A indicação de um coronel da reserva da Polícia Militar para coordenar o grupo de trabalho que irá desenvolver o esboço da Lei Orgânica da Polícia Civil de São Paulo gerou fortes críticas, especialmente entre delegados. A criação do grupo foi oficializada no Diário Oficial em 9 de janeiro de 2025, por meio de uma resolução conjunta entre a Secretaria da Casa Civil e a Secretaria da Segurança Pública (SSP), gerando polêmica sobre a autonomia da Polícia Civil.
Escolha e composição do grupo
O escolhido para liderar o grupo é o coronel da reserva Paulo Mauricio Maculevicius Ferreira, atual chefe de gabinete do secretário de Segurança Pública, Guilherme Derrite. Com uma trajetória iniciada na Polícia Militar em 1996 e consolidada no Corpo de Bombeiros desde 2000, Ferreira também foi assessor parlamentar de Derrite por dois anos na Câmara dos Deputados. Ele será responsável por coordenar a elaboração da regulamentação da Lei Orgânica Nacional das Polícias Civis, sancionada pela Lei Federal nº 14.735, de novembro de 2023. O grupo tem prazo de 45 dias, prorrogáveis por igual período, para concluir os trabalhos.
Segundo o texto oficial, o objetivo é alinhar a legislação estadual às diretrizes federais, buscando maior eficiência administrativa e melhoria nos serviços da Polícia Civil. Contudo, a composição do grupo também gerou críticas, com dois representantes da Polícia Civil, contra três da SSP e um da Casa Civil. Para os delegados, essa distribuição é desequilibrada e compromete o protagonismo que deveria ser garantido à instituição.
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Reações e críticas
A decisão do governo foi repudiada pelo Movimento Delegados de Polícia pela Democracia, que emitiu uma nota denunciando a nomeação de um militar para a coordenação como uma “afronta direta” à autonomia institucional da Polícia Civil. Segundo o movimento, a responsabilidade de conduzir os trabalhos deveria ser exclusiva de delegados de carreira, em conformidade com a Constituição e a legislação estadual. Eles também criticam a falta de equilíbrio na formação do grupo, ressaltando que a Polícia Civil deveria ter uma representação majoritária.
O movimento alerta que a configuração do grupo compromete a legitimidade do processo e o respeito aos princípios que regem as polícias judiciárias. “Delegar a coordenação dos trabalhos a um policial militar revela um desrespeito à autonomia da Polícia Civil, instituição que tem sua direção conferida exclusivamente a delegados de polícia de carreira, como assegurado pela legislação nacional e estadual”, afirma a nota.
Governança contestada
A escolha de um coronel da Polícia Militar para liderar a formulação de uma lei que afeta diretamente a estrutura e a autonomia da Polícia Civil levanta questões sobre o entendimento do governo em relação à independência das polícias. Especialistas e membros da Polícia Civil consideram que a decisão reflete um desconhecimento ou descaso com a organização e as especificidades das polícias judiciárias, além de intensificar um histórico de rivalidades entre as corporações.
Outro ponto criticado é a falta de diálogo prévio entre o governo e as entidades representativas da Polícia Civil. O processo é visto como um movimento centralizador que ignora o papel essencial dos delegados na formulação de políticas que impactam diretamente suas carreiras e a estrutura organizacional da instituição. Tal postura contraria os princípios democráticos que deveriam nortear decisões administrativas desse porte.
Atuação do governo em xeque
A postura do governo de São Paulo na condução deste processo tem sido duramente contestada por delegados e outros especialistas, que veem na escolha do coordenador um desrespeito às instâncias da Polícia Civil e uma sinalização preocupante de ingerência. Ao delegar a um militar a tarefa de regulamentar uma lei que afeta diretamente outra corporação, o governo desconsidera a complexidade das relações entre as polícias, exacerbando tensões e gerando um clima de insatisfação interna.
Além disso, críticos apontam que a medida coloca em risco a qualidade da regulamentação da lei, pois decisões estratégicas estão sendo lideradas por alguém que não pertence à carreira de delegado e, portanto, pode carecer de conhecimento técnico e vivência sobre os desafios e necessidades da Polícia Civil. A medida é interpretada como mais uma tentativa de concentrar poder e influência na Secretaria de Segurança Pública, em detrimento do fortalecimento institucional da Polícia Civil.
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