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“Decreto da Mordaça” é usado para tentar punir indevidamente o delegado Bruno Boaventura 

por Editoria Delegados

Corregedoria decide investigar ‘infração disciplinar’ após delegado criticar corrupção em postagem nas redes sociais

A corregedoria da Polícia Civil do Tocantins decidiu abrir investigação contra o delegado Bruno Boaventura, da 28ª Delegacia de Polícia Civil, em Araguaína, por postagens feitas por ele nas redes sociais. O caso foi durante o aniversário de Palmas, em 20 de maio, quando Boaventura repostou uma imagem comemorativa divulgada pela Secretaria de Segurança Pública com a mensagem: “Parabéns Palmas: 31 anos de muita Corrupção!!!”.

O comentário desagradou a diretora de comunicação da SSP, Shirley Helena Cruz, que entrou com o pedido de investigação na Corregedoria. Ela argumenta que o delegado desrespeitou o Manual de Procedimentos de Polícia Judiciária, a polêmica medida instituída por Mauro Carlesse (DEM) em 2019 que foi chamada pela categoria de ‘decreto da mordaça’. Entre outras proibições, o decreto impedia que delegados criticassem autoridades públicas.

O delegado ficou conhecido no estado pelo episódio da transferência durante o escândalo do lixo hospitalar. Ele foi exonerado do cargo de delegado regional após abrir investigação contra aliados políticos do governador. Na época, Bruno Boaventura disse que se tratava de uma perseguição da direção da SSP.

Sobre a nova investigação, o delegado voltou a dizer que considera uma tentativa de intimidação e afirmou que fez o comentário como um desabafo e nas redes sociais privadas dele, na condição de cidadão e não de delegado. Ele criticou o pedido de investigação por parte de Shirley Cruz.

“Foi um desabafo, eu disse que a corrupção sempre existiu na cidade. Não foi nada sobre uma pessoa específica e eu não vejo motivo pra diretora de comunicação da SSP ficar monitorando o que eu faço na rede social. Ainda mais por ser uma jornalista, ela deveria ser a primeira a defender a liberdade de expressão”.

O delegado afirmou que vai tomar as medidas judiciais cabíveis para responsabilizar os responsáveis por dar origem à investigação.

Não é a primeira vez que a corregedoria da SSP tenta investigar um delegado por postagens nas redes sociais. Em março de 2019, a Justiça interveio em um caso e determinou o arquivamento de uma sindicância contra o delegado Hudson Guimarães por postagens feitas por ele. Nas publicações, o delegado criticava uma medida do governo que proibiu a entrada de celulares no gabinete do governador, Mauro Carlesse. Na época, a SSP acatou a decisão judicial.

A Corregedoria-Geral da Segurança Pública disse que toda conduta de policial civil que possa configurar infração disciplinar é passível de averiguação pela corregedoria. Informou que o fato em questão se trata de um comentário que teve inclusive repercussão, com internautas demonstrando indignação quanto ao conteúdo depreciativo feito pela Autoridade Policial em cima de uma postagem da SSP alusiva ao aniversário da Capital do Estado do Tocantins, como se verificou das postagens seguintes ao comentário feito. Diante disso, informou que a conduta será averiguada pela Corregedoria para apurar se houve infração a dever funcional.

A Secretaria da Segurança Pública (SSP), por sua vez, disse que a conduta da Diretoria de Comunicação está em conformidade as atribuições a ela conferidas, quais sejam a de zelar pela imagem da instituição.

 

MANIFESTAÇÃO JURÍDICA DA CONSULTORIA DO PORTAL NACIONAL DOS DELEGADOS
   

A Consultoria Jurídica do Portal Nacional dos Delegados contesta a instauração de procedimento investigatório para apurar o comportamento do delegado Bruno Boaventura que, através de denúncia pública, publicou notícia genérica de prática de corrupção de agentes públicos.

Argumentos jurídicos fartos ressoam de forma adversa a esse tipo de investigação. Havendo óbice nas relações jurídicas de direito material sem aptidão para instauração de procedimento impõe obstáculo sobre o conteúdo da peça informativa denunciativa. A “Impossibilidade” jurídica do motivo da instauração pode ser depreendida da existência de requisitos formais prévios, essenciais para o exercício da ação. São as condições de procedibilidade como uma representação específica e detalhada contra o possível sujeito ativo ou notícia de ilegalidade com imputação discriminada de autoria. O que não existe até então (1).

A essência da justa causa é condição sine qua non para a instauração do ‘procedimento administrativo punitivo’, pois sem subsídios materiais, não pode o administrador público devassar a vida do servidor público sob o pálido contexto de tentar localizar indícios de uma pseudo violação disciplinar.

É insatisfatória a existência de um acontecimento ou um receio, pois se torna forçoso o fumus boni iuris para a entrada do procedimento disciplinar contra quem quer que seja. Esse juízo de valor, mesmo que em sumaria cognito o Administrador Público é compelido a fazer, sob pena de empreender abuso de poder e cometer os preceitos primários dos arts 27 e 30 da Lei Ordinária Federal nº 13.869/19 (2).

Carência de objeto é sinônimo de ausência de justa causa. Denuncismo genérico é incompatível com a legalidade funcional. Somente a irregularidade, preenchida de elementos sensíveis e concretos poderão ser investidos, sem que haja constrangimento ilegal ao agente público.

O processo disciplinar não é um ‘estojo enigmático’ onde a ausência de materialidade de uma possível falta funcional poderia proporcionar a instauração de processo administrativo para devassar o servidor público.

Explorar a conduta social do delegado Bruno Boaventura, da forma mencionada pela imprensa, com falta de motivos específicos e ausência de dolo funcional, poderá resultar, em tese, na prática de crime de abuso de autoridade contra o responsável pela investigação administrativa (2).

Através do Observatório Social do Portal Nacional dos Delegados, Bruno Boaventura foi aprovado por dois anos consecutivos, 2018 e 2019, dentre os Melhores Delegados de Polícia do Brasil, na categoria investigação. Isso demonstra sua conduta social e histórico funcional perante a sociedade. 


A Consultoria Jurídica do Portal Delegados vai acompanhar o procedimento instaurado no Estado do Tocantins esperando que ocorra com ciência dos fundamentos aqui destacados e resulte na ressignificação dos motivos e aplicação da justiça.
 
 

(1) art. 330, do Código de Processo Civil e art. 395, do Código de Processo Penal.

(2) Código Penal – Art. 27.  Requisitar instauração ou instaurar procedimento investigatório de infração penal ou administrativa, em desfavor de alguém, à falta de qualquer indício da prática de crime, de ilícito funcional ou de infração administrativa: Pena – detenção, de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos, e multa. (…)  Art. 30.  Dar início ou proceder à persecução penal, civil ou administrativa sem justa causa fundamentada ou contra quem sabe inocente:Pena – detenção, de 1 (um) a 4 (quatro) anos, e multa.

   

Da Redação com a Consultoria Jurídica do Portal Delegados

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