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Após polêmica, Requião anuncia mudança no texto sobre abuso de autoridade

por Editoria Delegados

Texto que atentava contra a autonomia interpretativa de juízes e procuradores

O relator do projeto que torna mais rigorosas as punições para autoridades que cometem abuso, senador Roberto Requião (PMDB-PR), disse nesta quinta-feira (6) que fará mudanças na parte da proposta que trata da divergência na interpretação de leis por autoridades como juízes e procuradores. Esse é um dos pontos do projeto que vem gerando mais polêmica.

A última versão do relatório, apresentada na semana passada, dizia que: “Não constitui crime de abuso de autoridade o ato amparado em interpretação, precedente ou jurisprudência divergentes, bem assim o praticado de acordo com avaliação aceitável e razoável de fatos e circunstâncias determinantes, desde que, em qualquer caso, não contrarie a literalidade desta Lei”.

Críticos da proposta disseram, durante audiências públicas, que essa redação propõe a criminalização da hermenêutica (interpretação de leis), e atenta contra a independência e autonomia de juízes e procuradores em processos.

Eles também avaliam que esse dispositivo abre margem para que um juiz seja punido após ter proferido uma decisão que, posteriormente, possa ser modificada por instância superior.

“O juiz ficaria com medo de proferir decisões”, declarou Roberto Veloso, presidente da Associação dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe).

Requião disse que seu novo relatório, que deve ser apresentado no dia 19 de abril, deixará o controverso trecho com a seguinte redação: “A divergência razoável na interpretação de lei ou na avaliação de fatos e provas não configura, por si só, abuso de autoridade”.

Para Requião, a ideia é dar uma “margem de raciocínio” para a autoridade.

“A divergência razoável é o seguinte: dá uma margem de raciocínio. Senão não precisa de um juiz, você põe um computador. Mas o cara dizer que onde a lei diz não, ele vai dizer sim… Não é crime? Claro que as associações vão reclamar, elas querem mandar no Brasil”, argumentou o senador.

‘Melhora, mas não resolve’

Para o presidente da Ajufe, a nova redação que Requião diz que proporá “melhora” o texto sobre abuso de autoridade, mas “não resolve”. O problema, segundo Veloso, reside na palavra “razoável”.

“O preferível era que a expressão ‘razoável’ fosse retirada do texto. A palavra gera muita controvérsia, porque ela vai ensejar um juízo de valor. Ela não é um dado objetivo. Quando ele coloca o ‘razoável’, ele estabelece um juízo de valor. O que é o razoável?”, indagou.

Ainda segundo o presidente da Ajufe, se o trecho sugerido por Requião passar a valer, o juiz ficará “intranquilo” ao proferir decisões, com receio de ser punido por abuso de autoridade, caso uma decisão sua venha a ser modificada por instância superior.

“Há muita dúvida na interpretação do Direito […]. O juiz tem que ser livre na sua interpretação. A razoabilidade, ela não é mensurável objetivamente. Ela enseja um juízo de valor. Isso traz intranquilidade”, concluiu.

Lava Jato

De acordo com Requião, um segundo ponto polêmico da proposta não será alterado. Trata-se do artigo que prevê reclusão de 1 a 5 anos para a autoridade que dar início ou fazer persecução penal, civil, ou administrativa “com abuso”.

Para o senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP), esse trecho pode significar o “fim” de investigações do Ministério Público.

“A criminalização da persecução penal ofende a autonomia do Ministério Público. Se for aprovado esse projeto, como está, é o fim de investigações como a Lava Jato”, declarou o parlamentar do Amapá.

Requião discorda do colega, declara-se favorável à Lava Jato e diz que o projeto de abuso de autoridade “nada tem a ver” com a operação que investiga desvio de dinheiro público em contratos da Petrobras.

O projeto

Protocolada pelo líder do PMDB no Senado, Renan Calheiros (AL), a proposta revoga a lei em vigor sobre abuso de autoridade, que é de 1965, e cria uma nova legislação, com punição mais rigorosa e com a inclusão de mais situações em que uma autoridade pode ser enquadrada na prática de abuso.

No portal do Senado na internet, o projeto recebeu mais de 150 mil avaliações de internautas. A maioria, 151,3 mil pessoas, opinou contra o texto. Apenas 2,5 mil usuários se declararam a favor da proposta
Entre outros pontos, o projeto prevê punição para as seguintes práticas:

Divulgar gravação sem relação com a prova que se pretendia produzir, “expondo a intimidade ou a vida privada, ou ferindo a honra e a intimidade” do acusado ou do investigado no processo. Punição: de 1 a 4 anos de detenção e pagamento de multa;

Realizar interceptações ou escutas sem autorização judicial ou com objetivos não autorizados em lei. Pena: reclusão de 2 a 4 anos e multa;

Punição para a autoridade que estende a investigação sem justificativa e em “prejuízo do investigado”. Detenção de 6 meses a 2 anos de multa.

Detenção de 1 a 4 anos e multa para quem decretar, em processo judicial, a indisponibilidade de ativos financeiros em quantia que extrapole exacerbadamente o valor estimado para a satisfação da dívida da parte.

Pena de 1 a 4 anos de detenção, além do pagamento de multa, para delegados estaduais e federais, promotores, juízes, desembargadores e ministros de tribunais superiores que ordenarem ou executarem “captura, prisão ou busca e apreensão de pessoa que não esteja em situação de flagrante delito ou sem ordem escrita de autoridade judiciária”.

A proposta estabelece ainda pena de detenção de 1 a 4 anos para a autoridade policial que constranger o preso, com violência ou ameaças, para que ele produza provas contra si mesmo ou contra terceiros.

Invadir, entrar ou permanecer em casas de suspeitos sem a devida autorização judicial e fora das condições estabelecidas em lei (pena de detenção de 1 a 4 anos);

Obter provas, durante investigações, por meios ilícitos (pena de detenção de 1 a 4 anos);

Não fornecer cópias das investigações à defesa do investigado (pena de detenção 6 meses a 2 anos).

 

G1

 

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