórico ou outros tipos de excelências, a gente vai incentivar.
Como avalia o monitoramento por câmeras da Cidade? Está satisfatório ou pode ser melhorado?
Existe, já, um monitoramento de toda a Cidade. Mais câmeras estarão instaladas para que a gente tenha uma cobertura mais do que completa, sem contar que temos drones e o policiamento dos guardas municipais. Toda a Cidade está monitorada.
A senhora se faz presente nas ações. Por que a senhora acha isso importante?
Existem muitas situações que só serão viabilizadas se você souber fazer. Então, muitas se tornam inócuas porque existe um comando inócuo. Claro que na minha experiência, também, de sempre trabalhar em plantões das regiões periféricas de São Paulo, como representante dos delegados de polícia no âmbito do Estado, visitei todas as 70 seccionais, falei em loco com os colegas. Então, faz parte do meu trabalho estar in loco. É muito importante a gente ter um conhecimento muito rico, teórico, mas nada supre a prática, a visão, o contato. E esse é o meu estilo de trabalho. Tenho esse planejamento estratégico, mas também vou no front para estar junto com os policiais municipais. Temos que ter amplo conhecimento legal, vasto conhecimento legal para os limites da atuação. E algo que outras carreiras jurídicas, no caso, falando da polícia judiciária, não requerem, é uma atuação prática. Você tem que ter o conhecimento prático de uma neutralização do inimigo, por exemplo. Então, mais do que tudo, eu acho que, quando a gente encara com amor aquilo que a gente exerce, não vê que a gente está trabalhando, porque é algo que a gente faz por amor, por gostar.
A questão da violência contra a mulher é uma pauta recorrente no seu trabalho. Como é que dá para a Secretaria de Segurança agir nesse tema?
Na quinta, tive uma reunião com a nossa vice-prefeita (Renata Bravo, PSD) e a secretária da Mulher (Larissa Paz). Levei para elas ideias em relação ao que a gente pode auxiliar para as mulheres vulneráveis e vítimas de violência, não só no contexto doméstico e familiar, mas como um todo. Vou usar o meu conhecimento e ajudar essa pasta, porque, sendo mulher combatendo o crime, é inevitável que eu também tenha como causa o combate ao crime aos vulneráveis. Não é uma causa exclusiva de mulher, é uma causa, sobretudo, de direitos humanos.
Sempre existiu um olhar mais machista de uma parcela da sociedade, de que a mulher não poderia “aparecer demais”. E a senhora ganha bastante visibilidade por se fazer presente em diversas tribunas. Como é que faz para esse tipo de situação, não dar munição a eventuais haters?
Não fico muito focada em hater. Não tenho muito problemas com críticas. Meu propósito é fazer algo de positivo para uma parcela de pessoas, para que eu possa mudar algumas situações. Quando você combate o crime, obviamente, o criminoso não gosta. Quando você refuta aqueles que agridem mulheres, os que minimizam atos de agressão, romantizam e normalizam, estão coniventes com atos de agressão contra a mulher. Os que tentam minimizar, deslegitimar o lugar de fala em que ela quer estar, são boçais. Então, não me preocupo com situações em que existem críticas. Algumas não são verdadeiras, mas para que você pare de atuar. Eu faço com convicção, eu faço porque é a minha obrigação como meta de vida. Cada entrevista em que eu falo, cada pessoa que eu atinjo, cada vida que eu salvo, já valeu a pena em relação a mil críticas que vieram.
O prefeito enfatizou, quando da sua chegada, o aval do governador Tarcísio de Freitas (Republicanos). O que representa para a senhora? E o que imagina em 31 de dezembro, quando terminar o atual mandato, para considerar como missão cumprida?
Eu fiquei muito honrada com o convite para voltar depois de 30 anos para minha Cidade, em que eu vivi de 1 aos 8 anos, mas voltar de uma forma mais presente. Porque, nestes 30 anos, eu tenho meus amigos, tenho minha família, tenho minha mãe, meu irmão, meu sobrinho, as pessoas que eu mais amo no mundo, nesta cidade de Santos, na minha cidade do coração. Então, imagine, depois de 30 anos, toda a bagagem que você faz, toda a sua missão de vida que você faz, que é combater o crime, impulsionando propostas de projeto de lei para ampliar a atuação policial, para ampliar a resposta da certeza do castigo para aqueles que praticam crime. E você ter a oportunidade de tudo aquilo que você vivenciou, tanto na prática, como de forma teórica, poder retribuir para sua cidade do coração, que as pessoas que você mais ama estão nesta cidade, pra mim é uma honra imensurável. E eu espero, dia 31 de dezembro, estar só no início de um ciclo, de uma missão que eu terei de forma permanente na nossa cidade de Santos.
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