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MP não pode obrigar testemunha a depor

por MARCELO FERNANDES DOS SANTOS

JURÍDICO

O Ministério Público não pode obrigar testemunha a depor por meio de uso de força policial a não ser com autorização judicial. Com esse entendimento, o Tribunal de Justiça da Bahia concedeu Habeas Corpus preventivo a uma testemunha que recebeu notificação do MP estadual, informando que deveria prestar depoimento. Caso contrário, seria levada a força para a Promotoria. Para o TJ baiano, o MP causou constrangimento ilegal com essa atitude.

O caso aconteceu em Salvador, em uma mistura infeliz de situações. Rosana Kauark, moradora de um condomínio na cidade, entrou com uma ação judicial para que a Prefeitura tomasse medidas para eliminar focos de dengue nos arredores do bairro de Piatã, onde mora. A 8ª Vara de Fazenda Pública da Capital expediu alvará exigindo providências da administração municipal, inclusive o aterramento de uma “lagoa” na área.

A 5ª Promotoria do Meio Ambiente de Salvador pediu a revogação da decisão, que interferia em dois inquéritos civis ligados a construções de estradas na região, suspeitas de invadir áreas de preservação ambiental. Isso motivou o juiz Everaldo Amorim, da 8ª Vara, a pedir um laudo pericial. O parecer mostrou que a “lagoa” não passava de “água acumulada”. A decisão foi mantida.

Kauark foi então intimada pelo MP a depor a respeito dos dois inquéritos civis ligados às estradas. “A referida audiência tem por objetivo prestar depoimento (sic) referente a possíveis danos e crimes ambientais em razão de obras de terraplanagem”, segundo a notificação. No documento, é feita menção ameaçadora de “condução coercitiva”.

Segundo o advogado de Kauark, Cláudio Andrade, do escritório Castro Prazeres & Andrade Advogados, o MP apenas revidou. “Não tendo recorrido da decisão judicial, busca subverter a ordem já estabelecida naquele processo, usando abusivamente de seu poder investigatório”.

De acordo com a Promotoria, as empresas investigadas pela construção das estradas em área de proteção ambiental e a Prefeitura da Salvador, “em conluio de desígnios, valeram-se do alvará judicial proposto pela paciente Rosana Kauark não para aterrar focos de dengue, e sim para implantação de parte do sistema viário”.

Por isso, Kauark foi obrigada a depor. A legalidade da atitude, como justificou a Promotoria, tem base na Lei Orgânica do Ministério Público Federal e Estadual — a Lei federal 8.625/93 — nos artigos 26 e 73. O dispositivo permite ao MP “expedir notificações para colher depoimento ou esclarecimentos e, em caso de não comparecimento injustificado, requisitar condução coercitiva, inclusive pela Polícia Civil ou Militar”.

Essa possibilidade, no entanto, depende da avaliação de um juiz, segundo o desembargador Eserval Rocha, da 1ª Turma da 1ª Câmara Criminal do TJ da Bahia. “Os dispositivos não excluem a necessidade de apreciação prévia do Poder Judiciário para se proceder a referida medida privativa de liberdade”, afirmou no acórdão do processo relatado por ele. A decisão foi dada no dia 6 de outubro.

O controle feito pelo Judiciário, de acordo com o desembargador, serve para evitar “abuso por parte do órgão que está procedendo a investigação quanto à realização de possíveis notificações desnecessárias ou reiteração injustificada de depoimentos já prestados, o que não pode ser decidido pelo Ministério Público”. O excesso, segundo Eserval Rocha, é que o procedimento de “condução coercitiva” limita o direito de liberdade de circulação, o que só pode ser autorizado pela Justiça, exceto nos casos de prisão em flagrante.

HC 47088-3/2009

Clique aqui para ler o acórdão.

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